sábado, 21 de setembro de 2019




                      assobio de cobra






Animal-máquina. Animal-planta. Ante-sujeito sub-humano.
Nascido super-dotado, astuto, ladino,
subutilizado.
Senhor e servo em semisselvagem atavia.
Alma de púcaro, rampance mocho-rapado.
Rearruma-se no quebradiço espaçotemporal,
reassenta-se na faina ordinária.
Quinta-essência de demiurgo psicomorfo.
Na rádio-vitrola, a moda de viola sacode a poeira
no rodado de Nossa Senhora.
Conquanto já não se vê balançar
o rabo do balanço-rabo-de-bico-doce.
No bambu-bengala ou no bambu-da-China.
Na fonte em que o batuque-boi bebe água.
Prestes à fazer companhia aos dinossauros.

Já nós, humanos,
proliferamos feito baratas.
Pseudo-sábios na proto-história que protagonizamos.
Renascendo ciclicamente das cinzas.
Destrói, se auto-destrói, e ressurge revigorada,
eis o mistério da saga humana.
Da pedra lascada ao megabytes
mea culpa não cabe.
A intra-cultura de incúria não nos protege.
Heróis e tiranos se igualam. 
Bárbaros colonizadores moldam a História.
Da escuridão fez-se a luz, a estrela de Davi 
ainda cintila.
A fúria exterminadora das Cruzadas, dos exércitos de Alá
insanamente fiéis aos livros sagrados.
O sangue dos inocentes segue sendo derramado.
O ritual macabro segue sendo executado 
das mais mais diversas maneiras.
A doença do mundo é incurável, trágica e renitente .

Dize tu, direi eu 
O Divino Verbo nos consola.
Doce de pimenta arde mas eu gosto.
Dez pés em quadrão é a medida padrão de meu desconsolo.
Dores de amores não matam mas torturam.
O cu do mundo eu não conheço.
Já inferno dizem que é aqui.
Não sei, nem quero saber.
Cossignatário da declaração universal da ignorância humana.
Cotípico counívoco covidente covariante 
catingueira-brava,
reza e mandinga não me faltam.
Conto da carochinha, conto do vigário, cartomantes,
pais de santo
médiuns
a mesma conversa fiada.
Já cai em todas.

Na coirmandade desacredito, posto que ninguém é confiável.
Filhos te voltam as costas, amores se diluem em
lenta agonia. 
Todos traem, de uma forma ou de outra, todos nos traem.
Judas fez escola, 
Brutus nem se fala.
Os deuses brincam de cara ou coroa 
para ver quem morre.
Onde é a tragédia do dia.
Carros-bomba, bombardeio à civis, tiroteios,
ainda bem que sempre muito longe.
Enquanto seu lobo não chega.
Mais uma razão para curtir a vida enquanto se pode.
Beber, dançar, copular enquanto se pode.
Contentar-se com os pequenos prazeres.
Andar no calçadão, pescar baiacu na praia,
jogar Uno, vídeo-game.
Ou simplesmente tomar um expresso na padaria,
ouvir a conversa fiada em volta.
alguém comenta que houve 65 mil assassinatos 
no Brasil no ano passado, que estraga-prazeres...

Animal-máquina, animal-flor, animal-apanha-migalhas, animal-baba-ovo,
animal-apanha-moscas, animal-apanha-o-bago,
animal-estúpido, animal-baba-pica, animalesco, aperta-chico, aperta-livros.
Animal que aperta mãos, animal-ladrão, animal que apunhala,
animal-que-canta
Animal-que-joga-bola.
Animal-que-ama, desama, que sofre de incontinência
urinária.
Animal-ridículo, que perdeu o senso do ridículo.
No ato-show se perde, no auto da fé se reencontra.
Feito assim-assim
Como assobio de cobra, que batiputá-bravo !  






















sexta-feira, 20 de setembro de 2019





      
     menino urbano, menino interiorano




O menino interiorano, 
quando vai pela primeira vez à cidade grande,
se assusta, no começo estranha,
mas logo se acostuma.
Se encanta com a agitação, as opções de lazer,
shoppings, fast food, parques temáticos,
sempre há o que fazer.

O menino urbano, quando vai para o interior,
logo se entedia.
Acha tudo parado, chato.
Nem repara na infinidade de pássaros, animais,
bichos silvestres.
Estranha a comida, se assusta com qualquer
inseto diferente, tem medo até de formiga.

Recentemente, levei meu filho adolescente 
para conhecer minha terra natal, 
rever a família, no interior
do Rio Grande do Sul.
Lugarejo pequeno, devagar quase parando, 
fui logo avisando.
Estranhou, é claro, ainda mais com o sinal fraco
da Internet, pensa em alguém mal-humorado...
Foi uma luta fazê-lo prestar atenção 
na belíssima paisagem, 
nos recantos paradisíacos ainda quase intactos.

Mas engraçado mesmo foi ver sua cara 
quando lhe apresentei
alguns personagens marcantes de minha infância.
Grilos, gafanhotos, sapos, só faltou os vagalumes, 
segundo meu primo, praticamente extintos, 
o que me causou grande pesar.
Relutantemente, andou à cavalo, adorou pescar.
Encantou-se com os riachos e as cachoeiras, mas
abriu mão da melhor parte : achou a água muito fria.
"Se fosse aquecida...", teve a coragem de gracejar.

Ah, esses meninos urbanos...
Tão valentes e destemidos à frente de seus vídeo-games
e joguinhos letais, 
mas na roça,
na vida verdadeira,
correm até de um simples garnizé...


































quinta-feira, 19 de setembro de 2019



                                           um pingo de fé






Irmão, mano, brother
presta atenção.
Se acha que as coisas vão fluir, acontecer,
não vão, não.
Se pensa que alguém vai te dar a mão, espera sentado.
Só se for para te afundar.
Jogar pedras.

Irmão, mano, brother
Se acredita que vão te entender,
ver o teu lado, esquece.
Vão é meter  o sarrafo.
Pisar em cima, tripudiar.
Bem feito, dirão, lavando as mãos.
Se imagina que, com o tempo,
as coisas vão melhorar,
as pessoas te tratarem melhor, te valorizar, etc e tal,
pode tirar o burro da chuva.
Vão é te menosprezar, difamar.
Não esqueça, quem julga, julga pelo que é,
e não pelo que VOCÊ É.
Sob padrões que nem Jesus Cristo se salva, quanto mais você.

Daí que por precaução,
melhor não esperar nada de mão beijada.
Nada de ninguém.
Porque de onde menos se espera, daí é que não sai nada mesmo.
Pois mesmo quem pode ajudar, não ajuda,
porque no fundo acha que ninguém merece.
Que quando precisou também, ninguém ajudou.
O que nem sempre é verdade.
Para a avareza e a ruindade, pretextos não faltam.

Mano, irmão, brother
Há que encarar a realidade.
Estudar, trabalhar é o único jeito.
A menos que prefira dar uma de esperto,
roubar ou arrumar algum trouxa para enrolar,
Mas aí é uma questão de foro intimo.
De caráter, decência. Essas coisas tão em desuso,
mas que ainda tem o seu valor.
Convém não esquecer que o caminho mais fácil
geralmente é um caminho sem volta.

Não, não estou exagerando, radicalizando.
Ninguém me contou.
Falo por experiência própria.
Mas, vá lá, faça um teste.
De repente, dá sorte.
É premiado.
Os bons ainda sobrevivem.
Cada vez mais arredios e receosos de pagar de otário,
mas quem é de boa índole
não muda.
Não renega as origens, o berço.
Não esquece quem um dia também foi ajudado.
E quem os ajudou.

Sei lá, por mais que as coisas tenham mudado,
continuo pensando que ser respeitado,
poder olhar um filho de frente,
não há dinheiro que pague.
Afinal, são pessoas assim que ainda
permitem manter um pingo de fé na humanidade.
















                    sofisma


Quem cala consente ou é sábio ?
Se não cala, não consente nem é sábio ?
Ou é sábio calando sem consentir ?
Ou consentindo sem calar, 
é sábio por consentir ou não calar ?


quarta-feira, 18 de setembro de 2019







                REPETITIVA E CANSATIVA






Na modernidade líquida,
a vida desidratada.
Tudo rápido e fluído, 
à escorrer entre os dedos.
Nada se retém.
Nada se detém.
O que se ganha, se perde com a mesma
facilidade.
Gosta-se e desgosta-se.
Ama-se a desama-se 
A transitoriedade dos sentimentos
na dispersão dos interesses.
Os relacionamentos diluídos no mundo virtual.
Conhece-se todo mundo e não se conhece ninguém.
A banalização de tudo.
As aparências não enganam.
Altas autoridades são os primeiros a prevaricar.  
Embustes, farsas, 
inocência e ignorância, tudo misturado.

As relações, repetitivas e cansativas.
As dores, repetitivas e cansativas.
A vida, repetitiva e cansativa.
Os reveses, as insatisfações, corroendo silenciosamente
as entranhas.
Quando se vê, o enfarte, o câncer.
E o mundinho desaba. 
A cota de oportunidades se esgota, 
na falta de perspectivas, nas expectativas frustradas.

Vivendo sem viver, 
a vida desperdiçada sem razão de ser.
Sem nada de que possa se orgulhar ou fazer.
A não ser a consciência suprimir,
e continuar fazendo de conta
que está tudo bem. 
Que nada tem do que se envergonhar.
Ninguém liga mesmo.
Um filho da puta a mais ou a menos 
não faz diferença.


















O grande problema dos falsos e mentirosos
é que são desinteressantes,
sendo apenas o que são. 
Precisam de artifícios para passar 
pelo que não são. 





terça-feira, 17 de setembro de 2019





                     acasalamento                  





  

Pássaros madrugadores riscam a noite.
Algo está errado,
que diabo está havendo?
Essa cantoria
às 3 da manhã,
isso são horas para tamanha algaravia ?
Ainda que por uma boa causa ?

Ora, Ivan, deixa de ser ranzinza,
me adverte um amigo. 
É época de acasalamento, 
acaso já não fizeste loucuras 
pelo mesmo motivo ?




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