sábado, 30 de março de 2019



              enquanto a hora não chega 






Enquanto a hora não chega, tomo meu vinho,
bebo minha cerveja,
um cigarro de vez em quando para relaxar.

Enquanto a hora não chega, faço as coisas de sempre,
como se o tempo não tivesse passado. Mas passou,
e logo me dou conta disso.

O corpo alquebrado, o rosto vincado, a alma embotada.
E, sobretudo, a solidão, o isolamento.
O sentimento de perda. Amargura, desencanto.

Quando minha hora chegar, ninguém vai notar.
Passarão dias, meses, talvez anos, para que sintam
minha falta.
Me deem algum valor. 
Por isso, tomo meu vinho, bebo minha cerveja,
até um cigarrinho ando fumando. 
Estes e outros pequenos prazeres, 
enquanto a hora não chega.







  


                  a exaustão do amor




                         
                 


Gozo sem gemido.
Riso contido.
Carinhos sonegados.
Aconchego, nem pensar.
Tampouco atenção, interesse, 
tudo aos poucos suprimido.
O amor assim resumido,
nem sombra do que foi outrora.
Inútil procurar explicações.
Tentar entender.
Simplesmente acaba, como tudo acaba.
Em indiferença, mágoa, ódio, 
se transforma.

Por que será que as pessoas que mais amamos, 
mais nos doamos,
são as que mais nos machucam e magoam ?
As que mais nos cobram ?
As que mais nos odeiam ?

É um erro crasso
supor que o verdadeiro amor tudo perdoa, 
tudo supera.
Não supera, não perdoa,
quando muito releva.
Mas não esquece, enfraquece,
vai desmilinguido.
Até acabar na vala comum dos desamores. 

Sexo sem beijo.
Falta de assunto.
Desinteresse.
A ausência das pequenas gentilezas.
Sinais sutis de exaustão do amor.
Daí às ofensas e agressões, não falta muito.

A grandeza do amor está, também,
em saber a hora de sair de cena. 
Perder os anéis, para salvar os dedos.






 



quinta-feira, 28 de março de 2019





            para poder entender




Precisava ter a indiferença dos psicopatas.
Precisava ser a serpente que atenta e desvirtua.
Precisava ser o verme que corrói as entranhas.
O vírus que infecta o organismo.
O ranho das crenças e práticas delituosas.
O lodo em que chafurdam os criminosos do regime 
mais corrupto de nossa história.
Precisava ser igual a eles, os idólatras adestrados 
e contestadores,  
as bestas empanzinadas que seus próprios filhos
à crenças profanas consagram.
Adeptos e defensores de valores apodrecidos, que pregam
o fim da família, da religiosidade, da moralidade. 
Para então,
e só assim,
poder entender que merda se passa na cabeça 
dessa gente.





quarta-feira, 27 de março de 2019


                      VÍCIO


       

       bebida vicia
cigarro vicia
       cocaína vicia
sexo vicia
       meu vício é ela
tudo que é bom ou ruim vicia. 
       

 

                                  a lei do retorno







Muitas coisas que não sabemos, melhor
não saber.
Para não sofrer em vão.
Não saber as verdadeiras razões.
Disto e daquilo.
Por que acabou, se valeu a pena,
ou foi tudo enganação, uma grande ilusão ?

Há coisas que é melhor não saber.
Simplesmente esquecer.
Superar.
Ainda mais se ficaram sequelas.
Mágoas, ressentimentos.
Vingança é um prato que se come frio,
dizem os entendidos. 
O dia da prestação de contas sempre chega.
Mais cedo ou mais tarde, a vida cobra.
Aqui se faz, aqui se paga.
De uma forma ou de outra, ninguém fica impune,
ninguém está imune às mais variadas vicissitudes.
Segredos, trapaças, sacanagens, um dia vêm à tona.
Quando não descobertas, 
em infortúnios pessoais se revertem,
conforme a implacável lei do retorno.

Filosofia barata ? Pode ser. 
Cada um sabe de si, 
cada um que arque com o peso de seus atos.












terça-feira, 26 de março de 2019



             CHUTANDO O PAU DA BARRACA


Reza a lenda que certa feita, num acesso de fúria, o grande Genghis Kahn decepou a cabeça da criatura de seu maior apreço, um falcão que o acompanhava em suas longas jornadas e intermináveis batalhas. Até aí, nada demais, em se tratando de um dos maiores sanguinários da História. As circunstâncias é que foram de lascar. 

Marchava ele e seu exercito de mongóis há semanas por um deserto, cansados e sedentos, quando a ave os conduz a um pequeno oásis, onde se regojizam com a maravilhosa visão de um córrego se precipitando do alto uma cachoeira. Como de praxe, coube ao chefe a primazia de primeiro matar a sede, mas eis que para surpresa de todos, num voo rasante, o falcão o impede de beber, afastando o vasilhame com as garras. 

Mais pasmo do que irado, Genghis Kahn brincou com seus comandados que o provavelmente o calor havia afetado os miolos do bicho. Mas ficou possesso quando ao repetir o gesto, o falcão volta a impedi-lo de beber. Ao que saca da espada e ameaça matá-la, caso insista no que lhe parece uma afronta injustificável. Dito e feito : ao ver o pássaro aproximar-se em nova investida, decepa-lhe a cabeça num golpe certeiro.   

Após sacrificar assim, impulsivamente, o companheiro de tantas jornadas, o qual estimava mais do que a todos, agachou-se para enfim recolher o precioso líquido, quando do alto do penhasco de onde despencava a cachoeira, um de seus guerreiros gritou para que não o fizesse, chamando-o para ver o que havia encontrado na nascente do córrego : uma imensa cobra, já em adiantado estado de putrefação. 
Ou seja, a água estava envenenada, e se dela bebesse, ele e seu exercito provavelmente morreriam. E a história da humanidade seria outra.    

Verídica ou não, a passagem embute uma lição muito óbvia : a de que jamais devemos tomar decisões radicais levados por impulso ou emoções exacerbadas. Pois elas afetam o juízo, induzem a erro, equívocos, injustiças muitas vezes irremediáveis.

O que não significa que todas as explosões e reações intempestivas sejam maléficas. Há situações-limite que não só justificam como exigem tomadas de posição à altura. É quando o famoso chutar o pau da barraca se torna imperioso, uma questão de moral, dignidade. Diferentemente do primeiro caso, as perdas aqui são saneadoras, benéficas, ainda que sujeitas a naturais dúvidas e questionamentos. Principalmente quando se trata de rompimentos de cunho afetivo, em que as boas recordações tendem a causar surtos de arrependimento e auto-flagelação. 
   
Faz parte do processo assumir culpas e responsabilidades, hiper-valorizar o que foi supostamente perdido, mitigar as reais causas da ruptura, esquecendo-se do que antes era motivo de crescente e insuportável insatisfação. Coisas como o distanciamento, a indiferença, a falta de interesse sexual, e uma série de outros problemas daí decorrentes, protelados ao extremo de ensejarem desfechos radicais e traumáticos. Sentimentos represados que quando transbordam, às vezes do nada, posto que já no limite, causam estragos gigantescos e irreparáveis. 

Nada é mais desafiador para o ser humano do que controlar seus instintos e emoções. Mesmo quando justificáveis, tais rompantes sempre deixam sequelas. Quase sempre dolorosas. Mesmo quando benéficas. 













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