sábado, 10 de agosto de 2024



                     o sêmen do mal



 
O mal é o sêmen de mirantes ensandecidos

muros perfumados

antros suicidas

grotas que arrotam morte.

Não há hipótese de uma nova ordem.

É sempre o mesmo furor e sua beleza estonteante.

O Inferno parecendo o Paraíso, e o Paraíso parecendo

o Inferno.

Nunca se sabe qual é o melhor ou o pior.

Atrocidades não têm credo, raça, preferências.

Onde cresce o fungo da discórdia e da intolerância

jaz o mausoléu das crenças.

A ordem que rege a humanidade gira em torno de abismos.

Mutirões de eleatas removem montanhas que desatam nós,

com a fé de anjos que perderam as asas.

A civilização se rende à sua própria sorte.

Como um moribundo que não morre nem se cura. 








sexta-feira, 9 de agosto de 2024



                             aptidões





Sou bom em tudo aquilo que não serve para nada.


                  Não brigo com os fatos.

                  Barganho.


Uma das (poucas) vantagens de ser pai na velhice

é saber que não terá tempo de ver o produto final.


                A vida só se revela totalmente

                quando você percebe que foi enganado

                por todo mundo.


O que nos habilita ao sucesso e ao fracasso

é basicamente a mesma coisa.

Aptidão.


                O santo e o herege são igualmente degenerados,

                por motivos opostos.





quinta-feira, 8 de agosto de 2024



                          ancestralidade




 

 

Um manto de veludo cobre a noite.

A lua chega de mansinho, procurando um lugar

para dormir.

As estrelas parecem derreter, confabulando

com o infinito.

O espaço abriga os ossos da eternidade.

O resto é luz 

transformada em travesseiros de sonhos.




 



                    emulações


                           tela de Agim Sulaj


A vida mortífera vê o túmulo de perto.

O tempo que passa eternamente é abundante e velado.

A morte passeia entre lobos e cordeiros, com 

os lábios calados em reverência à podridão da terra.

Todos carentes de qualquer coisa guardam segredos

nas profundezas.

Homens vidrados em mutilações apertam-se as mãos,

enquanto se ignoram. 

Onde não há esperança o céu respira feridas abertas.

O Oriente se vinga do Ocidente falsificando 

o sangue negro.

Até quando dormirá o Leviatã de Tanakh ?

O Muro da Lamentações zomba da verdade.

Sem testemunhas, o mundo converte paredes

e emulações réprobas em pensamentos.

Para que a humanidade rumine a paz.



quarta-feira, 7 de agosto de 2024


                          onde viemos parar ?





Decifra-me ou te devoro.

Deveria ser o lema de escrevinhadores metidos à poeta.

Tremem nas bases os infames sacrilégios à flor

mais inculta do que bela, após virar saco de pancada

no pantagruélico palco das redes sociais.

Da largata à barbuleta,

digo, da lagarta à borboleta, a realidade frondosa de teclas

monitores e-mails, imigra do Lácio,

deportando os devaneios e circunlóquios ( do lirismo

comedido ? ) ao pé das garatujas virais.   


Dos pináculos da Grécia antiga ao porrete no lombo

da gnoseologia, onde viemos parar ?

Para isso foram expulsos da Hélades os lafranhudos titãs

precursores do Grande Vate ?

Ora, direis, para quê ?

Embasbaquem-se os prelos virtuais ante

a prescrição do venerando vernáculo.



domingo, 4 de agosto de 2024


               o mal da minha cura





Não venha falar dos meus defeitos.

Você nem me conhece direito.

Nem faz a menor questão.

A sua opinião sempre prevalece.

Estando certa ou não.

Não se contenta com pouco.

Quer do bom e do melhor.

Não lhe tiro a razão.

É bom ter ambição.

Mas, veja lá, sem passar por cima dos outros.

Faz gato e sapato do meu coração.

Você sempre certa e eu sempre errado.

Já passou da hora de dar um basta.

Vivo me sentindo um bosta.

Assim não quero mais, não.

Não tenha mais idade para ficar ouvindo sermão.

Garota, vê se se enxerga.

Você é gostosa mas não é a única.

A oferta está maior que a procura.

Não queira ser o mal da minha cura.




                                  meigos dilemas





Não foi de repente,

como uma dessas fatalidades

que às vezes acontecem.

Não foi premeditado, programado, que juízo

e bom senso nunca foram o meu forte.

Simplesmente foi acontecendo.

Tão somente maturando, como a fruta, a idade, 

num repartir-se nunca aprendido

e aos poucos despovoado.


Vi o fender invisível da vida atormentado

por meigos dilemas.

Querendo tudo sem investir nada,

num abranger ególatra feito de sonhos turvos

e âncoras de espuma.

Meus restos ficaram pelo caminho

conjurando os passos erradios.

Para voltar a ser o que deveria ter sido.

Alguém mais íntegro e autoral.

Um homem que precisou perder-se para se encontrar.


O que ficou para trás enfim encontrou o seu lugar.

Como um rio subterrâneo que desaparece

no sumidouro do mundo.



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