domingo, 25 de junho de 2023



                     a engrenagem


                         tela de Claude Verlinde



Às vezes sinto como se minha vida

não fosse minha.

Não somos nada se não tivermos serventia.

Daí a tristeza de ser velho.

Daí o desprezo por aqueles que não são 

ou não podem ser úteis.

Ninguém respeita quem não impõe respeito.

Ninguém respeita quem cala.

Ninguém respeita quem não tem nada à oferecer.


Somos meras peças de uma engrenagem fria 

e calculista.

De reposição infinita.

Todos descartáveis.

Uns mais, outros menos, mas descartáveis.

A medida que fraquejamos.

Envelhecemos.

Caducamos.


Em meio ao tempo que avança, inexorável,

rezo para não esquecer quem eu fui.

Quem eu sou.







 

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