domingo, 30 de julho de 2023



           nem tudo deu errado





Sonho acordado em lençóis de linho.

Correndo por campos eternos, 

nadando em riachos amáveis,

nada pode ser mais lindo.

Sempre atrás de uma bola, 

nos dias incríveis do Agudo.

Em que nada mais existia, 

além  da mais pura alegria.


Diferentemente do tempo adunco

de agora,

com sua tristeza crepuscular.

Fragmentos da vida que tive.

Amálgamas de mula sem cabeça com putas

de purezas decaídas.

Há feridas que nunca curam.

Queria ser jogador, me descobri fingidor

de sentimentos inocentes e intratáveis.

Pouco a lamentar.

Vem de longe meu inconformismo cruel.

A melhor parte de mim ficou pelo caminho.

Junto com os conflitos de culpas e apreensões.


Sonho acordado

que nem tudo deu errado.


 






sábado, 29 de julho de 2023



                  só os loucos são felizes



                            tela de Rene Magritte


O tédio chega como pássaros mudos 

e perfumes esmaecidos.

Me vejo como um andarilho perdido na grande estrada

que alude ao fim de tudo.

Como um santo que já não reza.

Um sábio que se perdeu entre trevos e campânulas 

cambiantes.

Uma criança precocemente envelhecida.

Pois assim se faz a vida.

Tudo o que se sabe é o que ignoramos.

Entre a folia e o horror, vivemos para enterrar 

nossos mortos.

O compasso das perdas rege todas as canções do mundo.

Entre idas e vindas, forjamos nossos medos e solidões.

Magníficos atores da tragicomédia humana, só os loucos

são felizes.






 





  

quinta-feira, 27 de julho de 2023



                    a tirania do tempo



O tempo se esgota e a gente nem nota.

As coisas se ampliam para menos.

Os vazios enchem os ermos de silêncio.

Os dias engalanam epifanias.

As magias se reduzem ao rescaldo das litanias.

O ocaso desdenha das quimeras amanhecidas 

de entremências.

Cada gota esgota outra gota da clepsidra 

tediosamente humana.

Para que a tirania do tempo possa urdir sua trama. 



 





              que a terra há de comer



O indevassável conflito requer requisitos insubornáveis.

Esqueletos de confeitos e normas imprescritíveis regem 

a negra transparência.

Sintaxes perfeitas de armários mofados marcham pelo

labirinto triunfante.

Impregnados de memórias incestuosas.

O inverso do nada coteja o ponderável.

O duro embate dispensa bravura.

Quando a morte já não é nem morte.

A treva engole a trama que a terra há de comer.

A dor universal de cada homem entoa metamorfoses

contagiantes.

Cada canto, cada praça subleva-se contra os pendões

da esperança.

A fome de justiça deslinda a farsa do futuro.



 

quarta-feira, 26 de julho de 2023



Se estou sozinho

anseio por tua presença.

Se estamos juntos

logo me enfastio.

Instáveis, 

somos por demais

compatíveis. 



terça-feira, 25 de julho de 2023



                      o caminho que não escolhi





Ando incógnito por um caminho que não escolhi.

Misturado ao torvelinho alucinado de vassalos de telas, teclas, 

aparatos digitais que invadem, assediam, corrompem

o perene rocio das virtudes.

No grande mar de rostos regurgitados por uma engrenagem

frenética e desregulada, herdeiros mal nascidos 

barbarizam 

em nome de deuses plastificados e desdenhosos.

Estranhos se tornam íntimos, espectadores tomam partido

em cada evento que se autodestrói, sucessivamente.

No ágora em que tudo e nada acontece, a milagrosa

iniciação claudica e prescreve, 

indiferente ao burburinho ordinário.

Como um fugitivo atento, me embrenho na autofagia 

do tempo para não ser devorado.

Antes de devorar-me o caminho que não escolhi.

A vida que não quis.

 








  

segunda-feira, 24 de julho de 2023


               entre engodos e mentiras





O cenário esculpido de mazelas zela por seus loucos.

Invectivando garras como a pítia sobre 

a trípode falsamente engenhosa.

Ora penetrando na absconsa gruta, ora redopiando 

em torno do nada.

A hora do desespero não perde a hora.

Exaustos, deixamos por isso mesmo. Os apelos do influxo

incorporam os pináculos frígidos dos estertores.

Ao tempo em que o anelo digital penetra pelas órbitas

insaciáveis, engolindo bosta e expelindo sensações

de brisa.

Somos mais virtuais que reais, sob a hedionda máscara

do deleite sem culpa.

A pequena vida lateja como estátua num jardim abandonado.

Um deus vítreo e metálico despreza os fantoches dançantes

ungidos por adoradores do reles.

O que se pode fazer quando alguns tem só direitos,

enquanto outros só obrigações ? 

Tudo e nada.

Nada e tudo.

Nada acontece sem um motivo. Nem sempre razoáveis.

Cristo subiu ao calvário para salvar 

o que não pode ser salvo.

É lícito supor que não o faria de novo.

Mais sensato é orientar-se com os cegos 

e festejar com os loucos.

Entre o engodo e a mentira, erguem-se as tochas

e os cantos de vitória.

Traidores da pátria refestelam-se como criminosos

homiziados.

Marcham intactos desde os primórdios.

Nada pode derrota-los.

Que importa se tudo se faz de novo ?

A palavra conforta e distrai.

Somos todos e um só. Estar na plateia ou no palco

já nos condena a consumição perpétua.

O teu fracasso é o meu fracasso, desconhecido irmão.













 



 








 

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