domingo, 5 de março de 2023



                  o rastelar das verdades





A realidade nos distrai.

As pessoas nos enganam.

Vivemos sob a égide da mentira.

Cuidado com quem ama.


A verdade de cada um é uma farsa.

Versões maldosas ou fantasiosas

da fraude de ser humano.


Somos seres grotescos, que tentamos

à todo custo esconder.

De nada nos envergonhamos. Pois o mundo

assim o exige.

A mentira em autodefesa.

A farsa com fins lícitos.


Até que o rastelar dos atos 

a realidade nua e crua restaure. 

Sem culpa nem castigo.

Ninguém gosta de ouvir verdades.


Por isso escrevo.



 

                                  linda partitura



 



Tempos difíceis moldam a consciência.

No eterno aprendizado de uma orbe de metamorfoses, 

o fruto umbroso cai por seu próprio peso,

no tempo estipulado pelo acaso.


És jovem, fogoso, acredita que os sonhos são factíveis,

mas a impaciente demora acaba 

quando o labirinto devora a criatura.

Vicissitudes vêm roubar o sono e a paz,

e as fantasias caem por terra.

Morrem e renascem em ciclos bizantinos.

Jovens e velhos, rudes guerreiros, impregnados de amor 

e desencanto,

carregam pedras até que o destino se cumpra. 


Nada nos salva de nós mesmos.

Mas assim como a neve derrete e a vida se refaz,

a linda partitura da perseverança

é o fim condutor que perpassa as agruras do mundo.

Faz a aventura da vida valer a pena.



sábado, 4 de março de 2023



                           pelas bordas da vida




Como a vida pelas bordas.

Diante de mim, a miragem de tudo que é humano

agoniza em falso esplendor.

A complexidade das coisas jaz em lama e desalento,

à espera do impossível.


Reluto em envelhecer. Atado a fantasias 

como um velho fauno que perdeu o senso do ridículo.

As veias em chamas que já não incendeiam.

Em belos campos sem semeaduras, procuro compensações

para o que perdi.

Aos olhos de um viver obscuro, a alma desdenha o coração

como uma concha sem pérola.

Sob o portal da existência, emudeço. 

Os rastros já se apagam.

Contemplo o que fui

para ao menos saber 

ao que vim.









 



                     bestas-feras



Eis que toda felicidade se resume a tão pouco.

Enquanto provisoriamente poupados das dores e males 

que só acontecem com os outros.

E que, por fim, vem a ser nossa história.


Seremos sempre as bestas-feras das desavenças e

controvérsias.

Perdidos nas perdas, agraciados por doces servidões,

vivemos como quem não tem nada a perder. Enquanto

tudo se perde.

As mortes do presente nos fustigam diariamente.

A memória é a única morada permanente.







 

sexta-feira, 3 de março de 2023



                             tu és o meu amor



Tu és o meu amor

mas não acredito nele.


Tu és o meu amor

mas não é a pessoa certa.


Tu és o meu amor

mas rejeito essa ideia.


Tu és o meu amor

mas não é digna dele.


Tu és o meu amor

contra a minha vontade.


Tu és o meu amor

Tu és o meu amor...



 



               prêmio de consolação




Nada é mais do que tenho.

O definitivo não retorna ao antigo instante.

Na hora em que a mente se desdobra em gélidos mosaicos,

só o que fica são pedaços de histórias estúpidas e baças,

enquanto o improvável já vive outras vidas.


Te perco, paixão, nos silêncios porosos que impões

quando te ausentas.

E o querer se torna um jogo que consome 

em pequenos sorvos.

Os segredos, à porta, auscultam o denso vário dos desenlaces.

Te perco como um lamento incessante a esbater-se

nos passos em falso.


A procissão dos anos remonta à dores arcanas 

e carne depravada.

Te perco quando tua ausência se cobre do musgo dos dias

sem sentido.

E o pulsar das partidas são rastros que somem

sem deixar vestígios.


Nada me recorda as paixões de outrora.

Se maltratado, o amor retrocede a terra entristecida,

em que o despertar forja fantasias recidivas.

Os ciclos se completam no caos disforme dos desgastes.

Ainda não é nascido o sentimento que perdure, conquanto

o coração relute em jogar a toalha.


Te perco porque tudo se perde, como Troia perdeu Helena,

e o amor se dispersa em diásporas irreversíveis.

O tempo é o grande inimigo dos amantes, as palavras inventam

distrações que macetam a dura realidade.

Todavia, a vontade é soberana e não se curva aos infortúnios.

No mundo oco e sem fundo, o peito de chumbo se vira como pode.


Os anseios febris se alongam e ressurgem, como tudo 

que é humano. 

Cedem à mente e as tentações da carne, como bons devotos

do sacrílego. 

O chamado os põem a caminho, imaginação à solta e 

a pseudoconsciência devidamente acoimada.

Na falta do amor, o sexo como prêmio consolação. 



 







 
















 




                         esse brincar com as palavras






Esse brincar com as palavras.

De solitárias efabulações.

Acoimadas por paixões sem diretrizes.

Em metáforas e rimas espiraladas.

O irreprimível como pano de fundo. 

Mente e coração em sintonia.

Poesia.





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