sábado, 24 de setembro de 2022


                               honoris causa





Escrevo meus poeminhas sem maiores pretensões. 

Como quem não sabe fazer outra coisa

para aliviar o coração.

Sem me preocupar em ter razão, ou até mesmo

de escrever em vão.

Não me arvoro em ensinar nada a ninguém.

Sou doutor honoris causa em decepcionar

quem me quer bem.


 



                          condição sine qua non





De fato,

quero mais do que você pode me dar.

O coração sem dono.

O corpo que dás a todos.


De fato,

quero mais do que você pode me dar.

Respeito e exclusividade

como condição sine qua non.


De fato,

quero mais do que você pode me dar.

Tê-la só pra mim.

Preito que ignoras.


Mas saiba, neném,

agora é pra valer. 

Não divido 

você com ninguém.


É pegar ou largar.






sexta-feira, 23 de setembro de 2022





Coisas na vida que não se regeneram :

amor, ladrão e puta.


  

                     

                     o direito de fraquejar



 


De dar dó, esse cara.

Cansado de se fazer de forte.

Cansado de lutar contra o desânimo, a tristeza.

Cansado de ver que nada se resolve, nada acontece,

em boa parte por culpa própria, como bem sabe.

Cansado de si mesmo, de como lida com as coisas,

de como não se faz respeitar, 

por conta do coração generoso e molenga.

Vive com o filho adolescente que o tem como um

criado. 

Os outros dois mal tomam conhecimento 

de sua existência, menos mal, dele já não precisam.

Do amor nada mais espera, e vive tentando se convencer  

que é melhor assim.

Que o importante é a saúde, o ganha-pão, 

o que felizmente não lhe faltam.

Só que a vida não é só isso. 

Não para quem tem um buraco no coração, sofre de uma brutal

carência afetiva. 

Que carece de ser lembrado, de um ombro amigo,

interesse genuíno, e não da boca para fora, 

que é o que mais têm.


Pois é como ele se sente neste exato momento. 

Talvez amanhã passe, e volte ao "normal".

Cabeça erguida, fingindo não precisar de ninguém. 

Sem direito à fraquejar. 





 











 



                       QUE NOJO !





À vista dos fatos,

não posso deixar barato,

posto que tudo fede.

A grande farsa que se engendra

não é prerrogativa de pobre,

é um banquete de carne podre.


O notório vigarista volta à cena,

para retomar os despojos dos antigos saques,

no país em que o crime compensa.

Em que o mal impera, 

sem justiça, sem decoro, sem povo. 

Que nojo ! 



 


                      

                                     doce ira





Gracioso e fúnebre.

Gracioso e fúnebre.

Todos os caminhos levam ao ergástulo.

Morrer pela espada.

Morrer pela fé.

Caminhos díspares que desde sempre se cruzam.

Doce brandura, doce ira,

dura é a vida

que com uma mão dá

e com a outra tira.


 

quinta-feira, 22 de setembro de 2022




                 nada podia ser melhor





Meu momento é de contrição.

Mas sem remorsos vãos, porquanto inúteis.

No jogo jogado, as perdas e ganhos já não contam.

Tudo se resolveu por conta própria.

O mundo das coisas gastas, a dissipação das dúvidas,

os pináculos do pentagrama :  o círculo se fecha

à desguisa das diásporas e metástases.

O tempo flui neutro.

Nada podia ser melhor.

A rosa cortada, a fórmula exata da vida desperdiçada

subtrai-se até o extravaso do bicho carpinteiro.

Meu momento : o coração saltimbanco, resgatado,

tergiversando, caindo de maduro ?

Please, poupem-me dos detalhes sórdidos...

Gazua não serve. Bazuca, talvez.

Como diria Leminski, em  briga de camundongo perneta 

com caranguejo capenga, abelhudo não se mete.

Se agora me interrogo é porque me desconheço.

Refugiando-me em Maracangalha.

Insignificantemente sujo, pouco, interdito.

Me busco onde está tudo perdido.

No nuliverso.

Agora deu.






 

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