segunda-feira, 10 de outubro de 2022



                 o mundo fede





Caem as certezas,

fica a desconfiança.


Caem as crenças,

ficam as controvérsias. 


Caem as esperanças,

fica o desalento.


Caem as promessas,

fica o descrédito.


Caem as fantasias,

fica a realidade nua e crua.


Caem as verdades,

e as mentiras se perpetuam.


O mundo fede.






 

domingo, 9 de outubro de 2022



                         UM MINUTO





Em um minuto faz-se um poema.

Impressentido, repentino, a elevar-se entre os mistérios

da realidade desfocada.

Urdido nas entranhas daquilo que não se consegue expressar.

Daí sua razão de ser.

Isento de blasfêmia.

Lambendo, se lambuzando de palavras lacanianas.

As pesadas asas tangenciando as incompreensões.

Roçando as raízes encravadas no peito.

Um minuto para que o silêncio se faça perene,

e o coração viciado em dissídios 

renuncie a ilegível insipidez.

Um minuto e já não é amor.

E o poema já não é poema.

Negando aquilo que não cessa. 





sábado, 8 de outubro de 2022



                     o exercício dos sentimentos tortos





O disfarce da aceitação tácita nos exime

da compreensão compulsória. 

As coisas que importam, não se retém.

Esquecemos de tudo rapidamente, nos machucando 

mutuamente.

Desconstruindo o que aprendemos.

Para que os sonhos sejam ao mesmo tempo, desejo 

e repulsa.

O abandono das causas justas precede o exercício

dos sentimentos tortos.

Um minuto basta para fecundar um filho bastardo.

O amor é um conceito que se desaprende com o tempo.

Como a sola gasta de um sapato.









                              beleza





Toda beleza é enganosa.

Como qualquer coisa transitória.

Como qualquer coisa preciosa.

Preciosa porque bela, e ainda mais bela

porque misteriosa. 





                             a liturgia do horror





Quando se vive no inferno, e ao inferno se submete,

ao conflito e a discórdia se habitua, eis que a vida 

não é mais tua.


A anjos grotescos convertido, és quem 

não deveria ter sido.

Quem não queria ser.


O filho bastardo, um pária, um Lázaro 

eventualmente resgatado do sepulcro.

A viver dentro de um cadáver.

Que exclui a presença de Deus,

mas não a liturgia do horror.




 



                         aqueles que se foram


* EM MEMÓRIA DE VINCENZO DI GREGÓRIO NETO





Penso naqueles que se foram.

Que foram amados, que amaram,

foram "alguém".

Viveram entre nós, deram o seu melhor,

e o seu pior também, falíveis como todo ser humano. 

Fugazes como todas as coisas perecíveis.

E como tal, aos poucos esquecidos,

relegados a alguma lápide fria.

Ou nem isso.



 

sexta-feira, 7 de outubro de 2022



                 a falta que não faz falta



Eu sei,

você não sente a minha falta como sinto a sua.

Não fosse assim, não daria "cano" 

por qualquer  motivo. 

Não chegaria sempre atrasada.



Eu sei,

você não sente a minha falta como sinto a sua.

Pensando bem, melhor assim.

Amar é bom mas encurrala.




 

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