Tudo
foi
sempre tão intenso
na vida que tive
que a calma
a paz que hoje tenho
me faz sentir
como
se tivesse perdido
o que eu tinha de melhor.
homo cellulare
Assim chafurda a humanidade.
Sem mais nada que surpreenda, escandalize.
O novo normal é o hediondo, o execrável, o escracho.
Ninguém mais teme o enxovalho, a ignomínia.
Quanto mais explícito, melhor.
Por debaixo dos panos perdeu a graça.
A crise de valores e de identidade da modernidade
líquida e confessional assim o exige.
O furor de mostrar-se, exibir-se, a tudo
transcende.
Para o homo cellulare, privacidade é o de menos.
Vale tudo por visibilidade no mundo digital.
As pacatas praças da aldeia substituídas pela
plateia planetária,
que não distingue o cientista famoso
do estuprador,
dá mais importância ao vencedor do BBB do que
ao ganhador do prêmio Nobel da Paz.
O que vale é ser visto e reconhecido no shopping.
Ter milhões de seguidores, curtidores.
As pessoas fazem qualquer coisa para serem vistas ou faladas.
Até mesmo o que até outro dia era vergonhoso,
como a fama de ladrão, corno, ou puta.
Com os parâmetros e critérios tão desvirtuados,
resta saber se é o começo ou
o fim de uma era.
raça maldita
O que pode ser mais triste
do que a floresta exuberante,
calcinada ?
Os animais silvestres carbonizados.
A natureza agonizando.
O quê pode ser mais desolador
do que o majestoso tigre, enjaulado ?
Elefantes, leões, milhares de criaturas
milenárias caçadas impiedosamente,
abatidas à tiro,
retiradas dos oceanos,
pela ignóbil
mão humana.
Que a tudo conspurca, profana.
"In nomine Patris
et Filii
et Spiritus Sancti",
eu te esconjuro, raça maldita !
o "falecido"
Matei o infeliz, abestado, desajustado, bipolar,
otário, louco, covarde, psicopata, pervertido,
imaturo,
e de tudo mais que fui chamado
de uns tempos a esta parte.
Matei o desgraçado.
Este não incomoda mais ninguém.
Chegou a um ponto
em que não dava mais.
Era ele ou eu.
Ou matava aquele meu outro eu,
ou ele me matava.
O lado irônico da história
é que o "falecido" deixará saudades...
quem, nunca ?
Por mais insensato,
estapafúrdio,
exagerado,
que pareça,
não vou
nunca
renegar o que escrevi.
Posso até me arrepender pelos arroubos
do inquieto coração,
mas o coração é assim mesmo,
à razão não escuta,
o bom senso desconhece.
Quem nunca,
por amor,
perdeu o rumo,
que atire a primeira perda.
último ato Vem de longe o paradoxo em que me afundo. Encurralado no círculo vicioso da vida, me dester...