domingo, 31 de julho de 2022




                 mais do mesmo





Falta instrução.

Falta educação.

Falta vergonha na cara.

Falta asseio, indignação, vontade.

Em suma, falta-nos tudo. 

O que esperar do futuro, senão mais do mesmo ?

Governantes inescrupulosos, vilipêndio, assalto 

aos cofres públicos.

"Cada povo tem o governo que merece". 

Josepf-Marie Maistre(1753/1821) 



 

sábado, 30 de julho de 2022



Com o consentimento dos deuses (orixás ?),

outros tempos virão. Diferentes destes.

E lamentar-se-á que tenham passado.

Porque o futuro é ainda mais tenebroso.






                     a gema primeva





Em meus passos, nem tão tardios, nem tão lentos,

retrocedo ao que permanece em mim

além do tempo.

Ao que estou sempre a recorrer. 

Para me sentir mais digno, conformado 

com o que ficou irremediavelmente inconcluso. 

Mas que não deixou de ser belo.

Mesmo os erros, as mentiras, e todos aqueles

que compartilharam suas cruzes comigo.

Rostos que pairam acima dos estragos do tempo,

legado inexpugnável num mundo cada vez

mais inabitável, com seus roteiros de pedra e ratos

de laboratório.

No pedestal do tempo, talvez ascenda ao céu 

o brilho da gema primeva.  

 


  




 

sexta-feira, 29 de julho de 2022


                    à imagem e semelhança



                 



Vivo de lembrar.

Lembranças perpassadas de luz, desabitadas

paisagens que reverberam em redundante desolação.

Como uma floresta em chamas.

Recolho-me no estio da antiga claridade, preso ao limbo

que convida ao olvido, 

mas que sempre renasce e se propaga.

Quando tudo conspira para matar as antigas alianças,

ainda ansioso pela vida, 

sinto-me parte de alguma existência.

À imagem e semelhança dos desterrados, dos mortos

sem lágrimas, meus irmãos, 

o pó do mundo.  




quarta-feira, 27 de julho de 2022

                          MINHA PÁTRIA



                 



O que eu levo da vida é a magia

dos momentos que pareciam eternos.

A lenta juventude, a falsa impressão de que tudo

se ajustaria.

De que o amor jamais me trairia.


Me sinto como um viajante que se perdeu

ao longo do tempo.

Os sonhos de barro, quebrados.

À espera do que não veio.

Despreparado para as falsetas da vida.


Sou o que restou de mim.

Uma fração do que eu era para ter sido.

Mas de raízes profundas.

Adubadas por um coração generoso

que me permitiu seguir em frente.

Subsistindo na pátria em que nunca 

deixei de ser menino.





 



              amor-pústula



Flores putrefactas adornam o lodo dos afetos. 

Morada de baratas glabras,

ratos sub-reptícios,

serpentes ávidas.

Na vida infectada, sob a lei dos homens, 

agoniza o coração ferido e desenganado,

abandonado pela sorte,

pelo amor conspurcado.

Amor-pústula, aniquilado pelo desejo sórdido.

Por prazer ou vingança ?


Nunca se sabe o que há do lado de lá 

dos muros fatigados.

Dos afetos lacerados, crenças inocentes

de um tempo sem rostos e paisagens,

na dubeidade do amor imprudente,

gasto à revelia da razão.


Sigo meu caminho sozinho, sangrando,

a espera que o tempo 

converta tudo em silêncio. 


 





 

segunda-feira, 25 de julho de 2022



                    alegorias





Com o fim tão próximo, quase palpável, 

reluto em aceitar a condição de nada mais aspirar. 

A não ser não me degradar, a espera

do que não virá. 

Sinto o bafo da morte na nuca, fujo como uma fera de seu fojo,

mas não há o que fazer. Nem do que reclamar.

Pelos meus passos sempre errados não há culpados

senão eu.

Vivi me indispondo com o mundo,

virtuoso num meio sujo. 

Dormindo com rameiras para subverter o tédio 

dos paraísos artificiais. 

Eis-me à beira da noite escura da alma, livre, enfim,

da cancerosa máscara humana.

Desenganado pelos homens e por Deus, mas resignado 

ante a alegoria incoerente do tempo.

Lamento apenas não ter amado o suficiente. Daí, talvez,

a traição que jamais esperei.

Quis muito e fiquei sem nada. 

Nada além dessa insensata busca pelo que não sei.



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