sexta-feira, 29 de julho de 2016


                  O TERROR NOSSO DE CADA DIA



Os mais sábios conselhos são geralmente os mais simples e elementares, o que não significa que sejam fáceis de seguir. Muito pelo contrário, se assim fosse grande parte dos problemas da humanidade não existiriam. A começar pelos mais proferidos e alardeados em lares, púlpitos, os favoritos da chamada sabedoria popular, e em torno dos quais prolifera e gravita o mais lucrativo filão da indústria literária : os livros religiosos e de auto-ajuda.
Mantras como o lema do cristianismo "ama ao próximo como a ti mesmo", ou a regra de ouro de todas as religiões, "não faça aos outros o que não deseja para si", não obstante se constituírem em premissas que asseguram um mínimo de ordem e civilidade ao planeta, obviamente estão longe de resolver o recorrente drama da conflagração humana.
Simplesmente, porque não há como esperar ou exigir valores morais, integridade de princípios, de quem não teve acesso a educação, instrução, e muitas vezes, sequer a condições mínimas de subsistência.
A luz da razão e do conhecimento formal, sob os quais o mundo bem ou mal sempre se equilibrou e se manteve habitável, a ruptura da ordem e da normalidade assim delineada, configurada pela barbárie e selvageria de uma forma ou de outra sempre presente, parecem inexplicáveis e injustificáveis. Sob o ponto de vista deles, porém, das hordas de marginalizados, espoliados, escravizados, enfim, dos excluídos do clube dos poderosos e privilegiados, a retaliação irracional e radical acaba sendo o recurso natural de revide e protesto. 
Em suma, o que para o mundo supostamente civilizado, justo e moderno, representam agressões e atentados inaceitáveis e injustificáveis sob todos os aspectos, para quem nada tem a perder, para quem nada tem, desprovidos de condições mínimas de subsistência, quando não desalojados de suas terras, de seus países, o único consolo acaba sendo poder inflingir um pouco de dor e terror aos que vivem na fartura e no conforto. 
E de fato, se quem tem o supérfluo tem o alheio, como advertiu o próprio Cristo, o mundo tem muito a se penitenciar, muito sofrimento pela frente. Um ônus pesado e doloroso, sempre presente na sangrenta história da humanidade, associado a miséria, as desigualdades sociais e a cobiça. 
Flagelos que cada vez mais continuam se sobrepondo as eventuais boas intenções, e que só cessarão quando o homem efetivamente por em prática os sábios conselhos e ensinamentos que costuma apregoar da boca para fora.     



   





          


segunda-feira, 25 de julho de 2016



                SE...
( Tributo a Rudyard Kipling)





Se és capaz de manter a calma e a esperança em meio a rotina de transgressões, falcatruas e violência generalizada que grassam a torto e à direita.

Se és capaz de conviver bovinamente com toda sorte de mazelas e ilicitudes que maculam indelevelmente a reputação e a autoestima de nosso amado país; e ainda assim aceitar, compactuar e apoiar os responsáveis por esse estado de coisas, em nome de interesses e convicções político-ideológicas sectárias e retrógradas.

Se és capaz, não obstante todo o histórico de falcatruas e embutes perpetrados pelo famigerado regime lulo-petista, de ainda assim acolher o capo di tutti capi  como salvador da pátria.

Se és capaz de acreditar e se deixar abduzir por meias-verdades e apelos de uma mídia essencialmente manipuladora e mercantilista, dando ouvidos aos charlatões e impostores transvestidos em formadores de opinião.

Se és capaz de prestigiar e idolatrar artistas e celebridades que não se constrangem em declarar apoio ao partido político mais corrupto e imoral de nossa história.

Se és capaz de sofrer e até de brigar por coisas irrelevantes como o mercantilizado futebol; se és capaz de passar horas vendo supra-sumos da vulgaridades televisivas como o BBB, a Fazenda, De férias com a ex, e outros bichos. Se és capaz de se deixar seduzir por joguinhos virtuais, games, youtubers e congêneres; curtir excrescências como o funk de periferia, que afora o nível abominável, se notabiliza pela apologia ao banditismo e a libertinagem. 

Se és capaz de, não obstante os logros, roubos, escândalos e mutretas, continuar trabalhando, cumprindo com suas obrigações de cidadão, pagando impostos, juros obscenos, e nas eleições, reeleger os picaretas de sempre. 

Se és capaz, enfim, de não apesar de toda sorte de empulhações e achaques, comparecer com o dízimo compulsório das IURDs da vida; pagar fortunas para ver shows de pseudo-artistas e espetáculos de quinta categoria; e de, como no meu caso, não perder a mania de escrever mal-traçadas que ninguém lê, a não ser a fraternal galerinha de sempre, então, parabéns, não és apenas tolo e turrão.
És o homo boobus por excelência.




PS. Homo bobbus é como o jornalista norte-americano H.L.Menckem, que fez fama na década de 30 por sua verve ferina e satírica, chamava as pessoas incapazes de depurar e racionalizar os fatos.



sexta-feira, 22 de julho de 2016


                                A TOCHA QUE ATOCHA
                                         


Independente dos resultados das competições propriamente ditas, um feito inédito o Brasil já garantiu nessas Olimpíadas : em relação a tocha olímpica, nunca a dita cuja viajou tanto e passou por tantas e variadas mãos, como por estas bandas.
E em particular na Baixada Santista, onde desfilou em carro aberto,escoltada por soldados e bombeiros, levada a pé por avenidas, subiu morro e plainou de para-pente; singrou o canal entre Santos e Guarujá num cortejo de remadores; passeou por praias, praças, palanques, passando nas mãos de atletas e para-atletas laureados, anônimos, aposentados, e principalmente, enxeridos de diversas áreas, com direito a lágrimas e acenos a reduzida porém compungida platéia que acompanhou a procissão.
Em suma, um dia inesquecível para um público específico e - verdade seja dita - extremamente reduzido, dado o elevado índice de reprovação que cerca a realização de um evento multi-bilionário, em meio a colossal crise que o país atravessa, e por isso mesmo, perfeitamente dispensável e até aborrecido para muita gente. Ou seja, para os que já não se deixam iludir e muito menos se empolgar com o tom diversionista e ufanista disseminado pelo jornalismo de saturação que caracteriza esse tipo de evento.
Nesse sentido, o resumo da ópera bufa que representou o desfile da tocha por nossa região não deixou de refletir com exatidão o contraste desse show iminentemente mediático com a dureza que enfrenta a parcela majoritária que trabalha, produz, e vai a luta, passando horas em ônibus, em filas, no trânsito, no implacável pega-pra-capar pela subsistência.
Transtornos agravados com a realização de pantominas como o desfile de um símbolo sob o qual pairam, cada vez mais, sérias dúvidas sobre a lisura e integridade que deveria inspirar. Com o duro golpe que representou a descoberta de um grandioso esquema de doping envolvendo toda a equipe de atletismo da Rússia, que custou sua vexatória exclusão dos jogos do Rio.
Quando a coisa tinge esse nível de manipulação e desvirtuamento dos valores olímpicos, tanta veneração e reverência por um símbolo ostensivamente explorado e alinhado com os interesses comerciais e mercantilistas em jogo, convenhamos, só sendo muito ingênuo ou otário.

quarta-feira, 20 de julho de 2016



Sempre gostei de ler, escrever, mas, paradoxalmente, resisti bravamente por anos a ideia de criar um blog. Em parte porque me dava por satisfeito em ver meus artigos publicados no prestigioso  Observatório da Imprensa, o site de crítica ao desempenho midiático concebido pelo respeitado e decano jornalista Alberto Dines; e outra, simplesmente por não saber muito bem sobre o que escrever, qual o público alvo, como não ser apenas mais um entre milhares de blogueiros anônimos que povoam o vasto universo da blogosfera.
Foi preciso o Observatório virtualmente abjurar de seu propalado pluralismo, ao me fechar as portas sem qualquer explicação, após dez anos e quase 100 artigos publicados, para que passasse a considerar outras opções. Primeiro, o indefectível Facebook, cujo espaço, não tardei a notar, não é o mais apropriado a textos pretensamente mais elaborados; e agora, este (ou estas) Pequenas Partilhas, blog com nome de vinho de boa cepa, em forma de bloco de notas, resenhas, rabiscos e o que mais der na telha. 
Principalmente este último, já que a ideia é se possível fazer um registro diário, sobre qualquer assunto, qualquer tema. Ou seja, o que der na telha.
Sejam bem-vindos e bom proveito !



terça-feira, 19 de julho de 2016

A INTENTONA TURCA E NÓS

A frustrada tentativa de golpe na Turquia encerra algumas lições importantes e de muita utilidade no momento delicado que nosso país atravessa. A mais evidente e emblemática é o inevitável trauma e custo social que esse tipo de intervenção normalmente acarreta, independentemente dos motivos e possíveis justificativas.
Obviamente, rupturas bruscas e violentas não transcorrem sem medidas de exceção e vítimas, tendo como primeiras e imediatas consequências a supressão de direitos democráticos, como a liberdade. É claro que as motivações que ensejaram a tentativa de golpe na Turquia diferem por completo das evocações nesse sentido que povoam o imaginário de boa parte de nossa sociedade, manifestadas
cada vez mais assiduamente nas redes sociais.

Enquanto lá os fatores étnicos e religiosos são preponderantes e recalcitrantes, aqui a insatisfação e o anseio por mudanças drásticas se avolumam por razões bem mais prosaicas, ou seja, a desilusão e ojeriza a governantes e a corrupção institucionalizada entranhada no país. Descontentamento que se acentua face à recorrência de dos delitos e a tradicional letargia da justiça, personificada pelo comprometimento político do STF, cuja postura reticente e ambígua dos ministros nomeados pelo governo petista, tem visivelmente refreado as ações daqueles agentes que assumiram o papel de combater o regime de ilicitudes introduzido pela governança petista, simbolizada pela operação Lava-Jato.
Tal lassidão, aliada ao ambiente promíscuo e permissivo reinante no Congresso, é o que alimenta a crença de que somente uma intervenção militar possa mudar esse quadro perverso. O fato de o golpe de 1964 ter sido desfechado a pretexto de impedir a conversão do país ao comunismo, ou mais exatamente, ao modelo cubano de socialismo, para muitos justificaria uma ação saneadora e depurativa de força maior, dada a degradação dos poderes constituidos. 
O dramático e sangrento desfecho da intentona turca mostra que o melhor caminho não é bem esse. Apesar de sedutora, uma intervenção militar seria um retrocesso impensável, provado como está que medidas de força e de exceção são meramente paliativas, sem falar na rejeição e injunções que o país sofreria da comunidade internacional.
Não obstante a gradual revisão que hoje em dia se faz do golpe militar de 64, cumpre lembrar o alto preço pago para a consolidação da democracia no país, cujos princípios devem ser coerentemente  preservados por meios pacíficos e civilizados.
Das Forças Armadas espera-se, isto sim, que garantam o cumprimento das leis e o funcionamento irrestrito dos orgãos competentes, ou seja, o Ministério Público e a Polícia Federal. Bem como se posicionar mais firmemente ante as tentativas de cerceamento e limitações ao trabalho desses efetivos braços de nossa leniente justiça, esboçadas em projetos de leis que visam proteger e ampliar prerrogativas como o foro privilegiado. Cujos mentores e autores, é claro, são os nomes que mais figuram nos casos de delitos apurados pela Lava-Jato.


domingo, 17 de julho de 2016





                             
                                                       PROGRESSO




Quero um lugar que me lembre o velho lar,                              .
onde haja liberdade, muito verde e espaço
para brincar.
Um rio límpido e repleto de peixes.
Campos onde pássaros e bichos possam vagar.

Se alguém souber, faça o favor de avisar.
Onde ainda haja um bosque, uma estradinha de terra
para caminhar, pés no chão.
Um lugar livre de fábricas e máquinas sombrias.
Multidões e sirenes frenéticas.
Progresso.

Nossas crianças de hoje são outras, bem ou mal
vão crescendo.
Podem ser felizes, mas são diferentes.
Não sabem o nome dos pássaros,
só o dos heróis de mentirinha.
Não conhecem o gosto das frutas do mato,
só o sabor artificial das alquimias.

O tempo passou, o mundo mudou, 
não há como voltar atrás
e reparar os danos a vida, a natureza.
Florestas, rios e animais desaparecem
para que o homem tenha conforto.
Mais dia, menos dia, porém,
talvez não reste senão um planeta morto.




                                     
                                  

                                   ( ESCRITO EM IDOS DE 1990 )

sábado, 16 de julho de 2016

um blog para chamar de meu...




Despretensiosamente, sem compromisso, a não ser o de compartilhar os achados e guardados que venho colecionando ao longo do tempo, na forma de reflexões, registros e testemunhos dessa minha atribulada jornada.
Em suma, simulacros de uma vida que vi passar como da janela de um trem, feita de paisagens e paragens que pairam na memória como retratos amarelados de uma antiga Polaroid.



Postagem em destaque

Às vezes me pego pensando nela. Sem querer, querendo. Porque as lembranças de um  grande amor com o tempo superam a raiva. A longo prazo tud...