sexta-feira, 22 de junho de 2018

 

      depois da tempestade


Nem triste, nem alegre.
Nem satisfeito, nem desesperado.
Não sei bem o que sinto.
Inquieto, aguardo que as coisas se acomodem.
Que as águas turbulentas voltem a seu curso.
Que o sol renasça e eu tenha olhos para ver.
Que os dias passem e eu possa vivê-los
Com simplicidade.
Como simples é minha vida
E tudo o mais que almejo.

Não sei o que me espera.
Não sei o que esperar
Agora que meu barco zarpou
Deixando uma vida inteira para trás.
Nada levo na bagagem, a não ser
O peso dos meus atos
E a certeza de que bem ou mal
Fiz o que deveria ter feito.
Há muito tempo.


 * Texto escrito em agosto de 2000, logo após o término do meu primeiro casamento.











terça-feira, 19 de junho de 2018


                              DIZEM POR AÍ 




Dizem por aí que me estrumbiquei, 
que quebrei a cara ao perder a vida que eu tinha.
Ainda mais com idade para ter mais sabedoria.
E de fato, o que será de mim só Deus sabe, e olhe lá.
Mas, à parte de não me restar mais nada - família, 
sonhos, esperança - não me sinto culpado.
Porque tenho a consciência tranquila 
de ter feito o que podia.

Quase uma via inteira dedicada à árdua 
e ingrata missão de suprir e atender as expectativas, 
sempre elevadas, de meus entes queridos.
E se mais não fiz não foi por falta de vontade
e empenho,
mas porque não pude,
porque não soube.
Se falhei em tudo, azar o meu.

Não sei que futuro aguarda meu destino sem leme.
Estou só, como há muito tempo tenho estado.
Mesmo quando no seio da família, 
cercado pelos que me são caros, sempre estive só.
Sempre labutei e travei minhas batalhas sozinho.
Sempre visto como mero provedor.
Como alguém de quem tudo se cobrava e esperava,
sem que a recíproca fosse verdadeira.

Não, no fundo não perdi nada que já não houvera perdido.
Mesmo da mulher amada, que agora me repudia,
que golpe atroz é saber que há muito tempo
bom juízo de mim não fazia.
Que só faltava um bom pretexto para dar tudo
por acabado.

Paro à beira de mim mesmo e encaro a presente solidão 
como uma revelação.
Como uma libertação de uma vida que não vivi.
Pelo bem que me negaram.
Um mínimo de tardio respeito e reconhecimento
que amenizassem meu fardo.
Mas nem isso. Ingratidão e ressentimento 
é o que me foi delegado.
Não obstante, nada me pesa.
Para mim, agora, qualquer caminho leva à toda parte.
Senão contente, nato e liberto.

Dizem por aí que me dei mal, 
que um futuro tenebroso me espera.
É possível, é bem provável.
Mas quanto mais penso na propensão que temos
de nos iludir,
mais me convenço da necessidade de aceitar as coisas 
como são,
para manter resquícios de fé
e a capacidade de resgatar os valores perdidos.
Para voltar a ser aquele que não teme 
ficar só consigo mesmo.

Razão pela qual, careço agora de me abster
dos versos toscos
com que tenho me flagelado,
na inútil tentativa de resgatar 
o que não pode ser resgatado.
Para que meu rosto volte a refletir no espelho da vida
a indulgência e a serenidade perdida.

Tu dirás, até que enfim, basta dessa patacoada !
E eu respirarei fundo e me despedirei de mim mesmo,
para buscar emoções esquecidas na memória,
em busca de milagres não acontecidos.
Que meu largo canto ecoe acima das mágoas e
ressentimentos
E que eu possa renascer 
livre das vãs mentiras que me ensinaram.







  




segunda-feira, 18 de junho de 2018


 

         REDENÇÃO

Nada à derribar.
Nada à lamentar.
Minha derrota é minha redenção.
Assim como Cristo morreu na cruz 
para nos salvar
Eu morri para que meu amor
volte à  viver.





               

                                    Uma seleção respeitável 



domingo, 17 de junho de 2018



"El alacrán, cansado de ser un alácran, pero necesitado de sua propia alacranidad para dejar de ser um alácran". (Julio Cortázar)





                       CAMISA DE FORÇA






O que mais queremos da vida é a vida 
que não temos.
O que nos contenta, é o que nos confrange e coage.
Quando tudo vira hábito, obrigação 
para satisfazer as necessidades e expectativas alheias.
Seguindo regras estúpidas,
convenções que nos esfolam e assaltam a carteira.

Não podemos ser o que somos para não causar 
melindres, inviabilizar as relações.
O que somos é a metade do que queríamos ser.
Poder fazer o que se quer,
sem peias nem amarras.
Ah, quantos de nós dessa liberdade desfrutam ?
Viver a vida para a qual estamos manietados.
Não precisar ser agradável, educado,
com quem não é agradável, educado.
Não precisar trapacear para ganhar o sustento.
Não precisar mentir para não ser incompreendido.
Amar sem se sentir sufocado.
Não se sentir obrigado a nada senão ao desejado.
Ser feliz como quando criança,
quando tudo era simples e descomplicado.
E tudo parecia se esgotar em si mesmo,
sem a consciência e o peso das coisas
que acabam por nos meter numa camisa de força.
Ou num caixão...



              
                        recomeço


No inefável torpor de meu sonho mais profundo,
volto a ser o que fui antes de ser o que sou.
O que quis ser e não pude,
em face dos mil disfarces que a vida nos obriga.
Movido por fantasias em que me enredei,
como um peixe descuidado, 
que morre sem saber porque.

Eu, que do teu coração por tanto tempo fui dono,
e fui por ele abruptamente enjeitado,
é com absoluta franqueza que te digo :
embora não acredites, dei-te o meu melhor.
Não o perfeito, o ideal, sequer o desejado.
Simplesmente o meu sofrido legado.
Fados, fardos, traumas que não consegui superar.
Te decepcionei, não te amei o suficiente,
não porque não quis,
mas do único jeito que sabia.
Do único jeito que aprendi.

Na hora incerta que antecede a aurora,
sonho meu sonho indecifrável,
no qual tudo é possível.
Sonho que não obstante ser apenas sonho,
que frente a dura realidade nada significa,
permite-me ao menos lamber as feridas.
Resignado como um anacoreta 
que na solidão ora
para que Deus o acuda, e os anjos digam amém.

Não temos muitas escolhas na vida.
A vida escolhe por nós.
Cada coisa a seu tempo,
enquanto o mundo gira e nos impele
a renunciar a si própria em prol de algo maior.
Porque a grandeza humana está em amar e perdoar
Estar disposto a recomeçar.
Pois só há um caminho na vida,
seguir em frente sem olhar para trás...








quinta-feira, 14 de junho de 2018



TÚ ME ACOSTUMBRASTE 



 "...tú me acostumbraste
a todas esas cosas
y tú me enseñaste
que son maravillosas
sútil, llegaste a mi cómo una tentación
llenando de inquietu mi corazón
yo non compreendia, cómo se queria
em tú mundo raro y por tí aprendi
por eso me pregunto
ao ver que me olvidaste
por qué non me enseñaste
cómo se vive
sin ti..."


(Lucho Gatica)

Sinto a tua falta o tempo inteiro.
De cada centímetro do teu corpo sinto falta.
Corpo que esquadrinhei e mapeei
a ponto de fundir-se ao meu.
E tornar-me refém do desejo onipresente
de tê-la sempre inteira para mim,
como tive um dia.

Sinto falta da tua voz,
do teu sorriso, tua alegria contagiante.
Sinto falta do teu cheiro,
do teu gosto, do teu gozo.
Sinto falta do teu jeito de eterna menina,
da tua delicadeza no trato das coisas,
do comedimento para lidar com os problemas.

Sinto falta, muita falta, de te ver todos os dias.
Mesmo nas crises, mesmo quando dos longos
silêncios que nos empunhámos, 
tolamente,
sem saber, ferindo de morte o que nos unia.
Sinto tanto, tanto,
por não ter me dado conta 
do mal que estava nos causando,
me afastando,
me isolando cada vez mais,
até tudo desmoronar.

Ah, meu Deus, quanta insensatez, quanto ignorância
por deixar que o amor da minha vida
definhasse dessa maneira.
Ambos, espectadores de um naufrágio anunciado,
agora irremediável, agora inexorável.
Posto que não te dispões a reconsiderar.
A nos dar uma nova chance.
Despedaçada a esperança, ferida de morte a confiança,
a crença de que possamos superar.
Nem mesmo assumindo minha parcela de culpa.
Nem mesmo disposto a tudo para te compensar
a decepção e sofrimento que te causei.

Ao que também me pregunto
Ao ver que me olvidaste 
Por qué non me enseñaste
Como se vivi
Sin ti...

.




segunda-feira, 4 de junho de 2018



                      
                              PRISIONEIROS





Somos prisioneiros de nós mesmos.
Confinados no calabouço da mente.
Condenados a pagar o preço de nossos 
pecados e limitações.

Somos passageiros do trem desgovernado da vida.
Na bagagem, nossas culpas, nosso desamor,
e um bilhete para o inferno.

Somos o que somos.
O bem e o mal nos espreitam a cada esquina,
mudam de lado conforme as circunstâncias.
Ninguém é melhor do que ninguém.
Basta nascer ou estar no lugar errado.

O padre pedófilo, o governante corrupto,
o juiz venal, o marido infiel.
Tudo barro do mesmo pó.
Farinha do mesmo saco.
Somos podres por dentro.
Apodrecemos a medida que envelhecemos,
que nos sujeitamos às condições reinantes.
Só as crianças são inocentes.
Mas por pouco tempo.
Enquanto não crescem
e aprendem o que não deveriam aprender.
A discriminar, odiar,
que o mundo é injusto e mau.
Que viver na virtude é uma batalha perdida.
Que se manter íntegro e digno
bem poucos conseguem.
E bem poucos merecem 
ser chamados de filhos de Deus.
Se é que Deus se importe.
Se é que há um Deus...







sexta-feira, 1 de junho de 2018



               AS PUTAS NÃO TEM CULPA 





Tenho um profundo respeito pelas prostitutas. Sempre que precisamos, ou nas situações extremas, elas nos salvam. Ao quebrar o nosso galho, como se diz, permitem que sigamos em frente, relevemos as insatisfações com a vida conjugal, salvando as aparências não obstante as mil dificuldades para satisfazer e dar conta das responsabilidades do casamento. E o mais importante : sem que isso afete as obrigações e o apreço pela família. Inclusive pelo lado financeiro,  pois como bem observou o filósofo Luiz Felipe Pondé, o custo-benefício das prostitutas é incomparável. 

Sei muito bem que pode parecer cafajestada, sem-vergonhice de minha parte admitir isso assim na cara dura. Mas, hipocrisia à parte, todos sabem a importância do sexo num casamento que se preze, e de como a sua falta, por um motivo ou outro, acaba inevitavelmente repercutindo na relação em geral. Um casal pode se dar às mil maravilhas na aparência, mas se não houver correspondência e afinidade na vida sexual, tudo não passa de uma grande farsa, um faz de contas que cabe a cada qual administrar. Ou continuar fingindo. 

Por estas e outras me sinto compelido - a essa altura dos acontecimentos, pouco me lixando para os que os outros pensem ou deixem de pensar -, a render minhas homenagens àquela que é tida e havida como a profissão mais antiga da humanidade, a prostituição. Uma palavra feia, depreciativa, normalmente associada ao nível mais degradante a que alguém pode chegar, homem, mulher ou congeneres, mas a meu ver, injustamente discriminada se levarmos em conta o sem-número de atenuantes e benefícios que proporcionam. 

E não só na forma do já mencionado quebra-galho, tão necessário para o homem comum, saudável, carente de uma visa sexual minimamente satisfatória. Porque, vamos e venhamos, casar, juntar os trapos, viver a dois, para depois ver a vida sexual limitada a voyerismo e masturbação, não só é frustrante e antinatural como, isto sim, altamente degradante. Situação que mesmo invariavelmente causada e até estimulada pelas digníssimas esposas, por motivos ene, não impede que o homem eventualmente flagrado em tal pecado, caia em grave e imperdoável desgraça. 

Um estado de coisas que as convenções e o falso moralismo frequentemente conduzem a um beco sem-saída, na medida que, ou a pessoa se conforma com o celibato, ou recorre as tais mulheres da vida fácil, que de fácil nada tem. Sim, pois no fundo trata-se de verdadeiras heroínas, que não só disponibilizam indiscriminadamente seus favores sexuais, sem quaisquer exigências ou cobranças a não ser o devido cachê, como de certa forma quebram também o galho das esposas ou companheiras já normalmente indispostas e indiferentes ao chamado rala e rola. Que, como se sabe, declina naturalmente no passar dos anos.

Pode soar como um disparate, mas são coisas que no fundo todo mundo sabe que é assim mesmo que funciona. Que por mais machista e chauvinista que pareça, o fato é que as necessidades de ordem sexual do homem e da mulher são diferentes e até divergentes.  Não sou eu que afirmo, há uma infinidade de estudos e pesquisas segundo os quais a libido de ambos se manifesta distintamente, o homem mais sujeito ao apelo visual e instintivo, a mulher movida pelo lado emocional, e por isso mesmo menos tentada à aventuras ocasionais. 

Em suma, na escala de prioridades de ambos, o sexo tem muito mais relevância para o homem do que para a mulher, não só pela simplória justificativa do instinto masculino mas, principalmente, por questões de carência, auto-estima, auto-afirmação. Daí o apelo quase irresistível da infinidade de opções do próspero ramo da prostituição.

Ainda que se entenda perfeitamente a rejeição da sociedade a essa laboriosa classe de prestadoras de serviço, que é o que realmente elas são, chegam a ser risíveis a discriminação, o preconceito e o menoscabo ao papel fundamental que as prostitutas exercem desde sempre. Não é à toa, aliás, que antigamente muitos pais mais conscientes e ciosos de seu papel, levavam seus varões para perder a virgindade na chamada zona, com as profissionais do sexo, exatamente para que isso ocorresse sem traumas ou preocupações com desempenho.

Algo que hoje em dia soa como uma verdadeira piada, sabendo-se que a iniciação começa cada vez mais cedo, muitas vezes no próprio âmbito doméstico, quando não em ambientes muito mais promíscuos e insalubres do que os velhos puteiros de guerra, como nas orgias e surubas dos bailes de funk, ao ar livre ou onde der na telha, que pudor e recato positivamente não fazem parte da cartilha dessa geração perante a quais as meretrizes parecem freiras.

Não falo nenhum novidade, estou apenas divagando sobre um assunto que permanece como tabu em tempos em que ninguém mais liga para nada. E que por isso mesmo, não deveria ser usado ou levado ao extremo de execrar a quem eventualmente, ou mesmo usualmente, dependendo da situação, recorre a esse tipo de serviço. Algo que, como se disse, se configura não só uma válvula de escape como verdadeira salvação de casamentos em que, por um motivo ou outro, a vida sexual foi negligenciada ou descartada, sem que o casal queira se separar ou tenha deixado de se amar. 

Conviver ou não com esse espécie de acordo velado vai de cada casal, cada qual com suas razões e peculiaridades, e é compreensível que muitas mulheres não aceitem e rejeitem tal coisa, por se sentirem desrespeitadas, ultrajadas,ainda que dando motivo para tanto. Mas seja como for, há que no mínimo se dialogar a respeito. Atinar com as causas da maneira mais honesta possível, para que fique claro se há justificativas plausíveis para tal hábito, algum tipo de vício ou compulsão, ou coisa mais grave e aí sim, imperdoável, como promiscuidade, mau-caratismo. Ou pura e simplesmente, que o amor acabou. 

Imbróglios nos quais, em todo caso, as putas não tem qualquer culpa no cartório. 
   

        



       





   


                         














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