domingo, 9 de janeiro de 2022



                  sentimentos tortos


                                     Gravura de Salvador Dali


Todos conhecem os sentimentos tortos

que presidem a liturgia do mal.

Baudelaire : há tantos males sobre a Terra

que só mesmo um Deus poderia tê-los criado.

De fato, que vida é essa que se nutre de outras vidas ?

Que "mão divina" faz da evolução

a mais vil carnificina ?

Se nossos pecados são previamente perdoados,

o que impede que o mal impere ?

Qual o sentido de uma vida 

em que o indivíduo morre

sem se conhecer ?











 

quinta-feira, 6 de janeiro de 2022




                        

       segredos 





Os segredos do mundo estão bem guardados.

Nas seculares pirâmides do Egito. 

Nas catacumbas do Vaticano.

Nos subterrâneos das irmandades. 

Sob as areias dos desertos bíblicos. 

Nos silos nucleares. Nas profundezas dos oceanos. 

Em solo lunar.

No espaço sideral. Nos confins do universo.

No inexistido.

Nos hieróglifos.

Nos algoritmos. 

Entre as pernas das mulheres.

Nos artefatos, nos sítios profanados, nos cemitérios 

abandonados

das antigas civilizações e tribos,

que conheceram os deuses astronautas..

Nas horas violentas, no sulco dos arados, no caminho dos peregrinos,

nas catedrais góticas erigidas sobre crânios e ossos.

No pó e nas cinzas que não deixam rastros.

Nos labirintos que escravizam o sol. 

Nas gárgulas e anjos sonolentos que deixam a humanidade

à deriva.

No bifronte perdido no cipoal de faces.

No mundo multifacetado e mutilado, que comunga

seus

segredos com nossos irmãos,

vermes e ratazanas.






 






   



              antagonismos





A Bíblia e suas dubiedades.

Israel e a eterna agonia do crucificado.

A memória e seus ecos de candentes gnomonias. 

As escolas literárias e seus engodos didáticos.

Whitman e seus catálogos vitalícios.

Os livros de ouro e as águas do Ganges.

Excalibur e o Santo Graal.

O rigor do jovem Schopenhauer e os labirintos borgeanos.

A miscelânea de Virgílio, Milton, Blake, e a rotina de escrever.

Os nefelibatas desvalidos e a dor de corno.

O saltimbanco e a vertigem do picadeiro.

O grito de horror e a epifania do juízo final.

Os poderes do mundo e o desespero da fome.

O silêncio das cordilheiras e o enigma interplanetário.

Os sóis de todos os verões e as vísceras dos incêndios.

Os olhos abertos e as bocas cheias de formigas.

A desagregação de cada dia e a morte à prestações.

A Inglaterra forjada pelos vikings e as brumas de Avalon. 

O perdurável sonho de justiça e o martelo de Nietzsche.

Os tesouros engolidos pela areia e os mitos corrompidos.

A trama obscura da Criação e o Deus de Spinoza.

O Deus que castiga e o demônio que perdoa.

Os corações espedaçados e o invisível fender do tempo.

O caminho divergente e o muro que ramifica.

À causa da poesia e a cauda do cometa...




 









 

sábado, 1 de janeiro de 2022





 



 

        Fim de tarde de 01/01/2022 : um dia para não esquecer.             
                                 





Areia.

Cal.

Cimento.

E o pedreiro faz sua mágica.


            A sereia sorri

            para o náufrago,

            antes de afogá-lo.


Há sempre uma pedra

na estrada,

a espera de alguém

que tropece nela.


            A noite pede silêncio,

            mas faltou combinar

            com o grito. 


 

            

            

 

 


       



 

sexta-feira, 31 de dezembro de 2021


                  mutatis mutandis



                        


Tudo está em constante mutação.

Ainda que às vezes imperceptível.

Às vezes para melhor, mas quase sempre

para pior.

À medida que envelhecemos.

Às vezes antes disso.

Não há mudança indolor.

Mesmo quando tudo parece bem,

no fundo,

é apenas a véspera dos infortúnios.

Até o amor fere.

Pode ser a coisa mais bela

e a mais triste.

O tempo repartido é provedor e algoz.

Entender a vontade de Deus transcende 

ao conhecimento.

O conhecimento nunca é suficiente.

O efêmero garante que a vida prossiga.

Mutatis mutandis, e segue o baile.










                 mais valia





Desejaria não ter desejos.

Não obstante, tenho-os em demasia.

Mais do que gostaria.

Em sua maioria, alegorias.

Saturadas de mais valia. 




 

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