domingo, 12 de abril de 2020
BABOSEIRAS
Eu não vi a volta dos que não foram.
Não fui o último a apagar à luz, nem
atirei a primeira pedra.
Não faço ideia de onde Judas perdeu as botas,
nem fui o último a rir, e tampouco o
primeiro.
Não sei qual a cor do cavalo
branco do Napoleão,
nem se o buraco é mais embaixo,
se todos os gatos à noite são pardos,
não quero saber se cão que late
não morde, vai que morda;
muito menos se a esperança
é a última que morre, já que
perdi a minha há tempos.
O que me importa se todos os caminhos
levam à Roma, se nunca estive lá;
se a grama do vizinho é mais verde,
por mais que me mandem pastar.
Sem essa de que devagar se vai ao longe.
Eu quero mais é que o pau que bate
em Chico, bata em Francisco,
ainda mais sendo um papa
que dá maus exemplos e abençoa bandidos.
Mesmo porque duvido que a justiça
tarda mas não falha,
e muito menos que
Deus escreve certo por linhas tortas.
Bem mais crível é que ladrão que rouba
ladrão tenha cem anos de perdão,
ainda mais no Brasil, sob os auspícios
da banda podre do Supremo,
onde o hábito obviamente faz o monge,
e não adianta a gente chorar
pelo leite derramado.
Enfim, há quem acredite que é dando
que se recebe,
foda-se quem pensa que os últimos
serão os primeiros,
e que devagar se vai ao longe.
Muito menos
que a mentira tenha perna curta,
nesses tempos de fake news.
Afinal, se onde há fumaça há fogo,
o seguro realmente morreu de velho,
tanto faz se para um bom entendedor
meia palavra baste,
menos mal que os olhos não
vejam o que coração não sente.
Mano,
pode até ser que água mole em pedra
dura bate até que fura,
que as aparências enganem,
que o apressado come cru,
mas e daí,
se cada macaco em seu galho ?
Se a voz do povo é a voz de Deus.
Meu, há que concordar :
quem mistura-se aos porcos,
farelo come.
Que quem pode, pode; quem não pode,
se sacode.
E se escreveu e não leu,
o pau comeu,
e pimenta nos olhos dos outro é refresco.
Enfim, se é vero que quando um burro fala
convém que os outros baixem as orelhas,
grato pela atenção, grande abraço,
até a próxima,
que baboseiras aqui
não faltam.
sábado, 11 de abril de 2020
AS CINCO FASES
(ou o câncer do amor)
1. Negação
A pessoa recusa-se a aceitar, não acredita que possa ser grave.
2. Revolta
Passa a sentir-se injustiçado, reage com hostilidade.
3. Barganha
Questiona, tenta negociar, imagina que possa haver saídas alternativas.
4. Depressão
A ficha cai. A tristeza profunda advém ao perceber que nada pode fazer.
5. Aceitação
Passado o choque emocional, aceita os fatos, e aos poucos reage, passa a acreditar na possibilidade de cura.
Essas são as cinco etapas que normalmente ocorrem após o diagnóstico de câncer.
Curiosamente, o mesmo processo que envolve o fim de um grande amor.
sexta-feira, 10 de abril de 2020
Ophelinha ( e a dor de corno ) :
Para me mostrar o seu desprezo, ou, pelo menos, a sua indiferença real, não era preciso o disfarce transparente de
um discurso tão comprido, nem da série de "razões"
tão pouco sinceras como convincentes, que me escreveu. Bastava dizer-mo. Assim entendo da mesma maneira, mas dói-me mais.
Se prefere a mim o rapaz que namora, e de quem naturalmente gosta muito, como lhe posso eu levar isso a mal ?
A Ophelinha pode preferir quem quiser : não tem obrigação - creio eu - de amar-me, nem, realmente necessidade ( a não ser que queira divertir-se) de fingir que me ama.
Quem ama verdadeiramente não escreve cartas que parecem requeriment0s de advogado. O amor não estuda tanto as cousas, nem trata os outros como réus que é preciso "entalar". Porque não é franca comigo ? Que empenho tem em fazer sofrer quem não lhe fez mal - nem a si, nem a ninguém -, a quem tem por peso e dor bastante a própria vida isolada e triste, e não precisa de que lha venham acrescentar
Ofélia Queiroz, a namorada de F.P. |
Eu próprio acharia graça, se não a amasse tanto, e se
tivesse tempo para pensar em outra cousa que não fosse
no sofrimento que tem prazer em causar-me
sem que eu, a não ser por amá-la, o tenha merecido, e creio
bem que amá-la não é razão bastante para o merecer.
Enfim...
Tais versos, em forma de carta, dignas de qualquer apaixonado desiludido e com direito à peculiar pieguice, não são, no entanto, de um qualquer.
Até os grandes poetas e eruditos, como Fernando Pessoa, perdem a finesse e à mão, quando se trata de dor de corno.
quinta-feira, 9 de abril de 2020
peter pan
Eu sou aquele cara que nunca precisou de inimigos
para foder com as coisas.
Pois sempre me incumbi de ser meu maior inimigo.
Me auto-sabotar. Complicar, estragar tudo.
Fazendo e falando o que não devo.
Fui aquele menino que a mãe falava para não fazer,
e aí mesmo é que eu fazia.
Castigo, chineladas, essas coisas,
nunca me intimidaram.
Não foi à toa que fui parar num internato, aos seis anos.
Quando adulto, não foi muito diferente.
Sempre rebelde, sempre cutucando a onça com vara curta.
Ideais e carreiras abreviadas, abortadas,
por puro impulso, por mandar alguém à merda
incautamente.
Dois casamentos, dos quais sai como vilão.
Não exatamente por maldade, juro, nunca levantei
a mão para elas,
nunca me intimidaram.
Não foi à toa que fui parar num internato, aos seis anos.
Quando adulto, não foi muito diferente.
Sempre rebelde, sempre cutucando a onça com vara curta.
Ideais e carreiras abreviadas, abortadas,
por puro impulso, por mandar alguém à merda
incautamente.
Dois casamentos, dos quais sai como vilão.
Não exatamente por maldade, juro, nunca levantei
a mão para elas,
ao contrário, nunca deixei faltar nada em casa.
Não sou má pessoa.
O problema, na verdade, é que nunca amadureci.
No fundo, ainda sou aquele moleque
que pintava e bordava no engenho do meu avô,
sem ligar para nada.
E que chega à velhice, vendo tudo desabar,
por não ter crescido, por pura imaturidade.
Por ainda não ter aprendido a lidar com as coisas,
por não medir as consequências.
Sob a minha ótica de Peter Pan desajustado.
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