terça-feira, 22 de outubro de 2019



                  quem reinventará o amor ?






um tempo em que o tempo 
parece não passar.
E há um tempo em que o tempo 
parece voar.

Um tempo em que
tudo parece possível.
E outro, 
na bacia das almas,
em que nada mais é crível.

Habitam dentro de nós 
sonhos sempre adiados.
Pouca coisa resiste
ao ingresso à vida
que não foi vivida,
a renúncia de toda procura.
Pois eterno é o sentimento que nos 
une e separa.
A tudo que não passa, 
posto que não houve.

Quando me perdi já estava perdido,
o que era para eu ter sido.
Antes mesmo de haver nascido,
envelheceu antes de romper o novo.
Em tudo que se perde sem ter ganho.
No amadurecer longínquo,
voltando pelos caminhos em busca de mim,
procuro quem não vejo, 
o que não existe mais.
Em sonatina exaltação, 
o despertar num mundo programado
em softwares, backups.

Quem comporá uma nova nona sinfonia,
antológicos boleros,
Yesterday, Hey Jude ?
Quem reinventará o amor ?












domingo, 20 de outubro de 2019



                                                   SABEDORIA


         



Na guerra,
na prisão,
nos redutos do tráfico,
nos conflitos,
nas esferas do poder,
nas altas cortes,
nos subterrâneos da Internet,
é onde
melhor se conhece o homem.
É onde 
o homem se conhece.
Em toda sua potencialidade.
Em toda sua bestialidade.
Fazendo coisas que até Deus duvida.
Algoz e vítima na autofagia do tempo.
Agonizando na hemorragia paciente da vida.

Sem saber o que sentir,
sem ao menos compreender
tantos sortilégios, 
numa vida feita de inutilidades,
sábios e tolos, 
engrossam o cortejo dos desgraçados.

Ante a lógica insana das coisas,
a sabedoria cega da inconsciência
é para onde tudo converge.






 


                 
                    moeda de troca






Chega um tempo em que tudo se esgota,
tudo cansa.
As palavras se perdem, nada mais importa.
O que foi feito, o que foi dito,
não faz diferença.
A alma cativa e estéril não transige,
desafiando a razão.

Ah, quem dera esquecer a injustiça 
que consome.
As coisas perdidas, muito mais que findas,
corrompidas.
Para que o coração humanizado 
possa reviver,
e todo esse querer,
em moeda de troca transmutado,
um novo disfarce o amor escolher.



segunda-feira, 14 de outubro de 2019





                          atestado de burrice






Sondamos, especulamos, 
para dar um sentido ao que não entendemos.
Ou seja, a quase tudo.
As coisas consumidas que ficam revoando, revoando,
no revolto universo dos pensamentos.
As convulsões de um amor não mais amado.

Bate às portas da loucura as trapaças do tempo.
A liturgia das infidelidades, o sono letárgico 
das incertezas.
A razão absurda de viver veste a nova realidade.

Não há plano B para o amor que vive
no engano.
É falsa a ideia de afetos imorredouros.
Querer o bem de quem se ama nem sempre vinga.
O amor é egoísta e sacana.
Tudo quer, tudo exige, e quando não consegue,
afasta-se. 
Desfigura-se até que se extingue.
Não há transparência nos quartos, na camas,
nas relações
impregnadas de atavismos seminais e psíquicos.

O desejo destrói a alma.
Todos querem a felicidade, mas é a infelicidade
que nos ensina.
Na realidade que transcende a tirania
do amor e a liberação dos costumes,
o fracasso é inevitável.

E o que resta, 
são apenas os velhos papéis sociais 
que pairam
como um atestado de burrice.












domingo, 13 de outubro de 2019





                              AS MOIRAS





Não se iluda,
a vida requer um pacote de mentiras básicas
para seguir em frente.
No lar, no trabalho, no convívio social,
tudo é farsa.
Mesmo na aparente vida superbem resolvida
das pessoas supostamente bem-sucedidas,
o véu que esconde a nudez moral é tênue.
Rasga e se rompe ao menor descuido.
A suposição de que a família é garantidora do amor
nada mais é do que a necessidade de fazer parte
de algo.
Pagamos o preço que for para manter as 
aparências.
A hipocrisia é o cimento da vida coletiva.
O que faz alguém ser respeitado, 
a não ser excepcionalmente, quase milagrosamente,
não é a integridade, a ética.
O que prevalece é a habilidade de acomodar afetos,
manipular sentimentos.
O horror da vida só é suportável ao buscarmos
utopias de felicidade.
A felicidade, mesmo efêmera, só é factível mediante 
uma certa cota de infâmia. 
Mas para persuadir as moiras, as virtudes ainda 
falam mais alto.
Sobretudo, coragem e humildade. 
Humildade para reconhecer que nada sabemos.
Coragem para manter-se em pé mesmo sabendo-se
fadado ao fracasso. 
A busca pela felicidade apenas amplia
as portas do inferno.




* (Inspirado em Luiz Felipe Pondé/ Filosofia para Corajosos)









  





  

sábado, 12 de outubro de 2019




                
                      SENTIMENTOS





O que eu sinto é irrelevante, poderia me salvar mas não salva.
O que eu penso é irrelevante, não vale um dia de sol.
O que eu escrevo é irrelevante, nunca fui grande coisa 
em tudo que fiz.
O que eu faço é irrelevante, em meu padrão infantil de comportamento.
O que eu quero é irrelevante, mas eu gosto dos meus pequenos confortos.
O que eu sonho é irrelevante, arde como santos queimados em fogueiras.
O que eu tenho é irrelevante, conquanto não consigo me livrar 
dessa agonia.
O que eu sou é irrelevante, meu mundo está acabando.
O que eu sinto, penso, escrevo,
faço, quero,
sonho,
tenho,
ninguém se importa.
A mentira, o vácuo, o silêncio, é onde me encontro. 
Ninguém se interessa em jazigo de ossos empilhados.
Ninguém é o que eu sou, marcado pelo verme.
Alguém que foi, sob a condição de ser.
Irrelevante a dor, o labor, 
qualquer coisa que eu tenha sido.
A comunhão do EU com o não-eu.
Sem mais lastimar, acordar de noite para chorar.
Em meio ao horror inquestionável.
Me achar devedor disto e daquilo.
Não mesmo !
Fiz o que podia, dei o meu melhor.
Não me ressinto de nada.
São os erros que nos permitem chegar à verdade.
Me sinto mais próximo de um pardal do que de Deus.


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