o alfabeto dos sonhos
Outro recomeço, digam-me, sábios de plantão,
por onde começo ?
Como trocar o ausente pela existência do que
ainda não existe ?
Se o que mal terminou ainda é banquete farto
para lobos e hienas ?
Digam-me como costurar as linhas do tempo
com as agulhas do perdão ?
Como convencer as sepulturas a reviver os mortos ?
Como reconstruir as pontes queimadas,
convencer as mãos da luxúria a soltar às rédeas ?
Como trocar o que fui pelo que quero ser ?
Recomeçar é mais difícil do que começar.
Não há mais margem para erro.
O barro dos recomeços é feito de despojos delicados
e cadáveres perfumados.
A busca por um lugar em lugar de outro é como convencer
o relâmpago a dançar a dança do trovão ( segundo o poeta
Adonis ) *.
No entanto, é preciso recomeçar.
Convencer-se de que é capaz de reescrever
sua história.
O alfabeto dos sonhos não se desaprende.
* Ali Ahmad Said Esber, poeta árabe.