domingo, 11 de junho de 2023



                            a tarde de um homem





No começo ele sonhava com cegas e estranhamente

jubilosas venturas.

No decorrer dos anos, viu tudo esvair-se

diante de balaustradas e portas que não conseguia abrir. 

Quando se deu conta, a tarde que é a tarde de um homem

se converteu em moldura.

E ao despedir-se de tudo que lhe era mais caro,

resignou-se em ser algo assim como um animal cansado

em sua toca,

que só não pode descansar.




sexta-feira, 9 de junho de 2023



                  a arte de viver



Viva tudo o que puder, enquanto puder.

Nada mais triste do que chegar a velhice

e concluir que viveu uma vida de merda.

Aproveite, explore, curta, de preferência sem perder

o bom senso. Loucuras, só ad hoc.

Estude, trabalhe, pois nada vem de mão beijada. Nada

que tenha valor.

Seja correto, baseie-se pelo certo, mas não seja refém

dos sentimentos.

Lembre-se, o caminho não é só para ser percorrido, 

mas contemplado.

Cuidado com os extremos, deguste todos os sabores

mas não morra pela boca.

Celebre o prazer mas priorize a qualidade de vida.

Seja bom sem ser tolo.

Abdica de entender, em prol da arte de viver.







 




 



quinta-feira, 8 de junho de 2023


                             luz e escuridão




Um gato preto dança na chuva,

enquanto as nuvens se despedaçam.

O vento sussurra segredos

que só os loucos entendem.


O relógio derrete no pulso

em meio aos dias que se desfazem em fumaça.

O tempo passa como borboletas

quem voam para longe, sem olhar para trás.


A cidade é um labirinto sem fim

onde as ruas se transformam em espelhos

e os prédios são monstros adormecidos

que acordam no meio da noite.


O sol é uma laranja flamejante.

Que queima a pele e cega os olhos.

A lua é um farol misterioso

que ilumina a terra com sua luz prateada.


A floresta é um oceano de sombras

onde as árvores sussurram segredos antigos

e os animais são espíritos livres

que dançam ao redor da fogueira da vida.


No jardim dos sonhos perdidos,

as realidades de cada um se antagonizam,

como luz e escuridão.






quarta-feira, 7 de junho de 2023

 



refúgio de uma alma cansada


Nas asas da imaginação me lanço

Na sutileza das palavras me enlaço

Sopra o espírito com língua bendita

Os versos que meu coração dita.


Crio paisagens e emoções que se entrelaçam

Numa teia mágica que minh'alma abraça

Suscitando os ritos misericordiosos

Que atravessam noites e alvores.


São suspiros de amor e saudade

Revelados em cada estrofe humilde

Os versos fluem como um rio sem fim

Transportando-me para além de mim.


Nas entrelinhas desvendo segredos

Ecos de histórias e seus enredos

Palavras que em mim se digladiam

Como ardentes desejos que se irradiam.


A poesia é a voz da minha alma

Refúgio de uma alma cansada.

Bálsamo que acalenta o pensamento

Na dança eterna do tempo.


Em cada verso me abro

Em cada verso me entrego

Em cada verso me perco de mim

Por que Deus me fez assim ?





terça-feira, 6 de junho de 2023


                           abraço de tamanduá





 

Em face de tantos disfarces,

o inesperado

bafeja e escarva os terrenos baldios da alma.

Encardidos restos impregnam o entendimento

que gentilmente nos ignora.

Os miasmas dos despojos merencórios circundam 

o vazio que chicoteia a memória.

O tempo de pensar-se emerge quando a visão do perdido

se anela 

em mãos sujas de erros e pecados.


Bendito aquele que se detém diante do caminho 

da mútua compreensão,

e com o espírito desarmado, estende a mão.

Serão muitos, serão poucos, quantos serão ?

Nunca, ou eventualmente, saberemos.

Em meio aos dias carbonizados, bruxuleiam os dilemas

que mal e mal compreendemos.

Ao redor dos quais, a vida nos acolhe

com seu abraço de tamanduá.








                       amar nunca é em vão





Enxugue as lágrimas

Apascenta o coração.

Por mais difícil que seja

Ouve a voz da razão.


Lava o espírito

que outros amores virão.

Ou não ! 


Creia, por maior que tenha sido 

a desilusão,

amar nunca é em vão.



domingo, 4 de junho de 2023


                      a náusea de viver



Em algum lugar há alguém que vai cruzar seu caminho,

e marcá-lo para sempre. Para o bem ou para o mal.


Em algum momento a vida vai partir-se ao meio,

parindo mágoa, morte, dor.


Em algum passo em falso, a sorte vai te abandonar como

um cavalo em pânico.


Nos dias que se abrem e repartem,  há que reaprender 

a liturgia dos símbolos. 

A oferenda da liberdade e do livre-arbítrio.

Contornar as armadilhas da carência.

Aprumar-se ante as vertigens do sexo.


A cada nova situação, um novo enfoque a trabalhar-se.

Adequar-se ao rude ofício, não se intimidar com o uivo

do lobo, o bramido do tigre, que nos espreitam

ao longo da labuta inclemente.


Há sempre muito à aprender.

Às vezes, aprendendo a desaprender.

Abandonar as crenças infundidas.

As virtudes corrompidas.

O amor conspurcado.

Refazer-se da mágoa de existir.

Renascer no esgar dos sentimentos exauridos,

num contemplar-se quase obsceno.

Posto que a vida carece de ser um pouco suja.


Na aventura renovada, refazer-se para ter olhos para ver.

Renunciar às pantominas dos dramas.

Afeiçoar-se àquilo que escalavra e corrói.

Dar outro sentido para o que não tem sentido.

Da pedra colher uma flor dura.

Encontrar-se nas coisas possuídas sem segredos.

Para suscitar outros desejos, a despeito

da náusea de viver.











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