tempo de despedidas
quarta-feira, 13 de maio de 2020
sinto, logo escrevo
Escrever é meu vício. É o meu jeito de lidar
com as coisas
que não consigo resolver. Inútil e perfunctório
esforço de compreender
o que tecem as moiras. Dar algum sentido
a vida sem sentido.
Escrevo o que busco entender, ainda que
margeando o desejo que cessa e se expande.
Perscrutando os sonhos desfeitos, lúcidos, severos,
que ainda reverberam.
Escrevo para encontrar outro modo de dizer
aquilo que já disse, em vão, de outro jeito.
Há dias mais calmos em que penso não haver
mais nada a dizer.
Que está tudo resolvido, perdido, à falta de argúcia
resignado.
Mas o desassossego é como uma maldição perseverante,
que os mecanismos de defesa
remetem aos confins da alma.
Como convém a meu melodrama chinfrim.
Gostaria de dizer que é para libertar a fera enjaulada,
exorcizar o que ainda incomoda, decifrar os enigmas
que não se decifram a si próprios.
Mas nem sei que ideia faço de mim mesmo.
Não obstante ser a minha maneira de dizer
que a tristeza não me liquidou.
Que uma parte de mim ainda sofre,
mas a outra pede amor.
segunda-feira, 11 de maio de 2020
sobre a pandemia
Para muita gente, entre os quais me incluo, não sei se vai ser vantajoso sair vivo da pandemia.
Privações, falência, depressão, relacionamentos destruídos,
perder tudo, ver o país afundar ainda mais na merda...
Tudo bem, o sacrifício da quarentena é justificável,
salvar vidas, postergar o contágio.
Ainda que só uma ínfima minoria seja efetivamente
beneficiada. Os que podem se dar ao luxo de ficar em
casa.
A única coisa boa da pandemia é poder ver quem
realmente se preocupa com você, pergunta, liga para saber
Tudo bem, o sacrifício da quarentena é justificável,
salvar vidas, postergar o contágio.
Ainda que só uma ínfima minoria seja efetivamente
beneficiada. Os que podem se dar ao luxo de ficar em
casa.
A única coisa boa da pandemia é poder ver quem
realmente se preocupa com você, pergunta, liga para saber
se está precisando de alguma coisa.
Aquele parente rico, que te chama de irmão, quantas vezes
Aquele parente rico, que te chama de irmão, quantas vezes
mesmo te ligou ?
Isolado, sem trabalho, lazer, sem amor, só vendo notícia ruim, manter a sanidade mental é uma proeza.
Para variar, a pandemia só é boa para os políticos e
vigaristas. Sempre dão jeito de se dar bem.
Entre as lições que a pandemia deixa, a constatação de que
Isolado, sem trabalho, lazer, sem amor, só vendo notícia ruim, manter a sanidade mental é uma proeza.
Para variar, a pandemia só é boa para os políticos e
vigaristas. Sempre dão jeito de se dar bem.
Entre as lições que a pandemia deixa, a constatação de que
algumas das ocupações mais humildes podem ser mais importantes que as celebridades, craques de futebol,
famosos em geral. O que mais uma vez atesta
a idiotice da idolatria.
Deve ser só coincidências, mas felizmente não conheci ninguém
que morrido.Tudo o que sei, pelo mórbido inventário diário
de óbitos, é pela mídia, essa mesma mídia podre
que todos conhecem. Perturbador, né ?
Deve ser só coincidências, mas felizmente não conheci ninguém
que morrido.Tudo o que sei, pelo mórbido inventário diário
de óbitos, é pela mídia, essa mesma mídia podre
que todos conhecem. Perturbador, né ?
Me faz lembrar daquela passagem famosa na década de 40,
ocorrida nos EUA, com a transmissão radiofônica de uma suposta invasão da terra por marcianos, uma espécie de pegadinha
do Orson Welles que enganou muita gente.
Ninguém perde por ser cético.
domingo, 10 de maio de 2020
sexta-feira, 8 de maio de 2020
dona Dalila
do que nunca nesses tempos de pandemia,
me peguei pensando, como sempre acontece em meio a alguns tragos, numa das últimas conversas que tive com minha
finada mãe, enquanto ainda lúcida, mas já virtualmente pregada
me peguei pensando, como sempre acontece em meio a alguns tragos, numa das últimas conversas que tive com minha
finada mãe, enquanto ainda lúcida, mas já virtualmente pregada
numa cama, na casa da minha mana Ingrid, que por
sinal, Deus também levou pouco tempo depois.
"E você, meu filho, está feliz ?".
"Claro, mãe, por que pergunta ?"
"Porque me preocupo. Você sempre fez tudo por tua família,
sinal, Deus também levou pouco tempo depois.
"E você, meu filho, está feliz ?".
"Claro, mãe, por que pergunta ?"
"Porque me preocupo. Você sempre fez tudo por tua família,
será que eles vão fazer o mesmo por ti quando tu ficar velho ?
A tua mulher, tão mais nova que tu ?"
"Mãe...Não se preocupe. Ela me adora..."
Ah, minha mãe, dona Dalila. Não era nenhum amor de sogra,
"Mãe...Não se preocupe. Ela me adora..."
Ah, minha mãe, dona Dalila. Não era nenhum amor de sogra,
mas enxergava longe.
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