domingo, 22 de dezembro de 2019




                            o muro 






Onde havia um campinho de futebol,
um córrego que foi aterrado,
hoje há mais um espigão espetado.
Já não há crianças brincando na rua.
Só prédios e carros dominam a paisagem.
Às vezes um gato, e até pássaros 
são atropelados.

Nas ruas, nos semáforos, homens, 
crianças, 
pedem uma ajuda.
São tantos que não há ajuda
que chegue.
Muitos dormem ao relento, nos bancos
das praças, 
ninguém quer saber de suas desgraças.
Ninguém quer suas histórias despejadas sobre
os ombros.

Como se houvera um muro invisível entre nós,
o novo mundo amplia as diferenças.
As cidades, imensos guetos, no fim de tudo, 
sepultam as crenças universais em Deus.





terça-feira, 17 de dezembro de 2019




                         FOGO AMIGO







Feche os olhos, se não quiser ver.
Ignore, se não quiser se aborrecer.
Não responda, se não quiser discutir à toa.
Creia, há situações que o melhor é deixar pra lá,
se omitir.
As pessoas são complicadas,
difíceis de entender.
Mesmo as mais chegadas, são um poço de mistério.
Do nada, às vezes, se revelam.
Coisas absurdas, inimagináveis, vêm à tona.
De quem menos se espera.

Ah, entes queridos,
os que mais exigem,
e o que mais nos ferem.








segunda-feira, 16 de dezembro de 2019





           sonho de uma noite de verão






A vida não é um desperdício.
A menos que deixemos.
A menos que o destino seja trágico.
Às vezes é preciso dar marcha-ré
para ajustar as coisas.
Recolocar nos eixos.
Mas nunca será um desperdício.
É só dar tempo ao tempo.
Como se sabe,
tudo são átomos, moléculas,
nada se perde, tudo de transforma.
Mesmo quando eventualmente por baixo,
despojados do que tivemos, 
descartados sem mais nem menos,
não é o fim do mundo.
Ao contrário,
pode ser o recomeço,
a chance de sair da inércia,
se livrar de sentimentos nocivos,
de pessoas falsas, 
que nunca foram verdadeiras,
cuja convivência só não foi um desperdício
porque, às vezes,
mesmo uma ilusão vale a pena.
O tal sonho de uma noite de verão
que faz parte de nosso imaginário.




sábado, 14 de dezembro de 2019



                     memória seletiva








O pior é que a gente
esquece facilmente as coisas boas,
e permite que as ruins se perpetuem.
Memória seletiva é para poucos privilegiados,
que conseguem manter vivas as boas lembranças.
As graças,
as bençãos recebidas.
O que faz toda a diferença, os tornam especiais.
Ao contrário dos que se afundam em mágoas 
e ressentimentos,
se apequenam, não raro adoecem, 
vítimas do próprio veneno que acumulam.

Nada sobrevive a autofagia implacável do tempo.
Cabe apenas amenizar, 
minimar as perdas e decepções,
mediante a preservação dos bons sentimentos.
Admiráveis, as pessoas que sabem conviver 
em harmonia com os outros. 
Invejáveis, as que conseguem manter a integridade 
e a empatia 
em meio a tantas causas perdidas.






Tudo tem o seu tempo determinado,
e há tempo para todo o propósito
debaixo do céu. 
Há tempo de nascer e tempo de morrer;
tempo de plantar e tempo de colher;
tempo de matar e tempo de curar;
tempo de derrubar e tempo de edificar; tempo de rir
e tempo de chorar; tempo de dançar e tempo de pesar.
Tempo de espalhar pedras e tempo de ajuntar
pedras; 
tempo de abraçar e tempo de abster-se;
tempo de buscar e tempo de perder; 
tempo de guardar e tempo de jogar fora;
tempo de rasgar e tempo de coser;
tempo de ficar calado e tempo de falar; 
tempo de amar e tempo de odiar;
tempo de guerra e tempo de paz.

(Eclesiastes 3:1-8)


















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