terça-feira, 21 de fevereiro de 2017




                 
                              

                               A BESTA HUMANA



Nos domínios dos facínoras do Estado Islâmico, do exército de Bashar al Assad, do PCC ou Comando Vermelho; nas ações dos homens-bomba do fundamentalismo islâmico, e atentados gratuitos em que a tônica é a banalização da morte.

Nas mambembes aldeias africanas, em que milhões passam 
fome e vivem em condições sub-humanas, matando e sendo mortas em seculares conflitos étnicos fadados a auto-aniquilação. 

Nos morros e favelas dos grandes centros urbanos, em cujas edificações improvisadas a pobreza atinge seu grau mais degradante.

Nos bairros decadentes e suas ruas e becos sombrios, em que seres humanos se destroem, se vendem e morrem de inanição e overdoses.
Nas estigmatizadas cidades fronteiriças mexicanas, nas paupérrimas aldeias andinas, nos bairros periféricos das grandes metrópoles, nos guetos, praças e bairros barra-pesadas, berços da onipresente criminalidade contemporânea. 

No efervescente Oriente Médio, no sudoeste asiático, no leste europeu, onde a desigualdade social extrema se perpetua por conta de regimes autoritários e/ou divisões de classe ensejadas por seitas religiosas sectárias e discricionárias. 

Nos points de diversão, discotecas, boates e bailes de funk e putaria explícita, templos de uma juventude turbinada pelas drogas, bebidas e promiscuidade. 

Nos meios de comunicação, programações, publicações, redes sociais, praças esportivas, e manifestações pretensamente artísticas, espelhos do gritante rebaixamento cultural que caracteriza os tempos atuais.   

Nas inúmeras organizações criminosas que proliferam e se digladiam em todos os setores e quadrantes, manifestas em esquemas e sistemas fraudulentos, inerentes ao poder e a manipulação massiva e coercitiva da população, e mantidas na base da força ou do engodo religioso. 

Isto posto, cabe a pergunta : haverá alguma coisa, algum lugar que não esteja contaminado, conspurcado, vilipendiado pela besta humana ?  







segunda-feira, 20 de fevereiro de 2017





                         A TURBA


A multidão está insatisfeita, 
quer fazer justiça com as próprias mãos.
Por as mãos nos poderosos. A burguesia 
que se cuide.
Da minha janela vejo, aflito,
o mundo soçobrando.
Tranco a porta. Escondo o meu ouro.
Que não é muito. Mas dá para o gasto.
A multidão está a minha porta;
nervosa, hostil, me espia feito um
animal à espreita da caça. 
A multidão me dá medo, me arrepia.
Fico quieto, 
no afã de passar despercebido.
Nem respiro, me encolho para não ficar
à mercê de seus tentáculos de polvo.

O que quer a turba ? Qual o motivo de tanta ira ?
Será a fome que se alastra, a miséria que se
tornou insuportável, 
o circo perdeu a graça ?
Ora, não foi sempre assim ? 
A multidão ferve, reclama, já não se
contenta com migalhas.
Ouço o seu clamor e perco o sono.
Confiro a tranca, que ruído é esse ?
Serão passos ou minha imaginação ?



segunda-feira, 30 de janeiro de 2017





                     alguém como tu




Alguém como tu não se encontra todo dia.
Às vezes nem em uma vida inteira.
Linda e iluminada,
perfeita até nas raras imperfeições,
faz a vida digna de ser vivida. 
Serena e altiva em tua simplicidade,
és amiga e amante na proporção exata
que te faz única e especial.
Generosa e intuitiva,
conhece como ninguém minhas fraquezas 
e idiossincrasias.
E ainda assim não me julga, não cobra nada 
além do que eu posso dar.
Que vem a ser o que me inspiras.
Nada mais, nada menos, 
que o melhor de mim.



terça-feira, 20 de dezembro de 2016

                              A QUEM INTERESSAR POSSA


Poucos de nós somos capazes de reconhecer os próprios erros, assumir culpas e responsabilidades por atos que não só prejudicam como inviabilizam as relações que costuramos ao longo dessa grande colcha de retalhos que é a vida. 
São poucos os que conseguem olhar para além do próprio umbigo, deixar o egoísmo e a mesquinharia de lado, e sobretudo, colocar-se no lugar dos outros para melhor entendê-las, ampará-las e partilhar de suas dores e problemas. 
Em suma, pouquíssimos de nós correspondemos ao elevado conceito que fazemos de nós mesmos. Conceitos estes naturalmente moldados por premissas e ideais deformadas pelo próprio meio ambiente, familiar e social, em que estamos inseridos. Ou seja, pelo que nos é incutido em casa e na rua.  
Nesse contexto distópico, o conflito entre o que temos, o que somos ou podíamos ter sido, permanece como uma abstração que nos sonega a percepção de que a felicidade está nas coisas mais simples. De que estar de bem consigo próprio e com a vida, é a maior das conquistas. 


Alvorada na praia de Itararé, São Vicente/jan 2017    











sábado, 10 de dezembro de 2016


                             nenhuma, nenhoutra *




      

Uma parte de mim é transparente,
a outra inconstante, divergente. 
Uma é inerente, 
a outra insolente, contundente.
Uma parte é insipiente,
a outra é incandescente, caliente.

Uma parte de mim é intransigente,
a outra é paciente, indulgente.
Uma é beligerante, intermitente,
a outra é irreverente, malemolente.
Uma parte é benevolente,
a outra mente.

Uma parte de mim é gente.
A outra, indigente. 
Uma parte de mim é o que eu sou.
A outra, o que finjo ser.
Uma parte é dueto.
A outro, minueto. 
Uma parte, parte.
A outra, reparte.
Uma e outra são partes
da mesma parte.
Uma.
Outra.
Nenhuma, nenhoutra.


* (devo essa variante à Ferreira Gullar )

 

sexta-feira, 2 de dezembro de 2016



              PARA TODOS E PARA NINGUÉM 





Não escrevo para ser agradável.  Não escrevo para fazer proselitismo, para quem tem ouvidos moucos, cegos que não querem ver.
Não escrevo para os fracos, para que não se sintam melindrados; nem para os raivosos, que reagem com a bílis e agressões gratuitas.
Não escrevo para idiotas, que de idiota já basta eu. Não escrevo para intelectuais, doutores, bacharéis e eruditos de antanho, com suas prendas e bordados, para não passar vergonha ou ensinar o pai nosso ao vigário.
Tampouco escrevo para autodidatas, diletantes, neófitos nas artes e das artimanhas da vida. Nem para os crentes, abduzidos de esquerda e direita, e sobretudo, chatos em geral, os tais que brilham feito ouro de tolo.
Não escrevo para o público, que já tem ícones e oráculos à rodo, além do gosto especial por apedeutas, salafrários e meliantes em geral, ungidos aos mais altos cargos e com direito a chave do cofre. Minha mensagem é mais modesta e errática, tipo aqueles escritos confinados em garrafas que boiam em mares revoltos, até lançadas n`alguma praia ignota ou sumirem sem deixar vestígios.     

Não escrevo para impressionar, esclarecer, e muito menos matar a cobra e mostrar o pau. Não escrevo para provocar, ter razão, estou mais para desafinar e sair pela tangente, pois cansei de bater de frente e sair mal na foto.

Não escrevo para convencer ninguém de nada, muito menos do que não tenha convicção, ou seja, sobre pouco ou quase nada. Não escrevo para mostrar um conhecimento que não tenho, leigo que sou em quase tudo, mas cioso do papel de eterno aprendiz.
Não escrevo para contar histórias que não sei, posto que nada de extraordinário vivi; e o que vivi, possivelmente não interesse a ninguém, embora seja o meu bem mais precioso, confinado em algum ermo canto do meu coração. 
Não escrevo para ser compreendido, e muito menos admirado ou amado, tal qual um Paulo Coelho repaginado, ciente de meus parcos conhecimentos e habilidades. Não escrevo para dar lições de moral e bons costumes, para não parecer um anacronismo nesses tempos de moralidade elástica e costumes desvirtuados.
Não escrevo para os politicamente corretos e falsos moralistas, que no apagar das luzes seguem o velho mantra "faça o que eu digo, e não faça o que eu faço".  Tampouco escrevo para os que ficam em cima do muro, para os que não fedem nem cheiram, as "maria vai com as outras", os que não cagam nem saem da moita, e por aí adiante.

Isto posto, para quem escrevo, afinal ? Para todos e para ninguém, por supuesto.  


     



Postagem em destaque

                                       não acredite                         quando digo                        que te amo Não acredite quand...