domingo, 25 de julho de 2021



                     o prazer dos prazeres





Não tenho premência de mais nada. 

A melhor parte ficou irremediavelmente

para trás.

O prazer dos prazeres de agora 

é degustar.

Na vida desidratada, o menos é mais.





 

sexta-feira, 23 de julho de 2021



                            sangrando





Sangremos, pois, ante aqueles que perderam 

os filhos, vivos ou mortos.

Sangremos, pois, ante os mendigos que  encarnam

as misérias da vida.

Sangremos, pois, ante os aleijados, os cegos de nascença,

os suicidas, que herdaram os pecados do mundo.

Sangremos, pois, ante a desgraça dos desterrados, dos

retirantes e exilados, que morrem longe da pátria-mãe.

Sangremos, pois, ante os dias crivados de fatídicos

enigmas.

Sangremos, pois, ante cada sorriso apagado do rosto

de uma criança.

Sangremos, pois, ante os afetos e amores inconclusos,

e por fim, denegados.

Sangremos, pois, ante as coisas inocentes devoradas

pelo tempo.

Sangremos, pois, ante os machucados pela vida, os quais

a justiça não alcança.

Sangremos, pois, ante o luto dos amanheceres que a morte

não resgata.

Sangremos, pois, ante a natureza massacrada, as rupturas

que (se) partem sem partilhas.

Sangremos, pois, ante as fábulas desmanteladas 

pelos torvelinhos do tempo.

Sangremos, sangremos, pois, até o infinito silêncio se

abater sobre o mortal genoma de tudo. 




terça-feira, 20 de julho de 2021



                     batalhas perdidas



 


A virtude contra a maldade

A sinceridade contra a falsidade

A força de vontade contra o vício

A dor contra a doença

O perdão contra o ressentimento

A piedade contra o ódio

A força contra a destreza

A verdade contra a mentira

A coragem contra a covardia

A confiança contra a traição

A vontade contra a acomodação

O bom senso contra a ignorância

A esperança contra a descrença

A fé contra a desgraça

A bondade contra a ingratidão

A paz contra a beligerância

O amor contra a violência

O bem contra o mal.











                      

                    that is the question





O busílis da hora ( that is the question ) é o mesmo

de sempre. Pesa-nos viver na cidade dos homens

mas não farei abluções.  Não partirei para a ignorança. 

Como contratar um serviço de som para mandar 

todo mundo à merda, embora vontade não me falte. 

Hoje não ! Meu instante agora é de transpor as miragens

de meu próprio pensamento.

Prometo-me pegar leve ( mas, antes, há que decifra-me). 

Se não gostaram ou não me entendem

acenderei lâmpadas, holofotes, archotes.

Porei fogo na canjica, como se dizia antigamente.

Farei graça, cantarei a beleza indizível, tá bom assim ?

Caso contrário, deixemos como está, a grande ocorrência 

não vale um dia de paz. Bonifrates não nos faltam.

Esse sentimento de que tudo é precário e frágil 

é sempiterno.

A grande questão (that is the question) é, pois, 

os bois, dar nome aos bois. 

A transcendência do "mito", a ubiquidade do amor,

só pleno quando em conflito, 

que bonito ! 


Não, não é fácil ser coerente, saber quando nossos atos

deixam de ser inocentes

e se tornam dolosos. 

Na oquidão do tempo passando, passando... 

sina de homens sem rumo, irmãos na arte de cauterizar feridas.

Ó, IRMÃOS, conquistadores sem grandeza, 

desbravadores hereges, eu vos saúdo, sóis a essência,

o barro, o esgoto da Criação. 

Condescender, só in extremis.

Tanta volta dá o mundo que não espanta que tudo passe,

no ódio-esquecimento que se renova, 

atrelados as pequenas

concessões da grande aventura humana.  

Atento à passagem do rio que não dá pé, 

a monotonia de chumbo, 

e ora, pasmem,

a epifania ridícula de ser feliz. 

      


       Eis meu coração.

       Deponho a respectiva chave.

       Nada mais tenho a dar-te.

       Além de uma esperança que já não tenho.

       



 




 

segunda-feira, 19 de julho de 2021



Não é preciso provas

de que Deus existe.

Basta agir como se Ele existisse.

O que temos a perder ? 



domingo, 18 de julho de 2021



                      e eu nem era gente ainda





Eu era um menino

valente e ladino,

vivia aprontando.

Minha finada mãezinha

dizia que desde o ventre,

não dava sossego.

Chutava adoidado.

Ainda engatinhando,

já dava trabalho.

Só o anjo da guarda explica

ter sobrevivido a tantas travessuras

Como quando meti

a ponta de uma tesoura na tomada,

explodindo o disjuntor, a ponto de derretê-la, 

sem nada me acontecer.

Outra vez, um susto maior ainda,

quando, ao literalmente rastejar 

no porão da casa,

ressurgi todo ensanguentado

- havia enfiado o rosto num

caco de vidro.

Coberto de sangue, eu apenas ria,

contava minha mãe,

sobre aquele moleque

endiabrado.

Que nunca chorava. 

E eu nem era gente ainda...





   Quem nunca...




Quem não teve um pai que ronca,

não sabe o que é ter um pai.

Quem não teve uma mãe que arreia o cacete, 

quando necessário,  

não sabe o que é ter uma mãe. 

Quem nunca chorou por amor, 

não sabe o que é amar...






 







Cansaço, tédio, enjoo...

A ressaca do amor 

é dose.



 

sábado, 17 de julho de 2021



Um grande amor

só se revela

com o tempo.

Tipo vinho,

envelhecido em barris

de carvalho.








Explore o corpo da amada

como quem sabe 

que por mais que se esforce

estará sempre em desvantagem. 



sexta-feira, 16 de julho de 2021




                        acredite, amiga





Não chore, amiga, não esmoreça.

Tua luta não será inglória.

Tiveste a má sorte de cair enferma,

Mas no fim hás de cantar vitória !


És tão jovem, tão linda,

Com esse teu ar de eterna menininha.

E no entanto, tão valente ante tal absurdo.

Sem desanimar diante das falsetas do mundo.


Ah, minha amiga, sinto tanto por ti.

Mesmo à distância, em tal desvelo,

Não há nada que eu mais deseje

Que ver o fim desse pesadelo.


Acredite, amiga, amor da minha vida,

Nada acontece por acaso. Teu sofrimento

Não será em vão. Renascerás mais sábia e mais forte,

Neste amor recebido, mais tenaz que a morte. 




terça-feira, 13 de julho de 2021



Da próxima vez vai ser diferente.


( sugestão de epitáfio). 






Passei a vida tentando corrigir os erros 

que cometi

na ânsia de acertar (Clarice Lispector). 





               gleba de amor





Meu coração é gleba feita de barro natal

e lágrimas de amor.

Remontam as minhas origens

os mais singelos sentimentos,

transformados pelo vil tempo, 

em magna incandescente.

À perscrutar-me,

eivados de sofrimento. 




segunda-feira, 12 de julho de 2021


                              que belo filho da puta, você, hein ?


 


Há momentos em que tudo foge ao controle.

Situações em que deixamos de ser nós mesmos.

Em que descemos ao nível mais baixo,

inimaginável. 

Em que os princípios, a postura, a dignidade,

o próprio raciocínio lógico,

vão tudo para o vinagre.

Em que nos vemos rastejando,

chafurdando no lodo como as mais vis

criaturas.

Transformados em algo que não somos.

Fazendo coisas que jamais pensávamos. 

Monstros, vilões, traidores, adúlteros, prevaricadores,

em suma, a escória humana.

Logo você, tão cioso de seus valores, tão orgulhoso,

pretensamente íntegro,

e no entanto, 

tão inseguro, frágil, fraco como todo mundo.

Como aqueles que abominava e discriminava. 

No fim das contas, diferente apenas no invólucro.

Que belo filho da puta, você, hein ?


Raros aqueles que são o que são.

Para o bem ou para o mal.

Sem encenação.

Sem enganação.

Se mostrando como realmente são.

Para o que der e vier.

Para que não haja surpresas.

Afinal, o amor não requer perfeição.

Apenas transparência.

Além de tolerância, 

paciência, 

resiliência, 

sapiência, 

etc, etc...





   

domingo, 11 de julho de 2021




Às vezes, muito raramente, a realidade

é melhor que o sonho.


 



                           morto-vivo







Noite dessas

Acordei em sobressalto

Sem saber onde estava

Fiquei quieto no escuro

Me fazendo de morto

Até pegar no sono

Mais morto-vivo que nunca





 

sábado, 10 de julho de 2021



                      desmesurado e falho





Eis que o caminho se estreita,

e o velho corpo que carrego se esgueira

pelas sombras do mundo 

que me foi tão contraditório.


Deixando-me sozinho

no limiar da última batalha.


Diante da qual, até por impulso,

nada mais que impulso,

como sempre fiz na vida,

me sinto completo.

Pronto para o último ato.


Repleto deste amor

desmesurado e falho.












Lindas, as lembranças.

Findas, as esperanças.

Benvindas, as mudanças.


 

sexta-feira, 9 de julho de 2021


                   conversas esparsas





De tanto esperar por ela,

esqueci o quão ardilosa ela era.


             De tanto sufocar o que o coração sente,

             o sentir se fez ausente.


A vida não se resume a existir.

Isso até as baratas conseguem.


              "Aproveitando que papai passou mal à noite,

              aproveitamos para matá-lo." (conversas esparsas)


Tudo o que passa, só passa

quando nada significou. 











Nesse país sem rumo e despirocado,

só os ladrões e vigaristas curtem adoidado.


 




Essa chuva na vidraça

pede um abraço.

Ou melhor ainda,

um amasso.








Quanta bobagem a gente pensa

quando entra em abstinência.


 



cigarra velha






 

Tanta mudança

tanto tempo 

sem sentir mais nada

oco por dentro

esse novo afeto

me pegou desprevenido.

Como uma cigarra velha 

cantando pela primeira vez.









O tempo passa voando, levando

a vida que passou, ventando.


 




                      in vino veritas




Cara de pau eu, 

propus a meu ex-amor

sermos meramente amantes.

Ela riu

e, educadamente, me ofereceu sua amizade, 

como prêmio de consolação.

Culpei o vinho, pelo desatino.

Não colou, mas tinha que tentar.

In vino veritas...

















 




Minha poesia chegou a um impasse.

Sem aquela dor antiga,

está mais para nonsense.


 

domingo, 4 de julho de 2021



                                        




É fácil posar de herói, ainda que poucos

o sejam. 

Difícil, raro, é quem assuma

ser um canalha, um cagão.

Que de resto, é o que a maioria é.






 

sábado, 3 de julho de 2021



                   fugaz sonho de Penélope



Te amo. Te amo 

mas não te quero.

Amo mais aquela

de outrora. 

Quando eu não sabia 

quem tu eras.

Do que és capaz.

Meu fugaz sonho de Penélope.





 





                                 nua e crua





Quando despertos do sono da vida,

não só de nós, mas do existir humano e ungido,

o acordar para o que somos e não vemos,

premedita o tempo arguido pelos anos.


Ante o paradoxo de ser o ser enrustido 

que agasalhamos,

premido pelos pecados e segredos 

que os dias escamoteiam, 

eis que o efêmero se infere,

como se a vida se fizesse alheia.


E quando, diante dos olhos, 

o tempo conjurar os vaticínios,

esgotar-se a permissão para cometer desatinos,

alvíssaras ! Ei-la, enfim, a vida nua e crua,

prenhe de tudo que é solvente e ilusório. 









 



                nem mortadela, nem gado





Não estou louco, o que já não é pouco.

Não estou ébrio, apesar do tédio.

Não estou cooptado, muito menos abduzido.

Tenho ideias próprias, mas não me gabo.

É mister que esclareça,

não sou mortadela, nem gado.

E está dado o meu recado.




  

sexta-feira, 2 de julho de 2021




Eu sempre soube, já estou até conformado,

Meu coração não é confiável.

Mais parece um caleidoscópio,

Vê sempre tudo deformado.


  

quinta-feira, 1 de julho de 2021


                             quando, em brios, te insurgirás ?




 



Do feroz cotidiano, 

feito de tintas cruéis e fatais,

emerge a dura realidade

que os telejornais retratam

como se fora uma guerra declarada

- e, provavelmente, o é.


E assim, exalando o nauseabundo odor

de feridas gangrenadas,

a vida segue, 

amarga e desesperançada,

com o grito de socorro entalado na garganta.

Ah, meu Brasil lindo e inzoneiro,

não te cansas de ser espoliado ?

Quando, em brios, te insurgirás ?


 

 

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