quinta-feira, 29 de outubro de 2020




Se não for pedir muito,

não seja pouco.


Se não for para ficar,

não se demore.


Se não for para dar,

não ofereça.


Se não for para cumprir,

não prometa.


Se não quer,

não enrole.


Se não sabe,

não fale.


 


                            o novo padrão vigente






Não invejo as novas gerações.

Com seus brinquedinhos eletrônicos.

Seu estilo de vida fútil, promíscuo, 

regado à drogas, 

fiéis devotos do consumismo, da cultura do lixo.

De gostos e hábitos estranhos.

Imersos no mundo virtual.

Escravos da aparência, dos modismos, das grifes.

Manipulados por gurus de araque. 

Idólatras, ególatras, desajustados,   

eis o novo padrão vigente.

Em que o normal

é não ser normal.





 

quarta-feira, 28 de outubro de 2020

                                                  

                                sem noção

                                    




Eu já fiz muita questão.

Corria atrás.

Não media esforços.

Absolutamente sem noção

das coisas.

Do ridículo.

E ao perder o amor-próprio,

perdi o que nunca poderia perder :

o respeito.

O auto-respeito.

A dignidade.


Hoje não faço questão 

de mais nada.

Quem quiser, que me aceite do jeito 

que sou.

Estou velho para mudar.

E nem quero.

Estou em paz comigo mesmo.

E é o que me basta.




 

domingo, 25 de outubro de 2020



                       mal-dito-dia



Mal-o-dito-dia 

raiou

e tudo girou

quebrou

a labirintite

a televisão

o dente

a câmara frigorífica

quem eu queria que lembrasse 

de mim

não lembrou.

Ô, Mal-dito-dia 

A propósito,

Feliz aniversário pra eu...




                                                             desejo



                          


Se eu pudesse formular um desejo,

satisfazer uma única vontade ,

tipo assim,

presente de aniversário,

garanto, juro,

não pediria uma conta recheada,

as mulheres mais lindas.

Tudo o que pediria

seria poder reviver um único dia

daqueles verões mágicos

no Agudo.


Rever minha grossmutter inesquecível,

meus tios, primos, curtir aquele ambiente

gostoso de final de ano,

e sobretudo, 

reaver o espírito harmonioso

que ali imperava, 

de uma verdadeira família,

em que meus pais pontificavam,

rindo, dançando, 

esbanjando o amor que os manteve unidos

por mais de sessenta anos. 

Até o fim de uma vida 

que não existe mais.






 










  


                            minhas outras vidas






Eu vi a chegada dos deuses-astronautas,

que legaram inteligência e barbárie

à humanidade.

Eu fui um dos filhos de Adão e Eva, 

tive filhos com minha própria irmã para assim 

povoar o mundo. 

Eu vi Caim matar Abel por inveja, inaugurando

em grande estilo a sanha perversa da humanidade. 

Fui um homem das cavernas morto

por um tigre de sabre.

Eu vi a água subir até cobrir o topo 

das montanhas, da proa da arca de Noé.

Eu fui um animal que não existe mais. 

Fui animal,

verme, pó, até perdi a conta de quantas vezes, 

só não fui Buda.

Eu vivi na civilização mais evoluída que já existiu

na face da terra, que no entanto,

afundou no meio do Atlântico pelos motivos de sempre.

Cuja cultura os gregos resgataram.

Eu fui um dos milhares de escravos

que construíram as sete maravilhas do mundo,

e muito mais.

Que remavam sob chibatadas 

nas grandes esquadras, e morriam feito moscas

nas grandes batalhas. 

Que edificavam, plantavam, trabalhavam, 

como trabalham até hoje,

sob o tacão dos poderosos.

Fui guerreiro de vários exércitos, morto,

esquartejado, queimado, empalado, torturado,

fui herói e covarde, apodreci em campos de batalha,

como também morri gloriosamente,

como um dos bravos espartanos que tombaram

em Termópilas,

na mais épica e desigual batalha de todos os tempos.

Em que os 300 comandados por Leônidas

contiveram

por longos e sangrentos três dias,

o exército persa de mais de 300 mil homens 

reunidos por Xerxes.

Mais sorte teve Fernão Cortez, que viu 

do alto de seu cavalo - este que vos fala -

um milhão de aztecas se curvarem placidamente,

acreditando estar diante de um deus materializado.

Eles que nunca haviam visto um cavalo.


Meninos, eu vi e participei de tudo o que possam

imaginar, ao longo de minhas vidas. 

A ascensão e queda dos maiores impérios. 

Povos inteiros sendo dizimados, 

genocídios, holocaustos, em nome das causas mais abomináveis.  

Vi a flamante Cartago banhada em sangue,

Treblinka, Hiroshima...

Vi o melhor e pior da raça humana.

Fui um dos ladrões crucificados ao lado de Cristo -

o que não pediu perdão.

Fui mártir, covarde, experimentei todas as mortes, 

liderei e desertei, traí e fui traído, 

amei,

fui amado, odiado, uma infinidade de vezes.

Vivi centenas de vidas mas, querem saber ?

Nunca vi Deus.





 



  





  



 


   um dia como outro qualquer





Um dia como outro qualquer.

Sem nada de diferente.

Sem nada de especial, como um dia já foi. 

Na casa de meus pais.

Quando ainda tinha família.

A vida toda pela frente.


Agora que sou só eu e eu mesmo,

não tenho motivos especiais para comemorar

o dia dos meus anos.

Além dos de sempre.

Como, aliás, sempre faço.

Não exatamente comemorar, mas ter 

consciência de que bem ou mal,

a vida tem sido boa.

Tenho me virado sem depender de ninguém.

Sem precisar de ninguém.

E hoje em dia, finalmente,

sem esperar nada de ninguém.

Posto que as expectativas frustradas 

é que matam aos poucos.

E as que mantenho hoje são absolutamente

realistas. 

Só dependem de mim.

De mim e da companhia luxuosa dos joões de barro, sabiás, bentivis, 

que me saúdam infalivelmente, mal rompe a manhã.

Como nesse dia dos meus anos.













Postagem em destaque

                                    último ato Vem de longe o paradoxo em que me afundo.  Encurralado no círculo vicioso da vida, me dester...