o beijo de Judas
O defenestrar-se repentino,
em inexorável desdouro.
O vazio inapelável.
Desaparecer no rebojo da alma.
O fim guarda todos os mistérios.
Tudo o que foi e o que podia ter sido.
Guarda as coisas esquecidas, as noites insones,
as horas de alegrias e angústias.
Guarda os caminhos ignorados, o começo do fim.
Ferido de amor e de morte.
O fim chega assim, grave, pacífico, duro.
Chega para lembrar que a gente não é nada.
Que tudo se desfaz.
Às vezes da maneira mais sórdida.
Ao esquecimento o fim remete.
Tangido e evadido.
Vadio e fodido.
Sob mil coisas impressentidas desfigurado.
Como um rio que se banha em seu lodo.
Chegar ao fim sem nada poder fazer, sem ter o que dizer,
sem direito a nada, e, súbito,
compreender,
que o seu tempo havia acabado.
Que outras razões não havia,
senão pura e simplesmente,
o amor acabado.
De modo a subtrair daquela vida
a essência que a mantinha.
Um ausentar pior que a morte, urdidura de cansaço
e traição.
O fim é o beijo de Judas.