quarta-feira, 25 de dezembro de 2024


                                      seres e coisas




Os seres e as coisas se pertencem, imantadas 

de um saber que transcende o entendimento.

Fatos e fatores se aplainam,

acorrentados à arquiteturas corrompidas,

repletas de mãos inúteis.

Do canto mais remoto 

emerge anjos de armaduras espúrias, 

exalando antros de perdição.

Farsas inventivas entendem-se sem se ouvir,

a despeito das hastes fracas e voos às avessas.


Faço versos porque as palavras se prestam 

a qualquer propósito.

Não sou triste nem alegre, sonho a vida

beirando os extremos.

Distante de qualquer casa, qualquer terra,

enquanto o mundo se desintegra.


O cio pavorosa de seres e coisas

encarna a ausência de crime.

Na normalidade doentia do ciclo evolutivo,

nada é tão efêmero que não possa perdurar.

Nada além dos vícios.

Das sevícias.

Dos artifícios.

Um instante basta para entender a vida.

Tudo o que o entendimento consente é válido.

Mas a tessitura do amor é delicada.

O vaivém dos desejos devora os desfechos, para ampliar

as fronteiras das abstrações.

Seres e coisas caminham lado a lado

por alamedas opacas, à mercê do olho ciclópico

do imponderável.   





  

   

domingo, 22 de dezembro de 2024



                      sublime danação



Perdido de mim, aspiro o que remonta 

a meus destroços.

Das vagas inconstantes da memória, componho 

labaredas de céu e extinta soledade.

Meu presente é um presente que se desfaz 

em indecisa dismorfia.

Uma altivez sem destino nem história

é minha glória tardia.

Me divido entre a lucidez e a cegueira

de querer o que não posso (ser) ter.


Meu tempo lentamente se esgota.

O coração bebe o fel de seu amoroso aconchego.

Nem pareço mais eu.

Quem fui, ausentou-se sem eu sentir.

Quem sou, um arremedo de quem quis ser.

Não obstante, louvo a sublime danação desse tempo 

passado a limpo, liberto  

de uma pena maior.

Me conforta o lúdico renascer 

em que findo, 

a laborar a fuga das estreitezas do mundo.  






                           o momento etéreo



O momento etéreo é feito de sempres.

Rubicundos filamentos apoderam-se das memórias

sonolentas do efêmero.

As coisas passam ocultando a aprendizagem do espanto.

Janelas nostálgicas assistem ao esvair das exaustas

formas da paciência.

Églogas de céus em chamas e coros de discórdias fundem-se,

para que o contentamento da tristeza não seja em vão.

A dança antediluviana das borboletas paira 

muito além dos pensamentos talhados no mais puro 

alumbramento. 

O momento etéreo é uma árvore plantada 

no dorso das campinas, onde jorram flores

e morrem mitos.

Os tempos são sempre recalcitrantes, continuam

através dos olhos e das paisagens.

A vida agoniza com a tepidez de velhas rachaduras

No ventre das máquinas homicidas,

as novas criaturas comungam o mesmo húmus 

do sadismo.

O momento etéreo passa, mas o horror permanece.






 

quarta-feira, 11 de dezembro de 2024


                          o nascimento do nada


Tudo se refaz,

para o bem e para o mal.

O tempo durável permanece,

enquanto passamos. 

Quando o que sucede faz do fim um recomeço,

as palavras devoram tudo o que sabemos.


O nascimento do nada

é esquecer o que foi visto.

É não supor-se informe e pequenino.

É não findar-se seguindo a trilha

de seu próprio desencanto.



domingo, 8 de dezembro de 2024



                 as velhas coisas novas


Sob a fuligem das coisas afetuosas,

a desordem sem esperança

despreza os prazos.

Alude ao pensar ambíguo 

o sub-reptício jogo diluído dos genes.

Assim se resolvem os infinitos esquemas

das velhas coisas novas.

Esquecidas e renascidas.

Desvendando injustiças e fomes.

Purgando o sêmen dos equívocos,

enquanto a própria vida deixa-se consumir,

à procura do fim.


 

domingo, 24 de novembro de 2024


                         potestades



Funde-se à vida

esse sofrimento à beira fidedigna da louca razão.

Com aquilo que não pode mudar.

Rebaixe-se, rasgue-se, mas não ignore 

a audaz serventia do fracasso.

O palco está escuro, mas o picadeiro ferve.

Pão e circo se locupletam. 

Mas é on line que as coisas acontecem.

Tatuagens e tetas caídas envergonham o corpo 

de forma diferente.

O mugido das multidões supre os dilemas, para que

o sol patriótico brilhe acima das criptas basálticas.

Ninguém morre na véspera, há que ter esperança.

Tudo é vasto, menos a afeição sem nódoa.

Porcos só amam os chiqueiros.

Os sermões dominicais enchem linguiça, mostre-me

a quem segues e te direi quem és.

Afinal, é preciso ser cego para ser feliz.

Bocas lascivas enxertam potestades de antanho.

A miséria confortável alude a Hosanas empedernidos.

Tempos difíceis parem ruínas vindouras.

Incógnito, atravesso o meu hemisfério condenado

a existir.




Na padaria, 

o pão nosso de cada dia alimenta a freguesia, 

também serve pinga, frango assado aos sábados, 

além de ponto de encontro de desocupados e aposentados, 

que discutem futebol e política, eventualmente 

assuntos mais sérios, o obituário sempre em dia. 

Na padaria, o pão nosso de cada dia 

alimenta a vida vazia.





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