domingo, 28 de agosto de 2022



                  coletivos





O que ela me inspira 

mal cabe no peito. 

Inflama, arde, corre, voa, 

o coração inundado por

cardumes de ternura

enxames de desejos

hordas de carinhos

ninhadas de abraços

miríades de beijos.




 


                  amor caricato





Assim eu te amo.

Intensamente, no ato.

Vagamente, se for o caso.

Pois nem sei quem és, de fato.

Sabe Deus no que vai dar 

esse amor caricato.


Amo-te, todavia. 

Como uma gaivota que se desprende 

ao acaso.

Como a brisa que se intromete 

na tarde vagarosa.

És como a luz fosforescente nas águas dançantes.

A trovoada que ressoa distante, e seu vago 

clarão itinerante.


Amo-te sem esperança.

Abandonado como uma velha âncora.

Celebrando a vida com tua esporádica presença.

Campanário de lamentos e pensamentos sombrios

quando te ausentas.


És minha e não és.

Caçadora de meus sonhos solitários.

De dia matas minha sede.

À noite emigras para uma vida que desconheço,

em que desvanece o desejo de tê-la para sempre.


"Ah, é tão curto o amor, tão demorado o olvido" (Neruda).





                      

                                outro 

                        qualquer 

                        eu





Não sou um homem como qualquer outro.

Sou um outro como qualquer eu.


              Meu fardo é meu fado.

              Sou fiel a meu legado.

              Mas não faço nada obrigado.


O que eu era ontem não renego.

Apenas me nego 

a continuar cego.


            O mundo já acabou 

            e se refez tantas vezes,

            que nada é efetivamente novo.

            Tudo morre e renasce

            como a galinha e o ovo.


Serão os homens todos iguais ?

Diferentes apenas em condições especiais ?

Quando deixam de ser animais ?


            O que sabes tu de mim,

            se nem a ti mesmo conheces ?


Teu retrato, perdido em alguma gaveta,

honrosa exceção na profusão 

das coisas esquecidas.


         Deus se perdeu 

         na eternidade

         ou na senilidade ?


A única morada que dura

é a da sepultura.


          


 



                                idas e vindas



Partir sem motivos para partir.

Existir sem querer existir.

Ir e vir sem desejo de ficar

nem vontade de chegar.


Nos temores sem respostas, encontros 

e despedidas unidos pelo mesmo mote.

Entre o azar e a sorte.

Entre o amor e a morte.





                 pombos sem asas



Por mais que eu tente,

falho em traduzir o que sinto,

mas não obstante o dolo, o ato falho,

o caralho, alhos e bugalhos, e os escambaus,

os tolos enganos são como pombos sem asas,

anseios vãos, vê-se claramente o quanto estou apaixonado,

não me pergunte os porquês

e comos,

quando não há entre nós sequer planos,

nem futuro.

 

sábado, 27 de agosto de 2022



             o que somos ?





Se somos o que pensamos

Se somos o que comemos

Se somos o que queremos

O que somos, afinal ?

Pedaços de tolos enganos.




                 contrastes



 

Envelheço.

Aos duros contrastes me submeto

como quem vai para o cadafalso.

Eu tinha a ilusão de ser infinito

o sentimento que era meu escudo,

e quebrei a cara.

Mas ainda não perdi o prazer pelo jogo.

Meu viver é solitário, mas das fugas e sonhos

me libertei.

Ao temor de ser eu mesmo, me adaptei.

Na realidade de éter e de gesso,

tudo tem seu preço.

Pago de bom grado. 

Sei que em breve serei descartado, 

como tudo que já cumpriu seu papel.






 

 

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