O amanhecer
é como um renascer
ao revés.
nada está bem
Todos os caminhos levam à Brasília.
Nossa Versalhes sem Bastilha,
em que os criminosos é que estão no poder.
Devidamente entrincheirados.
Devidamente escudadas por salvaguardas espúrias
engendradas em causa própria.
Todos os caminhos levam à Brasília, mas nosso povo
é por demais pacato.
Limita-se a protestar, empunhando bandeiras e entoando
slogans que ecoam em vão.
Enquanto boa parte nem isso faz,
cooptada pelo regime que devastou e sugou
o país por quase 15 anos.
Todos impotentes diante da orgia da numerosa corte
de comensais e magistrados
que gozam de regalias e mordomias que pairam
como um escárnio à Nação estuprada.
Massa (de manobra?) que ainda assim desfila ordeira
e pacífica neste emblemático 7 de setembro de 2021,
atendendo aos apelos de um presidente refém, não só
da conjuntura maligna que herdou,
como - e principalmente - dos próprios erros
E tudo bem, nada acontece.
Mas não,
nada está bem
num país
que engole tudo passivamente.
Sem lideranças que se respeite,
sem um povo que se imponha.
carnificina
A carne de janeiro tem o sabor suicida
das coisas a serem vividas,
porém já perdidas.
A carne de fevereiro tem o sabor da volúpia
dos recomeços de quem vive
brincando com a sorte. E com a morte.
A carne de março tem o sabor do sexo
das meninas violentadas e precocemente
emancipadas.
A carne de abril tem o sabor da mesmice
de dias devorados
por máquinas autônomas e customizadas.
A carne de maio tem o sabor das tardes
luminosas que se precipitam no abismo
de cidades conflagradas e fétidas.
A carne de junho tem o sabor
do tempo sem tempo em que nada sucede
além do engano.
A carne de julho tem o sabor de sóis trenspassados
de áspera luz e primaveris cinzas
das florestas dizimadas pelo homem.
A carne de agosto tem o sabor venenoso
do ouro que impregna os rios de chumbo.
A carne de setembro tem o sabor das lembranças
que não oferecem nada, além de domingos cruéis
e grandes viagens em estradas vazias.
A carne de outubro tem o sabor ardido das decepções
e dos fracassos, de um tempo que se apagou
mas que continua doendo.
A carne de novembro tem o sabor da vida que não
muda. De um mundo que não quer mudar.
Murchando, apodrecendo como legumes
que ficam sem vender.
A carne de dezembro tem o sabor do mel
que é fel. Do afeto que trai.
Do abraço que aprisiona.
Do amor que era pouco e se acabou.
a noite eterna a noite eterna chega devagar a vida passa devagar até tudo passar e você de repente acordar sozin...