sábado, 10 de outubro de 2020



                                    FÁBULAS






"E conhecereis a verdade, 

e a verdade vos libertará." (João 8:32)


Resta saber qual verdade.

A de Deus ou a dos homens ?

Ora, da soma de todas as coisas, pouco ou quase nada vislumbramos.

O saber que perscruta o tempo e plasma 

os sonhos, é de metal ou pergaminho.

Tudo que nos é levado a acreditar

não passam de fábulas,

conceitos e fundamentos que fogem

a nossos parcos conhecimentos. 

Que o sol brilha exatamente do mesmo jeito

há quatro bilhões e meio de anos ?

Que Deus criou um universo nem começo nem fim ?

E o mais incrível : que se preocupa comigo ? 

Com cada um de nós ? 


Nunca saberemos qual a verdade,

quem fala a verdade.

Criamos os mitos e os ritos, e os destruímos.

A vil palavra se presta à tudo.

Ao próprio paradoxo de um formidável processo

civilizatório, 

consagrado à mentira, as traições. 

Da cicuta de Sócrates ao beijo de Judas em Cristo,

erigimos e renegamos nossa fé 

antes mesmo de o galo cantar três vezes.

 

Em atos, pensamentos, ninguém foge à dubiedade

do livre-arbítrio,

que nos dá a terrível potestade 

de escolher o mal.

A verdade morreu.

Aliás, nunca existiu.

Tudo se insere nas gongóricas mitologias, 

como o fio que Ariadne 

pôs nas mãos de Teseu, 

para que não se perdesse no labirinto.

Porque tudo se perde. 

Tudo é circunstancial. 

Estamos sempre querendo livrar a cara,

enganar, ludibriar, tirar proveito. 

Na vida envolta em metáforas, em que

sinas e reveses se misturam,

nada nos afeta mais do que a traição

daqueles que mais amamos.

Mas não obstante o horror do ciclo natural 

das coisas,

a rosa em outra rosa se transforma.

Na dor, nos arrependimentos,

no olvido,

o passado é o barro com a qual o presente

moldamos.

Não há razão para que dos erros passados

continuemos escravos. 

Desde que mudado, 

não sendo mais o mesmo que errou.


À luz da pristina ciência, não passamos 

de um amontoado de pó.

Coube-nos, por sorte, o dom do raciocínio.

E viver sob a liberalidade de uma doutrina de perdão 

que  se dispõe a anular o passado.

À invenção de fábulas que conjugam os enigmas

da catarse humana, 

cujas palavras mentirosas e pactos rompidos 

alimentam o ciclo interminável de desatinos  

que nos condena à infâmia.




 


 




  










 

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