sexta-feira, 23 de outubro de 2020

  






                cadáver insepulto





Nada mais pode ferir-me.

Nem as velhas coisas estimadas, enfim exorcizadas. 

Coisas esquecidas que durarão para sempre, 

estranhamente eternizadas.

Mas agora, submissas como tácitos escravos.


Paira sobre mim a aura do irredimível passado,

que resiste em sonhos persevagantes,

que se perdem na vertigem do tempo.

Estou pronto para o que der e vier.

Não temo a solidão, pois há muito já estou só.

Não temo o sofrimento, o esquecimento,

posto que purificam.

Não temo o que virá, o que provavelmente

não entenderei.

Deixei de sonhar-me.

O destino irrevogável encena a trama que se esgota.

Em que o amor jaz como um cadáver insepulto.

Que já não cheira nem fede.







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