sábado, 26 de dezembro de 2020






O horror das guerras,das atrocidades, dos crimes hediondos,

nunca deveriam ser esquecidos.

Seus registros macabros deveriam constar do ensino escolar.

Para que as novas gerações não percam ainda mais 

o senso da realidade. 

Filmes como "John Rabe" deveriam ser obrigatórios nas aulas de história. 

Como exemplos do que há de pior e melhor 

na espécie humana.








                   aceitação




A aceitação das coisas como são.

Parindo amor, mágoa, morte.

Sina de criaturas carcomidas pelo verme da vida.

Feita de máscaras, farsas, trapaças.

Em dias crivados de enganos.

A linguagem das coisas castas 

consagradas ao inútil hábito de crer. 

Urdindo cada separação e cada véspera.

Em espelhos, ecos, epitáfios que ramificam na grande 

e insondável árvore das causas e efeitos. 

Nas tramas de vidro e ferro, tudo é cíclico.

Lobos e cordeiros bebem na mesma fonte.

A memória encolhe e se purifica na aceitação

saturada de lembranças.


 



A ferocidade da tua repulsa,

a despeito das humilhações que me impuseste,

da evasão de todo e qualquer sentimento nobre,

é a prova viva de que me enganei em tudo.

De que nada valeu a pena,

posto que nada foi mais forte

do que esse desprezo 

com que me destroças. 



 







Meu passado é passado.

Em nome da água, do fogo,

de um sol morto,

amém.


 

quinta-feira, 24 de dezembro de 2020


                                                 diário



               


Meus versos são um arremedo de mim. 

Não obstante o entendimento confuso do mundo,

escrevo o meu diário como um Endimião à luz da própria

ruína.

Ao pé do cadafalso, oferecendo à pedra a flor fecundada,

as coisas possuídas mais indecifráveis do que nunca.

Nos dias que não se resolvem, vemos o que não vemos.

Nas infinitas variações do tempo que se esvai

sem glória,

elidindo o disfarce perfeito.

Meu corpo, embrulhado em vestes cotidianas, cambaleia como

um pugilista cansado : já não há pelo que lutar.

Mas o mistério das coisas continua, porque não podem

senão continuar. 

Como um jogador dostoievskiano

cujo crime e castigo é continuar jogando.

Como um soldado condenado a guerrear.

Sem direito a paz.

Tenho olhos mas estou cego. 

No teatro da vida, tudo é partido. Tudo se parte além

do palco.

O coração ardente com o tempo esfria.

Antes não precisasse justificar o que me fere.








    

segunda-feira, 21 de dezembro de 2020




 



                                            PERDAS



                                


 

Nada mais difícil do que lidar com as perdas.

Seja por quais motivos forem.

Para as quais nunca estamos suficientemente preparados.

Mesmo nossos velhos que vemos definhar a cada dia.

Aqueles que sofrem de doenças terminais.

Cujas mortes de certa forma acabam sendo um alívio.

E como se não bastasse, 

aqueles que se afastam espontaneamente.

Amores, filhos, que se transformam em nossos 

piores algozes.



 

domingo, 20 de dezembro de 2020


                     a vil pecúnia





Os covardes tem vida longa, 

posto que não

se expõem, vivem à sombra.


Os farsantes, mentirosos, embusteiros, 

são bem vistos

posto que vivem de enganar os outros.


Os desonestos sempre dão um jeito 

de se dar bem, 

de levar vantagem, afinal, é parte do ofício.


Diga, qual o estímulo de ser correto, 

bem intencionado,

se ninguém dá valor ? 

Se só te dão valor em função

do que podes proporcionar ?

E olhe lá.

Porque há aqueles - justo os mais caros -

que nunca se contentam, 

e cujo afeto se transformou numa mera

e mal-disfarçada questão pecuniária.



 




 











 




 



                       a mágoa que ainda viceja





Em tudo que foge ao entendimento,

não há lugar para arrependimento.

Posto que inútil, irrevogável.

Ademais, não são os erros que nos definem,

mas o que fazemos deles.


O que importa o passado,

o que deu certo ou errado,

se a vida agora agoniza

e nem assim te humaniza ?


Aceitar o castigo imerecido

não te faz melhor,

se dentro de ti a mágoa 

ainda viceja.







 

sábado, 19 de dezembro de 2020



                          TESTAMENTO





Amar quem não merece,

não se desmereça.


                  Entrar em uma relação de peito aberto,

                  é como ir para a guerra de canivete.


Quando não tiver mais ninguém a seu lado,

as chances de ficar sozinho são grandes.


                De fracasso em fracasso,

                vamos nos habilitando ao sucesso.

                E vice-versa.


De repente, a aurora.

E o vampiro perdeu a hora.


          Insista, persista,

      invista.

      Sem nunca deixar 

      de ser realista.

   


Meu testamento é bem sucinto.

Não tenho bens, só deixo genes. 



     Sempre achei que te conhecia.

     Por ti, até botava a mão no fogo.

     Hoje que te desconheço,

        enfim te conheço. 


Primeiro dia de aula :                 

acreditar + confiar = se estrepar.

 


             

               

               

               


           

 


    



                            confabulando



 



''Que tristeza é essa, primo ?", indaga o grilo ao

gafanhoto.

"Estou triste mesmo. A natureza foi injusta comigo. 

Me fez feio, não canto, sou visto como uma praga,

há até lugares em que viro petisco".

"Não exagera. Por outro lado, você é resistente,

conhece o mundo, e até voa !", pondera o grilo, 

que prossegue : 

"Veja eu. Sou minúsculo, vivo nos brejos, nas poças, 

meu canto é irritante, e sempre de olho na língua cumprida 

de algum sapo".

"Em compensação, os poetas te adoram...", suspira o gafanhoto.






 

quarta-feira, 16 de dezembro de 2020




                  quizás, quizás, quizás...





A batalha que é ao mesmo tempo glória

e mortalha,

jamais chega a bom termo.

Viver e morrer só trocam de lado.

Inocentes úteis sob o mesmo tacão,

poder e dominação em meio ao terror

incessante que as divindades ignoram e até

inspiram.

Entre o amor e o desvario que cega e alucina,

persistindo na loucura para encontrar a sabedoria, como

diz Blake. 

Ou dir-se-ia que tudo o que é passível de se acreditar,

embute mentiras ?

A batalha nossa de cada dia não distingue covardes de

heróis. 

Nem sentimentos, nem boas intenções.

O penhor da paz é o ritual de desatinos e morticínio.

Em que se anseia trocar de lugar com os suicidas,

houvesse coragem para tal.

Somos aqueles que pertencem as secretas mitologias,

para sermos o contraponto, o imperfeito

que macula a perfeição do universo.

Talvez ascenda ao céu o amor misericordioso, mas há quem

desdiga. 

Talvez os olhos limpos, que não veem o lado sujo da vida,

possam ver um Deus que ninguém nunca viu.

Talvez os muros, os guetos, os genocídios, sejam um mal

necessário.

Talvez um cão amoroso seja melhor que um amor duvidoso.

Talvez o lado sórdido da vida não seja de todo ruim, quando

visto com olhos afeitos à escuridão. 

Talvez Deus seja um velho caduco e desinteressado,

como nos revela o menino Jesus fujão,

cantado nos magistrais

versos do poeta que não sabia ser só uma Pessoa.

Talvez você possa guardar seus segredos subornando

a permissiva consciência, 

resta saber a quem quer enganar.

Talvez o labirinto da existência

não tenha saída,

e o fio de Ariadne não passe de um engodo, e aí,

como fica ?

Talvez o pó incalculável dos exércitos tombados em batalhas,

sejam o adubo da vida.

Talvez Beethoven não seria tão genial, se pudesse

ouvir.

Talvez, talvez.

Talvez as crenças e rezas não sirvam para nada,

a não ser para encher os bolsos de espertalhões que usam 

e abusam do nome do Senhor em vão.

Talvez o buraco seja mais embaixo, ou arriba.

Talvez os desejos e vontades reprimidos não passem de

imposições da carne, 

de resto, 

um banquete para os vermes.

Talvez a vida só faça sentido nos teatros, nos campos de futebol

e nos cemitérios.

Talvez a maior das tiranias seja a vontade de Deus.

Talvez se dê um crédito demasiado às esperanças.

Talvez as crianças que nascem mortas ou morrem cedo

sejam as mais felizes.

Talvez o abraço seja um laço que se deva estreitar. Ou evitar.

Talvez os ricaços apodreçam por dentro,

por não poderem gastar todo seu 

dinheiro.

Talvez os parques fantásticos de Verlaine digam o indizível,

como se visse a terra e o céu

de alguma varanda.

Talvez o sonho da rosa imaculada seja ser deflorada.

Talvez a escolha certa não passe de um grande erro.

Talvez a chamada segunda chance seja como um naufrago 

que o mar devolve à areia.

Talvez a verdade esteja no supremo desconsolo.

Talvez o mistério da morte se esgote quando as funções

da alma se perdem em náusea e desespero.

Talvez a água mais fresca seja a de algum cisterna abandonada.

Talvez a única verdade a cujos pés devemos depor 

os sentimentos, é o de nossa imensa estupidez.

Talvez os poetas sejam fósseis vivos em tempos de Internet.

Talvez as ausências que tanto lamentas, sejam uma benção.

Ainda que a de um filho ingrato.

Talvez a ausência de quem te descartou se revista

da coragem que te faltou.

Talvez a dor incomparável da perda

de um ente querido, te faça mais forte a longo prazo.

Talvez a consciência tranquila seja o último refúgio 

dos covardes, como diria Samuel Johnson.

Talvez a vida não seja só isso que se vê, ou talvez seja.

Depende de quem vê.

Talvez todos os caminhos levem a Roma, ou a Meca,

ou a lugar nenhum que não queira estar. 

Talvez as aparências enganem aos que querem ser enganados.

Talvez a beligerância inata do homem o impeça de ser feliz. 

Ou é o contrário ?

Talvez o Coronavírus seja um divisor de águas, ou o começo 

do fim. 

Talvez o duro sol ame o conflito.

Talvez devêssemos ter dois corações, um às vezes não dá conta.

Talvez nenhum sacrifício valha a pena, quando a alma é pequena. 

Talvez as injustiças sejam a redenção dos pecados,

por outros motivos. 

Talvez os dias crivados de enigmas sejam os melhores.

Talvez a doce e fria malícia encarne todas as primícias.

Talvez as certezas dos ignorantes valham mais que 

o niilismo dos sábios.

Talvez fosse melhor se minha mãe tivesse

feito um aborto.

Talvez os sonhos que fogem são os que perduram.

Talvez tudo tenha acabado de ser criado, na vida

que quebra e se refaz.

Talvez o nunca havido seja a única coisa que não se perde.

Talvez a invasão amarela salve os insetos da extinção.

Talvez o espantalho dance à noite para a lua se divertir.

Talvez superestimemos o prazer que não virá.

Talvez o malogrado tenha sido roubado.

Talvez a linguagem rebuscada, cifrada, intencionalmente

obscura,

singularmente incompreensível, 

seja tudo, 

menos poesia. 

Porque talvez "la vida sea un sueño,

y los sueñs sueños son..." (Calderon de La Barca).

Quizás, quizás, quizás...


  

 


 



 

segunda-feira, 14 de dezembro de 2020


                             o velho e o novo amor





Enquanto o velho amor morreu de velho,

o novo já nasce envelhecido,

rodado,

queimando etapas,

pulando cercas...

Reais ou virtuais.


 

domingo, 13 de dezembro de 2020


                                  

             


Afeições

estão cheias de más intenções.

Sonhos fiéis às paixões.

Ninfas atentando querubins.

Santos flertando com o diabo.

O coração, em pânico, cavalgando miragens.

Amigos e inimigos confraternizando.

O mundo partilhando dor e esperança.

O absurdo e os enigmas erguidos à vista humana.

Paixões e impulsos submetidos ao desejo impuro.

Tudo lentamente diluído em seu próprio desengano.

Em prévia exaltação da hora defunta.

A vida extinta como quem lava as mãos.

Vencer o tempo, em solenes venturas e desditas.

Enquanto a memória do amor aviltado

se apaga.





 




                               o toma-lá-dá-cá escroto da vida





As ausências preenchem o vazio em

que me sustento.

Feito de resignação e resiliência.

O que perdi é minha maior riqueza : não depender, 

não precisar de ninguém além de mim mesmo.

O pouco que tenho, é o que eu tenho. 

O quê o dinheiro pode comprar,

no toma-lá-dá-cá escroto da vida : 

pequenos prazeres que valem mais que 

as migalhas de afeto 

a que só fiz jus 

enquanto fui útil.

Do interesse daqueles que debandaram

como se não me conhecessem. 

Implacáveis,

infalíveis,

como esse Deus 

que criou o universo

o diabo,

e depois jogou um foda -se.


Meu instante agora é de supressão do mundo

paralítico de outrora, 

em que apenas vegetava, cada vez mais distante 

de ser eu mesmo, até desmoronar 

diante dos engodos do amor.

O qual se imbricou além de mim, como uma flor

cuja haste se quebrou, 

espalhando suas pétalas no jardim 

em que um Eros sonolento tira meleca do nariz.
















 

sábado, 12 de dezembro de 2020





A cor da minha pele não me define.

Meu status social paira acima de tudo.

Tenho grana, logo, existo !





 




E lá se vai mais um dia.

Nada à lamentar.

Nem o bem que me faz chorar.




 




O STF acaba de determinar :

quem crê em Deus, vai para o inferno.


 




Num minuto cabem 

todas as dolores do mundo. 




 


                              da calmaria ao tormento






Cedo ou tarde, dias de tormento sempre chegam.

E não há nada que se possa fazer 

para evitar.

A vida engana a vida, assim como nos engamos

com as pessoas.

Cada qual vergastado por suas escolhas.

No dilema sujo que nos consome, em que

as alegrias fecundam as dores,

tudo em que é possível acreditar morre ao final

de cada dia.

Na maldição de viver, a beleza de reviver num mundo

em que os próprios desenganos

são um engano.


Te dei o meu amor mas não foi suficiente.

E da calmaria ao tormento, foi só uma questão

de tempo.

Se não te parecia bom daquele jeito,

hoje, eu, refeito,

seria o caso de te dizer, bem-feito !


 




 

sexta-feira, 11 de dezembro de 2020






O amor que definha e acaba,

nunca mais vemos com os mesmos olhos.

Pelo simples motivo de que,

em já não sendo mais nossa, 

a mulher amada perde os atrativos.






 







Não me pejo

de como me vejo.

Sou um lampejo

de mim mesmo.


 



              até simplesmente desaparecer





Me proibi de ficar triste, de me sentir infeliz

por qualquer bobagem.

Por coisas que não posso mudar.

Mesmo me sendo muito caras.

Minha vida foi muito boa, a velhice não é

motivo para estragar tudo agora.

Só porque estou sozinho.

Só porque perdi minha família.

Só porque quase não vejo meus filhos.

Só porque meu ex-amor me repudia.

Só porque a vida continua resumida a trabalho 

e a matar tempo.

Só porque não consigo mais correr, jogar bola.

Só porque quase não tenho amigos.


Ah, não, não vou permitir que ninharias 

azedem meus dias.

Os poucos dias que me restam.

Os quais pretendo usufruir em paz 

e sem maiores expectativas.

Até simplesmente desaparecer. 



 





O pior sempre chega. 

Mas não há de ser hoje. 



quinta-feira, 10 de dezembro de 2020



                       o triste jugo de ser alguém





Mais do que o afeto,

mais do que o próprio amor,

o homem anseia por respeito.

Como trabalhador.

Como provedor.

Cumpridor de seus deveres.

Como pessoa de bem.

Eventualmente sujeito à falhas, tropeços, quedas,

como qualquer ser humano.

Porém, nem por isso indigno de receber 

o que lhe é devido.


Na pública luz das batalhas anônimas,

nossos atos prosseguem seu caminho sem fim.

Urdindo conquistas e tragédias.

Quando o corpo se cansa de ser o homem que  foi,

o reconhecimento é a régua de sua obra.

Que lhe servirá de consolo ou agonia.

Que é quando os dias consagrados 

ao inútil labor de servir e agradar os outros,

enfim o livrarão  do triste jugo de ser alguém.





 



 


 



                                escondendo o ouro





A vontade nunca cansa.

Vontade disto, vontade daquilo, 

o desejo sem desdouro.

Sempre batendo de frente

com a realidade.

Que vive escondendo o ouro. 



quarta-feira, 9 de dezembro de 2020


                         famintos de amor





Da mulher espera-se submissão

e lealdade.

Algo que ela só finge dar.

Arte que domina com maestria.

A ponto de fazer o homem sentir-se

senhor da situação,

iludido pelas artimanhas do invólucro 

perfeito.


Mulher que, com a linguagem fértil do corpo,

torna crível as juras mais improváveis.

Inebriante os beijos.

Irresistível a paixão.

Volúpia que tão logo extinta, revela os ardis

mais diabólicos.

Aos quais o homem, incautamente, se submete.

Como mendigo faminto de amor que é.




    

                  




Há pessoas que passam por nossas vidas só para gerar anticorpos. (anônimo)




 

terça-feira, 8 de dezembro de 2020




                         Deus, segundo Baruch Spinoza *



"Pare de ficar rezando e se angustiando ! O que eu quero que faça é que saia pelo mundo e desfrute da vida. Quero que goze, cante, divirta-se e aproveite tudo o que fiz para você. 

Pare de ir a esses templos lúgubres, obscuros e frios que você mesmo construiu e acredita ser a minha casa ! Minha casa são as montanhas, os bosques, os rios, os lagos, as praias, onde vivo e expresso o amor por você.

Pare de me culpar pela sua vida miserável ! Eu nunca disse que há algo mau em você, que é um pecador ou que sua sexualidade seja algo ruim. O sexo é um presente que lhe dei e com o qual você pode expressar amor, êxtase, alegria. Assim, não me culpe por tudo o que o fizeram crer.

Pare de ficar lendo supostas escrituras sagradas que nada têm a ver comigo ! Se não pode me ler num amanhecer, numa paisagem, no olhar de seus amigos, nos olhos de seu filhinho, não me encontrará em nenhum livro.

Confie em mim e deixe de me fazer pedidos ! Você vai me dizer como devo fazer meu trabalho ? 

Pare de ter medo de mim ! Eu não o julgo, nem o critico, nem me irrito, nem o incomodo, nem o castigo. Eu sou puro amor, sentimentos, de necessidades, de incoerências, de livre-arbítrio. Como posso culpá-lo se responde a algo que eu pus em você ? Como posso castiga-lo por ser como é, se eu o fiz ?

Crê que eu poderia criar um lugar para queimar todos os meus filhos que não se comportem bem, pelo resto da eternidade ? Que Deus faria isso ? Esqueça qualquer tipo de mandamento, qualquer tipo de lei, que são artimanhas para manipula-lo, para contrala-lo, que só geram culpa em você.

Respeite seu próximo e não faça ao outro o que não queira para você. Preste atenção na sua vida, que seu estado de alerta seja seu guia.

Esta vida não é uma prova, nem um degrau, nem um passo no caminho, nem um ensaio, nem um prelúdio para o paraíso. Esta vida é só o que há aqui e agora, e só do que você precisa.

Eu o fiz absolutamente livre. Não há prêmios, nem castigos. Não há pecados, nem virtudes. Ninguém leva um placar. Ninguém leva um registro. Você é absolutamente livre para fazer de sua vida um céu ou um inferno.

Não lhe poderia dizer se há algo depois desta vidas, mas posso lhe dar um conselho. Viva como se não o houvesse, como se esta fosse sua única oportunidade de aproveitar, de amar, de existir. Assim, se não houver nada, você terá usufruído da oportunidade que lhe dei.

Pare de crer em mim ! Crer é supor, adivinhar, imaginar. Eu não quero que você acredite em mim, quero que me sinta em você. Quero que sinta em você quando beija sua amada, quando agasalha sua filha, quando acaricia seu cachorro, quando toma banho de mar.

Pare de louvar-me ! Que tipo de Deus ególatra você acredita que eu seja ? Aborrece-me que me louvem. Cansa-me que me agradeçam. Você se sente grato ? Demonstre-o cuidando de você, da sua saúde, de suas relações, do mundo. Sente-se olhado, surpreendido ? Expresse sua alegria ! Este é um jeito de me louvar.

Pare de complicar as coisas e de repetir como papagaio o que ensinaram sobre mim. A única certeza é que você está aqui, que está vivo e que este mundo está cheio de maravilhas. Para que precisa de milagres ? Para que tantas explicações ? Não me procure fora. Não me achará. Procure-me dentro de você. É aí que estou, pulsando em você. 



Baruch Spinoza ( 1632-1677) foi um filósofo racionalista holandês que se notabilizou pelo vanguardismo de suas ideias nas áreas da teologia, línguas, filosofia e política. O  que lhe valeu a excomungação pela comunidade judaica de Amsterdã, da qual sua família fazia parte, obrigando-o a mudar-se para várias cidade para sobreviver. Peregrinação na qual desenvolveu suas teorias contestatórias ao dogmatismo religioso. Após estudar profundamente os textos bíblicos e o Talmud, ele chegou a conclusão de que as obras religiosas eram interpretação humanas sem fundamentação racional, calcadas em crendices e superstições criadas para o controle e a manipulação das pessoas. Spinoza descarta a possibilidade da intervenção divina e de milagres operados pela fé por considerar que existe no mundo um ordenamento essencial, determinado pelas leis da natureza, as quais os homens devem se enquadrar e seguir as regras, como qualquer criatura. 



        

sexta-feira, 4 de dezembro de 2020


                          PENSATAS SENSATAS



Minha solidão, feita de ausências facultativas,

não poderia estar em melhor companhia.


           Não há liberdade maior do que pensar 

           por conta própria.


Aprendemos tantas coisas erradas que às vezes

não tem conserto.


         A vida tem sua própria escala de valores, em que a 

         virtude está mais sujeita a infortúnios do que a maldade. 


Tudo nos diz adeus. Se não hoje, com certeza amanhã. Trate, 

portanto, de aproveitar, valorizar.


A tristeza chega de mansinho,

como quem não quer nada,

enquanto eu saio de fininho.


            Me envergonho de muitas coisas,

            mas não me arrependo de nada.

            Provavelmente faria tudo de novo,

            mas de um jeito diferente.


Não quero mais amar.

Mas posso muito bem fingir.

Garanto que vai ser até melhor.

Sem a parte do melodrama, do ciúme, 

da possessividade. 


                Passei a vida inteira à espera de um grande amor.

                Cheguei a achar que tinha encontrado.

                Qual o quê ! O cupido acertou a flecha no lugar errado.





 



 


                onde mora o perigo





Amar não se explica.

Sente-se.

Vive-se.

Inventa-se.

Na sombra,  nos ilumina.

Na luz, nos cega.

Ah, o amor,

arrebatador em seu doce enleio,

corações e olhos se buscam esfaimados,

como crianças mamando no seio.

Embevecidos, aos prazeres se entregam, 

os defeitos não enxergam. 

E aí é que mora o perigo.


 






                                    valimento






 Minha pena dura

a folha nua

penetra.

No coito que se consuma, porém,

não vi, amor, nenhum valimento.

Só palavras vãs,

feitas de saliva e de sêmen. *


Inspirado nos versos de Joaquim de Francisco Coelho.


No contrato que eu tu lavras/não vi, amor, nenhum valimento/ só

palavras e palavras/ feitas de sonho e de vento.





                                                                 déjà vu





Quanto tempo desperdiçado, 

quando queremos recuperar, o prazo acabou. 

Não é assim que funciona ?

Cada coisa a seu tempo, que é onde as peças

se encaixam. 

Ou deveriam. Porque raramente encaixam.

E nem poderia. Ninguém nasce sabendo. 

E o que não encaixa, não se resolve, é o que

atravanca lá na frente.

O desperdício de tempo, 

de oportunidades.

Quando acordamos, já é tarde.

O bonde passou, a vida passou, a festa acabou,

e tudo paira como um recorrente déjà vu. 

uma eterna quarta-feira de cinzas.

Feliz de quem ao menos a folia aproveitou.






  

quinta-feira, 3 de dezembro de 2020



                       os deuses não perdoam





Os amigos, conta-se nos dedos.

Os prazeres, bruxuleiam como tocos de vela.

Os amores, sepultam-se todos os dias.

Assim fenece toda gloriosa existência.

Fadada a sentença e esquecimento.

Sem qualquer livramento.

A não ser viver a vida sem viver.

Em dádivas que nem sabem que são dádivas. 

Na opulência mesquinha, ante a miséria do mundo, 

ai de quem ousa ser feliz.

Os deuses não perdoam. 






Das trevas fez-se a luz.

E o que eu vi,

cegou-me.


 

terça-feira, 1 de dezembro de 2020



No topo do mundo, nada mais importa.

Tudo se desfaz, se liquefaz 

à vista das estrelas.

E o Deus inventado

enfim

se revela.


 



O amor renasce, assim, desajeitado.

Aos poucos, o coração arredio

se desarma.

E como previsto,

mais uma vez se fode.


 




               mamãe está off


Palavras.

Quando mais preciso delas,

me faltam.

Incapazes de reestabelecer

a antiga conexão.

Infelizmente, para mim,

mamãe está off.


 

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