domingo, 22 de março de 2020



                               

          amor ordinário ( à moda Bukowski )






O amor ordinário é
como uma escova de dente gasta.
É como comprar um carro usado
com o motor fundido.
É comprar um bilhete
que já correu.
É pegar o ônibus errado
e não ter grana para voltar.
É cagar na cueca pensando
que é um peido.

O amor ordinário é como um vício.
Você sabe que faz mal
mas não consegue largar.
É uma piada pior que a vida,
no entanto, não há nada melhor.
Não ter certeza de nada, sem nada esperar
a não ser viver o momento.
Sem falsas ilusões, portanto.

Amor ordinário, sem futuro, atrelado ao 
passado que sempre volta, 
apegar-se,
nem pensar.
Esse é o pacto. 
Nada de promessas, cobranças,
compromisso. 
Coisa de segunda mão, sem garantia.
O que tenho a oferecer é insuficiente.
O que tens para me dar, agarro com 
unhas e dentes. É pouco, 
mas não posso querer mais.
O amor ordinário não se submete,
não aceita imposições.
É o que é.
Intangível, postiço.
De tão ordinário,
sujeito a acabar com um simples
bloqueio no wats ap.





























sábado, 21 de março de 2020





                                pandemia






Em cada instante a vida é diferente.
O tempo de saber que somos absolutamente
impotentes, sempre chega.
Há sempre imprevistos  
de força maior.
Sentimentos deterioram, relações desgarram.
Um reles e sorrateiro vírus põe o mundo
de joelhos.
Qualquer tempo é tempo de tudo se subverter.

Dilemas existenciais, desilusões amorosas, 
preocupações comezinhas,
de repente perdem o sentido
diante do elementar desafio da subsistência.
Na supressão do básico, saúde, trabalho, 
ter o que comer,
todo o resto se torna secundário.
Grandes lições embute a anunciada pandemia.
Sobretudo, que nada nos pertence.
Tudo nos é temporariamente delegado.
E subtraído sem aviso prévio.

Do nada advém a hora amarga.
No querer abraçar as coisas,
a inútil compreensão de quem se sabe
impotente. 
Mutilado pela vida.
No fugaz prazer e no perene abandono,
o desejo de explicar, de entender
a constante fuga.
A existência sem nexo, 
amada e repelida.
A tardia consciência de que 
só a compaixão nos salva. 
Não nos pode faltar. 






























quinta-feira, 19 de março de 2020





                                           teimando em teimar







A gente devia saber,
sem passar por tantos perrengues.
Quando uma coisa está perdida, melhor
esquecer. 
Se conformar,
Toda e qualquer insistência não só
é inútil
como desagradável.
Não há nada mais deprimente do que
se humilhar, correr atrás de 
quem não quer mais saber da gente.
Que não se importa mais,
está pouco cagando para essas baboseiras
de lembrar as 
águas passadas, os supostos bons tempos.
Mesmo porque podem ter sido bons só pra você,
vá saber. 
É preciso aceitar que tudo tem seu tempo,
que quando acaba, acabou, 
Nunca mais será 
o mesmo.
E os remendos pegam mal, como diz aquele antigo
hit do Guilherme Arantes.
A merda é que a gente teima em teimar.
Parece que precisamos passar por essa autoflagelação. 
O que seria até natural se não servisse apenas
para apequenar a gente ainda mais.
Pois é bem como sacou o nosso imortal Millôr :
mulher quando deixa de amar um homem,
esquece até que deu para ele.















domingo, 15 de março de 2020







O romantismo morre 
Num domingo ensolarado
Na volta da praia
No frango assado
Comprado na padaria.



sábado, 14 de março de 2020



                             me ensina a esquecer ?  







Não, 
não vou te fazer o favor de morrer.
Não ainda. Não assim, de forma tão inglória. 
Ainda que já tenha morrido na antiga vida.
Afinal, não passo de um vulto
que perambula por aí.
Uma sombra do que fui.
Onde tudo é irreparável.
Talvez o próprio mundo tenha acabado.
Mas faria tudo de novo.

Você diz que morri
mas não acredito.
Não é como virar a chave. 
O coração fechado não é dono da memória.
Também me proibi de te amar,
mas os pensamentos retornam como aves
de arribação.
As lembranças estão em tudo.
Eu me lembro de tudo. Me ensina a esquecer ?
Quando se ama, quando se amou, 
todo tempo é presente eternamente.










sexta-feira, 13 de março de 2020



                     condições


Há condições em que amar e odiar
se fundem e se confundem.
Ao fim e ao cabo da excruciante jornada sem meio-termo,
a vida dá e falsifica.
Concomitantemente aos desatinos que precedem 
os desastres.
Posto que depois da abundância vem à escassez.
E o amor em ódio se transforma. 

As regras são arbitrárias.
Na transitoriedade de tudo,
é onde tudo acaba.
Adaptar-se é a única escapatória.
Co-habitar com as perdas, as doenças,
às condições extremas.
Às condições herdadas. 
Às falsetas do destino.
Aos erros crassos.
À falta de sorte.

Latos, desesperados, defraudados,
cegos, 
vivos e mortos passam da mesma forma.
Morrer em vida, que má sorte - a pior morte.   
Onde acaba o amor começa a dor.
Nas esferas da existência, a mão do tempo
retém o que poderia ter sido e o que foi.
O futuro emulado no engodo do passado.

Viver a morte dos sonhos, a dor dos vivos,
em meio a consciência do fracasso,
quando enfim caem todos os fingimentos,
eis a derradeira condição.




















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