sábado, 11 de maio de 2024




              lembrando o que merece ser lembrado





Antes que eu esqueça de lembrar

o que tento esquecer,

recordo o que passou como pequenas

lápides às margens do destino.

Lembranças que estilhaçam o presente engendram

um existir e inexistir complexo.

Não que nada tenha valido a pena.

Não que tudo tenha escorrido pela sarjeta 

ou se perdido em roteiros imundos.

Debruço-me sobre meu passado como quem

se acostumou ao acostumável.

Elaborando circunstâncias próprias.

Escondendo-me atrás de pequenas fortalezas. 

Pregustando o amanhã possível consolando e sendo

consolado.

Lembrando o que merece ser lembrado.

O melhor e o pior encadeados.

Exaltação e rancor de vaginas cansadas.







quinta-feira, 9 de maio de 2024



                          causa e efeito



Água e fogo consomem a terra de encantos e temores.

À condição humana impõe-se as misérias de cada dia.

Leis que regem o universo ignoram o princípio e o fim do Verbo.

Só perduram no tempo as larvas que corroem os defuntos.


Não há nada de novo sob o antigo sol.

As infinitas variações de causa e efeito saturam-se

de séculos e estrelas.

Somos aqueles que emergiram do barro para profanar a Criação.

Confrontando a avara sorte a fim de evadir-se dos dias 

consagrados ao inútil.


segunda-feira, 6 de maio de 2024



                               de segunda a segunda




 


A vida se mascara e se revela

perto e longe de tudo. 

Andamos à esmo buscando saídas

dos embates que travamos dentro do peito.

Fiéis a crenças que emburrecem.

Aventurando-se em enlameadas lutas.

De segunda a segunda.


Elegias de cansaços enlaçam as cidades 

frias e cálidas,

acorrentadas as humanas labutas.

Criaturas inermes pululam, anestesiadas.

Esforços falsificados crescem soltos no asfalto.

De segunda a segunda.


Gente diferente de além-mar entoa

hinos de amor e guerra.

O drama da convivência dispensa tréguas.

O fulcro do tempo circular andeja 

em lúgubres responsos.

De segunda a segunda. 


Aqui e agora a história se repete.

Falta comida na mesa.

Falta esperança e alegria.

Falta tudo o que não pode faltar.

O mundo não se desvenda como

um palco quimérico.

Tampouco a vida se faz de rogada.

De segunda à segunda o bicho pega.








domingo, 5 de maio de 2024



                                    regresso





Saem os barcos para o mar, sabendo 

que podem não voltar.

Assim o tempo de Deus se põe-se de pé, 

veraz e inapelável.

Nele adentra o denso sol da tragédia, as vertigens luminosas

das devoções, o despertar entre os mortos. 

Que anoitecidas formas de ser conjuram o turvo

das águas dormidas ?

Alheio ao perigo, abrasam-se os anseios em meio

aos escombros cotidianos. 

Nada importa afora o clamor das privações.

Já não poder vencê-las sem provar o torpor exausto

dos desejos, eis o enfurecido repto.

Que olhos do mar espreitam os dibujos del puerto ?

Não mais que sempre se mostra o mundo partido, 

as âncoras da vida arrastando as sagas contratuais,

os monopólios da infância, 

as baldrocas oratórias. 

Saem os barcos para o mar sabendo

que podem não voltar.

Mas quase sempre voltam. 

Isente-se o coração quando o nítido rosto 

sem feições do amor 

regressa.

 



sábado, 4 de maio de 2024


                        a paciência da espera




Aprendemos assim, na marra.

Quem hoje ri, amanhã chora.

Não se trata de destino, sina.

É apenas a vida que peregrina.


Como dizem os falsos oráculos

e adjuntos, 

pombo e falcão não voam juntos.


Veio o verão sem sol.

Veio o plantio sem colheita.

Veio a negra indiferença.

Veio o amor sem esperança.

De que vale a vida sem o sorriso

de uma criança ?


O duro silêncio tudo acalma.

A palavra revisada emudece a mente.

O sujo e o feio de olhos esbugalhados.

A paciência da espera ignora

o terror da solidão.

O homem que tudo come

enche a barriga

mas não mata a fome. 


Tudo é falso até que se prove 

o contrário.

De nada em nada, il vento 

come fa se tace.

Vão-se as folhas, e recria-se o novo.

Vagos, risonhos, fátuos sonhos.







 



sexta-feira, 3 de maio de 2024


                             a fuga dos caminhos





O verdadeiro recria-se como um ovo.

Súbito, o sonho de Cervantes faz-se alto e real.

A fim de compor poemas cáusticos.

O remoto segue adiante surdo ao novo, articulando

esboços de mil mesclas.

Você protesta mas ninguém escuta.

Quer revidar mas não consegue.

Você está vivendo a vida de outros mas não

consegue mudar. Que merda, hein ?


Perdido na fuga dos caminhos, tudo se torna ausente 

sem quebrar.

Teu lamento abriga tardes antigas, farsas, falácias.

A ferida que não fecha, ignorada e pisada,

cala e consola.

Onde as nuvens rangem e os telhados choram

lutar é proibido.

Não há saudade nem temor no encanto de falsas sereias.

Sobre prebendas de incompreensões paira a poeira

dos desencontros. 

O que dizem de ti não importa.

Pior seria se não dissessem nada.








 

quarta-feira, 1 de maio de 2024


                                        exaltação do dia



Na exaltação do dia

Inverdades sinceras

Queimam as heresias

Acordam sonhos

Colhidos às pressas.


No dia perfeito

O adeus se despede

A doçura brota

De escolhas equivocadas

Coração vazio

De mansa vastidão.


Desejo frio

Desejo no frio

A cama vazia 

A noite em branco

Sonho ao contrário

Acordado.


Plenitude do tempo

Crinas de vento

Lentos entraves

Resgates despertam

A mente assassina

Descortina a memória.


Não procure a verdade

A verdade te achará.



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