sexta-feira, 7 de abril de 2023



                acalanto do homem só




O que pode um homem esperar

do que ora sorri, ora dá nojo,

alheio ao propósito

da vaporosa vez do possível ?

O fardo tardo decomposto

adivinha faces de morrer.

Noturno e confidente.

Ao som remoto de aleluias eternas.


O que pode um homem saber

das vilipendiadas verdades

em que todas as mentiras se parecem ?

Por ventura, amar, não sabendo a quem amar,

sequer conhecer,

seres loucos e dissimulados,

que nunca falam a mesma linguagem ?

O que pode salvá-lo da flor-mulher-Capitu, 

de olhar oblíquo e dissimulado ?


O que pode um homem que não entende

as sutilezas dos cansaços e gestos filtrados

do grande e incorpóreo nada ? 

Perseguindo e perseguido pelo conhecimento 

que interroga a repartida orbe e maltrata a terra nua.

Sensações sem luz e caridade perseguem o

hermético lábio.

Consumido em clarões em susto, lumes de paixões

que ferem sem sonhar-se.


O que pode um homem fazer, ante o que 

se esconde nas frinchas do tempo ?

Na polpa do ser, mil máscaras se dispersam 

no sujo e esquecido repasto das coisas.

Ignoto, covarde como um desertor, não obstante,

irradiando surda sabedoria,

o que pode um homem só senão apegar-se

ao que não passa.

A morte que o procura.

Ao acalanto do desterro.

O cio, a vida, a poesia como 

fiel companhia. 





 



terça-feira, 4 de abril de 2023



                        a alegria do povo



Futebol é a alegria do povo.

Muito mais que um simples jogo.

É diversão, batalha estilizada, catarse.

Ludismo para todos os gostos e idades.


Futebol é paixão sem explicação.

Jogando ou assistindo, arrebata milhões.

Não discrimina raça, credo, nível social.

Nada pode ser mais democrático e radical.


Futebol é a alegria de ricos e de pobres.

Amor que não se cansa nem exaure.

Tudo o que mais se quer é a emoção

de soltar o grito de "é campeão!".





 

segunda-feira, 3 de abril de 2023


                                  LUXO





Luxo é poder desfrutar de seus dias

sem ter que dar satisfações a ninguém.



Luxo é poder gastar seu dinheiro do jeito

que quiser, sem ter que prestar contas ou se privar

do que lhe dá prazer.


Luxo é não ter hora para nada, não precisar dar expediente,

dispor do tempo para fazer o que gosta, ou simplesmente 

ficar à toa.


Luxo é poder ouvir as músicas que gosta, ler ou ver os filmes

de sua preferência, sem ninguém para torcer o nariz 

ou encher o saco.


Luxo é poder namorar, ficar, transar sempre que quiser,

e não necessariamente com a mesma pessoa.


Luxo é poder curtir a vida como bem lhe aprouver, 

viajar, festar, enlouquecer.


Mas luxo mesmo é ter alguém que o faça prescindir

disso tudo. Sem se sentir lesado.  



 






 

domingo, 2 de abril de 2023


                             no que eu creio





Já professei todas as crenças.

Já comunguei todos os credos.

Já frequentei todos os cultos, templos, sinagogas,

terreiros.

Já fiz promessas, votos, mandingas, macumba,

tomei banhos de ervas, 

fiz defumação, joguei - e ainda jogo - sal grosso pelos

cantos da casa.

Meditei no Tibete, peregrinei no Caminho de Compostela,

experimentei o espiritismo, o curandeismo, o satanismo,

tomei o Santo Daime em noite de lua cheia, 

Li e reli a Bíblia, folheei o Alcorão, o Talmud (muito maçante, não aguentei),

amei Lao-Tse, o Bhagavad Gita,

mas não me converti.

Não me convenci da verdade absoluto que todas crenças

e credos apregoam.

Muito menos do poder do pensamento positivo.

Por mim, misturaria tudo para extrair o sumo.

Ou simplesmente, ficar com o Deus de Spinoza. 
















                            para não passar vergonha



Meu poema está guardado.

Só não sei onde.

Tão bem escondido

Que temo não achar.


É um poema singelo.

Só não sei dizer se belo

Ou mais um simples libelo

Que ninguém vai querer ler.


Meu poema está guardado.

Para não passar vergonha

Melhor que fique por lá.






 

sábado, 1 de abril de 2023


                        sapiência



Quanto mais eu vivo,

mais eu desaprendo.


Quanto mais eu quero,

menos eu tenho.


Quanto mais eu sei,

mais eu erro.


Quanto mais eu penso,

mais me confundo.


Quanto mais eu vejo,

menos enxergo.


Quanto mais consciente,

menos exigente.










 



                   servidão



O caminho racional é infinito e melancólico.

Em busca da paz e da harmonia, a tentativa perene

de ser exalta, deprime, angustia.

Não importa viver, e sim compreender.

Não importa ser, e sim existir.

No caos infindável da vida, a polarização modula

o establishment de clichês e estereótipos primitivos.

A propaganda é a alma do negócio, como diria Goebbels.

Padrões desprovidos de sutilezas tolhem a liberdade.

O vislumbre do conhecimento troca o gozo pelo eletivo

senso da realidade.

A vida contemplativa é o Nirvana em que começamos

a viver quando morremos.

É trocar uma servidão por outra.












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