"O coração não se cura ao esquecer
mas ao compreender". (Andrew Faber)
o mundo não tem segredo

história interrompida
O tempo quebra
todas as resistências.
Refaz coisas interrompidas
e corações feridos.
O conhecimento
cobra o preço da inocência.
Questões mal resolvidas decifram
velhos caminhos.
A memória merencória engendra
artifícios fac-símiles.
Lugares abandonados
reciclam-se
à margem do transmutado.
Meu lascivo anti-ser é o avesso
que já finda.
Hora de lastimar o olvido.
O apito pontual do engenho do meu avô.
A agonia das tardes de chuva preso em casa.
O velho pastor alemão cego de um olho.
O menino que brincava de desafiar a morte.
Lembranças que resistem à sentença irrevogável.
Na dobra do tempo,
os sentimentos se misturam.
Melancolia e paz a cada
história interrompida.
Tudo ressoa em mim
como se não tivesse fim.
Como se tudo
já não tivesse acabado.
"É um endemoniado", diziam sobre aquele rapaz
que não deixava ninguém em paz.
Era, no fundo, inofensivo, incapaz de algum gesto violento,
apenas gostava de infernizar a vida de todo mundo
com brincadeiras de gosto duvidoso.
Estava sempre pregando sustos nos outros, berrava do nada,
fazia careta para as crianças e cara de bravo para os adultos,
às vezes abordava as pessoas para fazer perguntas sem nexo,
em suma, não batia bem da cabeça.Tão lelé da cuca que era
quem mais se divertia com suas diabruras, e ainda mais
da notoriedade que tal comportamento granjeava. Não sei
porque cargas d`água sempre que me via, repetia : "eu vou
te matar, Ivan Berger !".
Passados uns trinta anos, vi-o outro dia, atravessando
a rua, cabisbaixo, já meio curvado pelo peso
da idade, mas ainda assim facilmente reconhecível.
Por um instante, me veio a lembrança a correria da molecada
quando ele se aproximava, e um deles gritava :
- Corre que o Satanás tá chegando !
de fio à pavio
Às vésperas de partir, o préstito de alegorias segue
os enganos deleitáveis da infância.
Tendo o tempo todo para ser, desvenda-se a lâmina
dos dias à vista dos verdes anos.
Dir-se-ia que suspensos apenas pelo nó do apelo,
irreversando despautérios tartamudos.
Querelas e quizilas escarafuncham plantas carnívoras.
Lugar comum é onde o improvável se torna viável.
A despeito de tudo, estamos bem mas não muito.
O estado de direito inspira cuidados.
De fio à pavio, cada Cesar com seu cídio.
O verdadeiro diverge do contraditório em prol
do entendimento.
Todas as coisas finitas demoram.
Fundem-se às eurritmias terrestres em rondas aladas.
Esgotado o assunto, anomalias engendram equinócios.
Para entender a presente fábula, consulte um rábula.
Uma coisa é certa : por mixórdia brigo mais não.
o que é bom, é bom A vida leva tudo de roldão Nada se detém, nada se retém O que vale é viver o momento Não importa o...