sábado, 11 de março de 2023



                            é preciso crer





No entanto, é preciso crer.

Crer para não morrer por dentro.

Definhar na solidão das águas estagnadas.

Em meio ao inferno das ideias

e sentimentos corrompidos.


É preciso crer para manter um mínimo de fé 

nos seres, 

nas coisas que teimam em não dar certo.

Tentando e tateando os arabescos 

das surpresas compostas de completa humanidade.

Crer para manter a sanidade mental.

Para não ser um simples animal, que vive

apenas para sobreviver.


Sim, é preciso crer. Mesmo contra 

todas as probabilidades, os riscos de se arrepender.

O humano espírito inquebrantável assim o exige.

Buscar as antigas sementes, o âmago da jornada,

para ser tudo o quer quiser ser. 

O velho amor renovado em mãos antigas.

Olhos cansados refletindo a fé que remove montanhas.


Crer para exorcizar os demônios.

Para plantar e colher dias maduros e risonhos.

E o derradeiro verso,

no tempo adverso ou de bem-aventurança,

possa ser como as rezas todas desse mundo.







 

 



                                 perspectiva



Chora a criança sem berço,

sem futuro,

a desgraça de ter nascido. 


                E lá se vai mais um verão.

          Pródigo em amores vãos.


Mundo cruel. Mundo sujo.

Feliz é o caramujo.


              A realidade se revela

             a cada mudança de perspectiva.


Este vazio

é como ter partido

sem ter ido.


           



sexta-feira, 10 de março de 2023


                        crenças aviltadas





 


Nas coisas que vem do nada,

a trânsfuga se transfigura.

O que debanda, contamina.

Debuxos desvendam-se sob o influxo das oferendas.

Se impossível for, abracadabra-se. 

O que não quer dizer, não diga.

Tudo está por um triz.

Paradoxos efluem em forma de dilema. 

Data vênia cooptam o sistema.

O velho jogo de cartas marcadas na manga.

A raiva penetra o silêncio do que ficou para trás.

Deflora o chão em que tudo é carência.

Não existe a terra prometida.

Crenças aviltadas iluminam as horas mortas.

Nada permanece além da vida que não é nossa.















 

quarta-feira, 8 de março de 2023

 


                               o idiota





O idiota sofre de carência afetiva.

O idiota é bem-intencionado, solícito.

Não mede esforços para agradar, mas faz questão 

de reciprocidade.

O idiota se decepciona facilmente.

É volúvel, chegado a um draminha.

O idiota preza as boas maneiras.

É romântico, gosta de poesia.

Professa os valores tradicionais.

Um idiota, em suma.

É o contraponto de um mundo de sociopatas.

O idiota se acha esperto, mas peca pela boa fé. 

Acredita em palavras, promessas,

essas coisas tão em desuso.

Nos negócios e no amor, acaba sendo vítima 

da própria ingenuidade.

Não obstante, o idiota é feliz.

Ou nisso acredita. 

Com a beatitude dos idiotas.









segunda-feira, 6 de março de 2023



                           a tua falta





Por que sentiria a tua falta ?

Se falta minha não sentes.

Se te ausentas, sem dar notícias,

e para tudo tens uma desculpa.

E ai de mim se questionar, geniosa,

já arruma motivo para brigar.


Por que sentiria tua falta

se a cada falta,

mais nos distanciamos.

Se nada se resolve.

Você diz que me ama, mas não assume.

Está na cara que é da boca pra fora.

Por que sentiria tua falta, 

sua falsa do caralho !




  



                         justo tributo






Sobre o concreto das lonjuras furiosas,

a vasta galeria das ausências

se derrama no desmanche do mundo.

Velhos requisitos deixam-se cair num espraiar

de cores e manhãs sem rumo.

A memória fecunda em trapaças verte tramas

tediosamente humanas.

Em busca de um presente apenas imaginado,

expectativas devaneiam-se em fortuitos

encontros e despedidas.

A vida gasta tece novas afinidades, em meio

a dias fartos de silenciosas eloquências. 

Breves e intensos, os novos e delicados prazeres

lavam todos os tormentos.

Justo tributo a quem sabe dar valor 

ao que nunca deixou de ser passageiro. 





domingo, 5 de março de 2023

             

                   acontece todo o dia






               Quando você duvida

               está a meio caminho da verdade.


Acontece todo o dia.

Há sempre alguém

de barriga vazia.


                               Um bêbado, à noitinha,

                               pede fogo a um vagalume.

                     

Encher os vazios, do quê, mesmo ?


                Consulto o relógio.

                Já finda o dia.

                E nem sinal da vadia.


Amor com amor se paga.

Se com pix, melhor ainda.


               Na vida, não encontrei nada 

           do que buscava.

           Mas encontrei tudo que precisava.


Unidos pelo que nos separa.

Separados pelo que nos une.

Não entendo nem explico.











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