sábado, 25 de março de 2023


                          

                      sem pé nem cabeça



Como a maré, a vida flui e reflui.

Curta e circular.

Esquiva e líquida.

Haste e movimento.

"Situación de cosa em libro abierto" (Moacir Amâncio).

Invento que inventa-se e se reinventa 

a qualquer instante.

Ou jaz em solene afasia.


O duplo sentido é a via de anúncios luminosos.

De voos rasantes e altos percalços.

Na vida sem pé nem cabeça, a marca dos dias

inventa pretextos.

Recria pactos, condições, algemas.

Velhos enigmas elucidam a matéria informe.

Às vezes, a urgência de amar é a mesma de esquecer.

Rescaldo de silêncios indecentes









 



Meu lugar não tem lugar

onde gostaria de estar.

Meu lugar, no teu coração,

já está ocupado.


 




                   se liga, moça                  



Não sabe o que quer

Faz tudo errado

E depois culpa os outros.


Não sabe o que quer

E se sabe

Não faz por merecer.

E depois culpa os outros.


Não sabe o que quer

Não sabe amar

Se liga apenas nas coisas materiais

E depois culpa os outros

Por nada obter.


Não sabe o que quer

E tudo quer

Mas sem retribuir

Fica a ver navios.

Por culpa dos outros, é claro.


Moça, se manca, vê se toma jeito.

O tempo passa, as oportunidades desperdiçadas

não voltam.

Desse jeito acaba na roça

ou volta para o puteiro.













 




                       marginal



Como pode alguém ser tão bela,

irresistivelmente encantadora, quando quer,

e ao mesmo tempo tão vulgar,

uma autêntica marginal,

se apropriando de meu coração,

para depois maltratá-lo.

 


                                    a sete chaves



Estrelas estalam

no firmamento abandonado

dos sonhos impossíveis.

Aedos contorcem as formas 

que ao sono letárgico conduzem.

Rios seguem seu curso infindável.

Os dias se desmancham em sumidouros

inescrutáveis.

Amor e horror se locupletam alheios

à transitoriedade de tudo.

Vastos elementos misturam-se ao excremento

cum grano salis.

Poetas marginais catam feijão

em searas esbatidas por todos os ventos.

Estações sem flores

Colmeias sem mel

deflagram 

sucessivos rascunhos

da vida guardada a sete chaves.










 




Amor é uma palavra desgastada.

Quiçá, supervalorizada.

Prefiro o silêncio dos beijos.

O arfar dos desejos.

Quem não prometem nem enganam.



 

sexta-feira, 24 de março de 2023

 


Que cessem os desenganos.

E volto a fazer planos.


         Em noites de Perseidas

         a exuberância se supera.


Ajudou quem não merece ?

Perdeu, mané !


              O sorriso que me cativou,

          quanta falsidade escamoteou...


O tempo passou, a idade chegou,

boca sem dentes me abocanhou.


               O começo é o fim de trás para frente.


O corpo-memória faz 

sua própria história.













          





 







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