terça-feira, 20 de fevereiro de 2024


                      a vida não é para amadores





Não, a vida não é para amadores.

Mas não sejamos tão exigentes.

Conosco e convosco, sigamos além do engano.

Apesar dos pesares, o agora se ajusta a indubitável espera.

Ao bulício das colheitas de ternura. 

A azáfama das plantações que pendem maduras.

A paz chucra clama pela ausência dos males.


Não obstante a alma cheia de delírios, não é a paixão

que me desencaminha.

Ah, meu amor, talvez nem sintas o que eu sinto.

A vida por demais assombrada inventa mundos novos.

Flores apaixonadas escutam as estrelas. 

Tu me adivinhas sobre teu corpo manso, cheio de passados

e futuros.

Grandioso e carrancudo, o amor colhe animosidades

desconfiadas.

A luz dos roteiros distorcidos de antigamente, um tremor 

me alucina os pensamentos.

Não, a vida não é para amadores. 

Não há sabedoria que chegue. 

Ao sarcástico predomínio da matéria de bom grado

sacrificamos a alma indolente.







 





domingo, 18 de fevereiro de 2024



                      pelo que seremos lembrados





Nossas atos respondem por nós.

Sob critérios que nem Deus entende.

Boas intenções não contam.

Reputação que se respeite consiste em conciliar 

conceitos e preconceitos.

A cama de Precusto é à gosto do freguês.

Judas é mais lembrado pela traição do que por ter sido 

o apóstolo favorito de Jesus.

Os três "nãos" de Pedro pesam mais do que seu

grandioso apostolado.

Uma ação impensada, uma decisão impulsiva, 

um filho indesejado, e o estrago está feito.

Erros, eventuais infâmias, pecados sem perdão, nunca falta

quem atire a primeira.

Mais sorte tem um cão, que não tem inimigos.

Sistematiza-se os contatos, os contrastes, difunde-se 

as versões, as exaltações graveolentes  

oriundas de cada liberdade malsinada, impregnadas

do suar negro da morte.


Tudo somado, somos e seremos binômios infames,

teleguiados putativos, arremedos de finestras malditas, 

belezas fraccionadas,

o bem e o mal embolados, trocando de lado, vida e morte

no mesmo corpo, ação e vocação sob o chumbo 

trocado das tentações. 

À mercê de tentáculos desembaraçados de si mesmo.


O homem liberto tudo pode. O duro aprendizado se resume

em não saber.

A honestidade é uma faca de dois gumes, dividimos 

para somar.

O preço da existência é impagável. 

Antros de perdição nos espreitam.

Descortina-se o inimaginável em detrimento do impensável.

Somos aqueles que a morte emula e emoldura.

Na fim das contas, pouco ou quase nada dura

na vida oca e de barro.







                             aprendizado



Não o que está escrito nos livros.

Não o que ensinam na escola.

Não o que mentores de araque proclamam.

Parta do pressuposto de que tudo é falso, enganoso.

Talvez aí aprenda alguma coisa.





 






                os jogos do mundo





Virão os desgostos, os poços sem fundo.

Virão as chagas dos martírios e injustiças.

Virão as mirras das tragédias, o choro dos perdedores.

Virão dias bons e dias ruins.

Que passarão da mesma forma.

A vida renasce a cada manhã caiada de novo.

Respire fundo, não deixe ninguém nem nada te afetar.

O tempo audível te fará justiça.

Talvez os jogos do mundo te confundam

mas continue jogando, nunca deixe de tentar.

A faina das conquistas implica em tropeços, erros,

decepções.

Em suma, tudo serve de aprendizagem.

A virtude é fugaz, porquanto em pacto inconsentido

com  o acaso.

Mas nem por isso se desvie do caminho do bem.

Lembre-se, as pegadas se desmancham, 

mas a caminhada continua.


 





quinta-feira, 15 de fevereiro de 2024



                    para unir ou separar



 

Minhas tristezas aprendi a varrer para debaixo do tapete.

Me faço de forte quando minha vontade é desertar,

tomar um chá de sumiço. Sigo em frente por instinto. 

Sinto o que sinto porque minto para mim mesmo, 

quando minha vontade é de chorar,

mandar tudo para o raio que o parta.

Mas não sou burro, dou-me por feliz por chegar onde cheguei

com as próprias pernas, sem passar ninguém para trás.

Meu grande pecado foi trair quem mais me amou.

Sigo em frente porque não posso senão seguir em frente.

Ciente de que estou no lucro.

Que já vivi o suficiente.

Que tive e tenho muito mais do que mereço.

Certamente alguém lá em cima gosta de mim.

Alguém que é meu escudo, meu tudo, não há outra

explicação para ter sobrevivido, superado tudo

que superei.

Não me vejo com a idade que tenho, continuo cometendo

os mesmos desatinos, imaturo, inconsequente a ponto

de me apaixonar de novo e querer um novo lar, família,

essas coisas cuja data de validade é mais curta

que supomos.

Mas, ora, a vida é curta, como se diz, e a idade, 

o tempo, são apenas detalhes. Há que aproveitar, 

sem medo de ser feliz, acreditar que a realidade 

pode ser melhor que o sonho.


E verdade seja dita, tu nunca quiseste ser parte 

desse sonho. Te conheci quando ainda estava morno

o cadáver do amor da minha vida,  e me contentava 

com qualquer coisa que me davas,

basicamente sexo remunerado, tardes idílicas

que me levavam a tolerar tuas trapaças.

Mas eis que a vida, para variar, não tardou a dar o troco,

e para teu azar, o feitiço - no caso - virou

contra a feiticeira, e essa barriga que cresce a olhos vistos

te obriga a assumir o que sempre rejeitaste.

Loucura ou não, um vínculo eterno, um filho 

para dar testemunho do que fizemos e fizermos 

de certo e errado.

Um filho para fazer sorrir e chorar.

Para nos unir ou separar.











 







 





 
















quarta-feira, 14 de fevereiro de 2024



                         roubando a loucura dos loucos





O tumulto das nuvens sobranceia almas triunfantes.

A elegância dos preconceitos emaranha-se 

em labores desafinados. 

A morte branca engendra ignorâncias iluminadas.

Nós somos a esmeralda das águas, a matiz dos colibris 

em chamas.

Ventres estéreis acalantam o mundo com seus

segredos estelares.

Cantarás e eu saberei que as feridas alumiam apoteoses.

Descansarás, pois, humildes e imaginosos

ante a clâmide austera da ciência.

Preceptores malsinados entretecem desditas silentes.

Roubando a loucura dos loucos.

Somos eras proferindo cascatas marulhentas em prol de ovações

proféticas.

Fídias esculpe o belo absoluto que a plebe ignara ignora.

Para que a erudição ? Para que o conhecimento ?

Universaliza-se a cultura do lixo para gáudio da humanidade.

LAOS DEO ! promulga a multidão apoplética.

Babel haveria de se rir de nosso destino.

Rastros de antigos acordes acabam em danças feéricas.

Nada se ajusta sem que se macule e se conspurque.

Não tenho nada contra, muito menos a favor.

Humanamente impossível não mentir.

Hoje, amanhã e sempre !

Marchamos certo, por causas tortas.

Trágicas criaturas, para onde vão ?

Votivas sensitivas ampliam os cemitérios.

Meu nome é amor mas pode me chamar de iva,

pássaro, anjo. 

Crucificado já estou.












terça-feira, 13 de fevereiro de 2024



                  a última morada





Lá onde veredas preguiçosas descansam

e rios sem perspectivas desaguam

nuvens dançam

manhãs silenciosas pastam

cismo o sereno silêncio

que desejaria ter 

como última morada.


Lá onde não há roubos, crimes, carnavais

moças de vestidos coloridos passam

crianças jogam bola na praça

e janelas abertas

espiam o tempo que não passa

sonho ter

como última morada.


Lá onde as inquietudes repousam como flores no caixão 

e o que passou já não importa

e o esquecimento suavemente vem

e o pobre amor caminha sobre as águas

quisera ter

como última morada.


Lá onde minha mãe cozinhava, fiava, tecia, 

e minha avó capinava, sem nunca perder a

alegria,

e o meu pai possuía essa grande força que o fez eterno,

e um eco bondoso paira sobre todos aqueles

que habitaram minha gloriosa infância

em lembranças que nunca me abandonaram,

vislumbro o menino que ainda há em mim 

a me levar pela mão

a última morada.









  


 

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