domingo, 9 de fevereiro de 2020




               
        da fuga de ser, não fujo mais






Queria ter sido melhor do que fui.
Queria ter feito muito mais do que fiz.
Queria ter trabalhado mais,
me empenhado mais, estudado mais.
Queria não ter feito tantas trapalhadas.
Não ter cometido tantos erros banais.
Não ter sido tão impulsivo em momentos
cruciais.
Tantas vezes irresponsável.
Queria ter sido mais homem e menos
tolo.
Ter resistido às fraquezas que minha vida
entortaram.
Ter amado mais e melhor.
Valorizado o que tive, o que me deram.
Ter sido um filho melhor, 
ter sido um pai melhor do que o filho relapso que fui.
Tantas coisas que precisava ter feito,
nem sei se fiz algo direito.
Essa tal consciência tranquila, 
que hoje me consola (?), 
não passa de mais um engano. 
Um dos tantos auto-enganos que passei a vida 
cometendo.
Acreditando ( sinceramente ) ser melhor
do que eu era.
No entanto, dentro das minhas limitações,
fiz o meu melhor. Dei o que tinha.
Se nunca foi o bastante, é porque a vida 
é feita de depurações.
Em cada tempo, cada período, situações
sujeitas à fuga intemporal.
A evasão de si mesmo.
A mão pesada do destino destrói os sonhos,
é implacável com os passos impensados.
Como saber o que fazer ?
Qual o caminho a seguir ? Onde achar as respostas ?
O eterno enigma do mundo, 
e de todas as coisas,
nos faz ser como somos.
Hoje eu vejo o que antes não via.
Tarde. Tudo, ou quase tudo se foi. Está morto.
Apenas essa tardia tomada de consciência 
abraça as coisas, mas sem possui-las. 
Mas não me censuro.
Nesse viver solitário, apenas conjecturo.
Me vejo, enfim, tal qual sou.
Da fuga de ser, não fujo mais.
O que perdi, o que não consegui ser,
se multiplica em uma pobreza 
feita de lâminas cortantes e pérolas.  




Nenhum comentário:

Postar um comentário

Postagem em destaque

                                       não acredite                         quando digo                        que te amo Não acredite quand...