fique esperto
Seja correto, mas fique esperto.
Até com o que é certo.
Ninguém se arrepende
de ser honesto,
é o que se dizia antigamente.
Entre tantas coisas
que caíram por terra.
esculpindo pedras
Reveses lilases demandam neuroses.
Arquétipos retrógrados comem dobrado.
Dúvidas me deliram sangrando.
Exalo-me e fico santo.
Dir-se-ia que qualquer coisa enfastiada de todo querer
é debalde.
O coração pacificado regado a conflitos.
Tanto esforço à procura de apalpar-me.
Não sou o que sinto.
Complexos cartesianos atravessados na garganta
cheiram a mato e sovaco.
Quimeras abraçam vastíssimos desígnios.
Lido, ledo e leso, errando é que se arrepende.
Ninguém me disse mas eu sei que partir do pressuposto
embaralha as ideias.
Tudo meio que se baldeia para o anacoluto.
Um nimbo vale mais que qualquer pensamento profundo.
Tão claro que custo a enxergar.
Bom senso requer comedimento.
O colapso agasalha verdades interditas.
Nenhum artifício se sustenta além do tempo alcagueta.
Qualquer dia desses o suplício acaba.
Até lá o rio continuará esculpindo pedras.
Não desisto, mas também não insisto.
desbunde
Desnuda,
a vida enfim
se desbunda.
Em fuga, a nuvem
deixa um rastro de chuva.
Honestamente ? Há gente demais
no mundo, para qualquer coisa dar certo.
Nada jamais recomeça.
Tudo continua. (Mário Quintana às avessas)
Poema perdido no caderno velho,
já nem lembro quem teria inspirado.
Poesia é estado de espírito.
A voz da razão
interpela o coração :
por que tanta aflição ?
Se o sonho já foi sonhado,
e o jogo, jogado,
não será melhor,
apenas e simplesmente,
desfrutar ?
Nada do que eu ainda quero
se compara ao que já tive.
Mas aquilo que ainda posso ter
ah, vai ser o bolo da cereja.
florilégios
A vida em lapsos se perde.
Não servem para nada as coisas que caem
no esquecimento.
O rio de Heráclito dispensa metáforas.
Aceito afrontas em legítima defesa, mas não abuse.
Volta e meia me acomete um surto de anacronismo agudo,
quem me dera quem ser.
Até as pérolas tem seus dias de ostracismo.
Como já dizia o vigário, nihil obstant saccum est.
Contrafeito, digo palavras que não são minhas.
Estamos conversados, mas qual é o assunto mesmo ?
Num mundo impreciso, é preciso ser inexato.
Só para constar, alhures é logo ali.
Florilégios são sempre bem-vindos.
Quero isso de ser só eu para enfim ser
alguém diferente.
Não jogo para ganhar, jogo para desfrutar.
A mente vê tudo numa perspectiva trágica, mas nada acontece
por acaso.
A vida, quando não é festa, é guerra.
Sou contemporâneo de espólios prenhes de silogismos.
Louvado seja quem não acredita sem ver.
estranheza
Não estranho que estranhem meu desencanto,
é até uma certa repulsa,
com o amor, com as pessoas.
Não é nada gratuito, não nasci assim e nem sou
sociopata ou narcisista,
como está em voga hoje em dia.
Escrevo por experiência própria, por tudo que já passei.
E no caso do amor, paradoxalmente, por ter amado demais,
por amar quem não merece,
ou de repente,
por não ter sabido amar.
Algo que talvez nunca se aprenda direito.
Daí a necessidade de paciência, tolerância, compreensão.
Cujos limites vão de cada um.
Os meus nunca foram lá grande coisa, admito.
Daí não alimentar mais ilusões sobre o referido.
Não dispenso, mas também não vou correr atrás.
Tipo aquele matuto, caseiro do sítio de um amigo meu,
que não gostava nem nunca havia jogado bola,
mas que se viu obrigado a aceitar o "convite" do patrão
para completar um dos times da tradicional
pelada de churrasco.
Jogo movimentado, bola pra lá e pra cá, e nada do caipira
se movimentar, paradão no meio campo, só faltou
cruzar os braços.
"Corre aí, meu , faz alguma coisa!", cobrou alguém do time,
ante a inusitada inércia do matuto, que não se fez de rogado.
"Oxe, bem que avisei, correr atrás eu não corro.
Mas se ela passar por aqui,
carco-lhe o pé nela !"
nem tudo está perdido
Não controlamos a vida.
Grandes planos geralmente não dão em nada.
Ter força de vontade, fé, não evita os fracassos.
Nossas verdades podem nos levar ao abismo.
É preciso perseverar, mas não espere nada de bom de ninguém.
Acreditar num mundo melhor se opõe
ao que a vida realmente é.
Ao fato de que todos mentem, enganam, trapaceiam.
Esse é o normal.
A virtude corre por fora, desconfie de quem posa
de bonzinho, de honesto, fiel.
Ser escroto não é bonito mas é melhor do que viver de aparências.
Vivemos num mundo hipócrita, materialista.
Em que os fins justificam os meios.
Em que gente como Maquiavel e Sun Tzu são mais uteis
que os clássicos gregos.
Mas nem tudo está perdido.
Basta não esperar mais do que o mundo pode dar.
Das pessoas, em particular.
há coisas que só melhoram piorando
Enquanto os amigos se afastam,
e os amores passam ao largo,
eu digo, ora pois, sigam em paz.
Já nada de vós espero.
Traíras !
Piranhas !
Vou ali me suicidar e já volto.
Suicídio de ideias.
De crenças.
Dos quais me desvencilho como defuntos fedorentos.
Meu narcisismo já não suporta desatinos.
Naufragar com elegância, eis a saída honrosa.
A desdita que nos persegue desafia o mito cristão
do perdão pelo arrependimento.
Haja cimento para tanto reboco.
A cabeça foi feita para pensar mas quem se atreve ?
Quem se atreve a contrariar o establishment do mal ?
Inútil reclamar. Mais sensato é aderir.
Chega de pensar.
Pensar é maçada, como diria o grande poeta.
Só porque as coisas desandam não justifica debandar.
E isso vale para tudo.
Há coisas que só melhoram piorando.
escravoceta
Ela te trata mal
( a não ser quando precisa de dinheiro )
Ela te engana, mente, distorce as coisas
Te faz de otário,
promete e não cumpre, te faz de gato e sapato
E quando você reclama, ela ainda se ofende,
fala merda, meu, como você aguenta?
Cadê a porra da sua dignidade?
Toma vergonha e larga de ser escravoceta!
Vai, amor
Porra, esqueci a camisinha
Vai, amor, deixa eu por só a cabecinha
Só pra não quebrar o clima
Não vai me deixar na mão agora
Brincadeira tem hora
Vai, amor, prometo gozar fora
Juro, eu tiro na hora
Ou em último caso pode liberar o cuzinho
Prometo ir com jeitinho
Se não topar, ao menos toma o leitinho.
Vai, amor, quebra meu galho
Ou vai pro caralho!
P.S. Me desafiaram a escrever uma letra bem escrota
para esses funks que a galerinha tanto curte.
Moleza.
BANDIDA
Rebaixei meu nível
Mudei meu vocabulário
Aceitei teus gostos, cá pra nós, abomináveis.
Fiz concessões inimagináveis.
Tolerei mentiras, sacanagens.
Fiz de tudo para te ajudar.
Te mostrar o outro lado da vida.
Mas você não quis.
Só me usou.
Porque você gosta de ser assim.
Vazia por dentro.
Vadia por fora.
Curtir a vida é sua praia.
Aproveite.
Aproveite enquanto tem tempo.
Mas lembre-se, a juventude não é eterna.
A beleza que hoje tanto valoriza
pode ser uma desgraça.
Vai acabando aos poucos, o corpo não aceita vida desregrada.
Narcisista não segura a barra.Vai acabar alcoólatra ou viciada.
Ou bandida.
Se é que já não é.
complexidades
O que é nossa culpa, em meio a tantas atrocidades ?
Frágeis, vulneráveis de nascença, de onde vem a coragem
que nos permite seguir em frente ?
O conhecimento, graciosa desdita, arranca o véu da ignorância
mas se desfaz na soberba.
O entendimento não faz distinções ante uma imperfeita etimologia.
Incoerências conscienciosas endireitam as certezas.
O cenário esculpido de premências sacrifica a indulgência.
A inexorável precisão da natureza não faz concessões.
"Complexidades vão continuar sendo complexidades
enquanto o mundo existir".
Tudo remonta as forças espirituais que nos governam.
Na vida que se refaz no próprio affaire.
coitado de quem ainda acredita
no amor à moda antiga
O grande desafio dos casais de hoje em dia
é a aceitação.
Aceitar o intolerável, o execrável, traição.
Coisas impensáveis até pouco tempo.
Desafio ainda maior para o homem, o velho machista de guerra.
Criado sob a hegemonia secular do patriarcado.
De que o homem pode tudo, face à submissão histórica
das mulheres.
Algo em franco desuso, ao menos na civilização ocidental.
Nada mais anacrônico do que os talibãs da vida.
A era digital chancelou o empoderamento e a emancipação feminina.
A nova geração faz sexo como se troca de roupa.
Sem limites, sem culpa.
Coitado de quem ainda acredita no amor à moda antiga.
a parada é sinistra
Para quê namorar, se dá para ficar ?
Para quê se apegar, se dá para diversificar ?
Para quê casar, se dá para se juntar, cada um morando
em seu lar ?
Para quê complicar, se dá para simplificar ?
Para quê se apaixonar, se envolver, se a mina é rodada
e nem de confiança é ?
Mano, pensa bem, a parada é sinistra, ninguém é o que parece,
ninguém faz nada sem querer algo em troca.
Para quê ficar bolado, pensando no que ela estará fazendo,
esperando por horas uma mensagem no wattsap ?
Se liga, relaxa, dá um rolê ou bate uma punheta,
mas desencana. Ainda mais se ela é sacana.
Ora, dá o troco na mesma moeda.
Igual ou melhor que ela está cheio por aí.
A oferta está bem maior que a demanda, pode crer.
Na era digital, só fica sozinho quem quer.
bipolar
Eu sou feliz.
Eu sou linda.
Todo mundo quer me comer.
Eu sou uma puta burra.
Eu sou insuportável.
Eu faço tudo errado.
Eu não preciso de ninguém.
Me ajuda, me salva.
Não desiste de mim.
Você é um anjo.
Você é incrível.
Você é falso, escroto, sujo.
Eu não minto, só omito.
Minha vida é uma merda.
Eu quero me matar.
Eu sou feliz.
Eu sou linda.
Ninguém me aguenta...
Como lidar com alguém assim ?
o grande prêmio
Quem não sonha em ganhar na loteria, achando,
não sem razão,
que estará se habilitando a ser feliz e resolver todos
seus problemas ?
Mas não é bem assim, há motivos e exemplos de sobra
que provam o contrário.
O que poucos se dão conta é que há outras loterias
bem mais factíveis e gratificantes.
Encontrar e conviver com boas pessoas, por exemplo.
Ter alguém que se importe, que te ajude de coração,
que te ame pelo q você é.
vai de ter sorte ou não
Quando o acaso entra em ação,
não há nada que se possa fazer.
Vai de ter sorte ou não.
Fazer as coisas certas nem sempre basta.
Muito menos o certo por linhas tortas.
O destino, se é que exista, se abstém de reconhecer
o mérito do justo, hospeda sonhos
e pesadelos que o monstro do tempo devora.
Ah, o dadivoso acaso. Alimento do heroico, da falsidade,
da derrota.
Que acolhe a esperança e o medo.
Cifra de diáspora e enigmas.
Que devora o mundo sem ira nem repouso.
"Seu leito é a vigília e seu pão é a fome", como já sabia Borges.
verso novo
Nesta manhã sem carências, sem assomos, assombros,
apenas plácida, de alguma forma revestida
dos mistérios que ninguém sabe
nem saberá,
a humilhação de envelhecer me espreita.
O desejo sublimado, melancólico e vertical,
investido do que era dor e conhecimento,
pulveriza o coração, devassa o verso novo,
a vontade desorbitada, as quimeras que não vingaram.
Na manhã dos homens, o rude ofício de viver
excede o desejo do não vivido,
irmanando-se
a vergonha e as lágrimas dos poetas martirizados,
incapaz de expressar
o real significado do amor, da justiça, da paz.
escravos da paixão
Todos nos decepcionam. De uma maneira ou de outra,
por um motivo ou outro, mesmo os que nos são mais caros
pisam na bola,
fazem as coisas mais ordinárias.
Há momentos em que a mulher da sua vida pode ser pior
que uma mulher da vida.
Na mesma lama chafurdam padres, juízes,
políticos.
Figuras públicas, celebridades, famosos de toda espécie
não são melhores que todo mundo.
No fundo, não passam de crápulas, simples mortais.
Não há como viver sem evitar pecados essenciais como orgulho,
inveja, promiscuidade.
Somos escravos da paixão, como dizia Hume.
A razão só existe para corroborar o que pensamos.
A impostura é modus vivendi por excelência.
A hipocrisia do cristianismo permeia as relações, sob o disfarce
do politicamente correto.
Até Deus nos decepciona, a medida em que ignora nossas
necessidades, não ouve nossas preces.
Menos mal que a decepção, a infelicidade, nos faz mais fortes.
Não é comprovado, mas consola.
a batalha eterna
Cumpre fazer do fim algo aceitável.
Libertadora ou cruel, a batalha é eterna e prescinde de pompa.
Por melhor que a vida seja, todo começo tem um fim.
Assim como o fim também pode ser um recomeço.
Livre da esperança e do medo.
Em ontens e distâncias renovados.
Para apagar ou mitigar os erros.
Pregustando o sabor do que é perdido e reencontrado.
A alma lavada do esquecido.
O amor corrompido, inocente como os pássaros.
o pacto
Todas as coisas que eu queria dizer
não se comparam com o que sinto.
Um pacto inconsentido aninha-se em secreto
desacordo com a verdade.
Onde não cabem discórdias.
Meu momento é de contrição.
A meus olhos, o que me seduz é a cegueira de não
ver para crer.
Não ver como o universo se resolve em perfeita
harmonia.
Para onde convergem luas macias e sonhos itinerantes.
Meu querer não é suficiente, logo a reinvenção dos elementos
recolhe os despojos
do plano austero que não deu certo.
A natureza se desforra e eu me deleito em
subornar o tempo.
Num fluir de essências e formas emanados de desejos
martirizados.
Há bálsamos para toda dor e cada hora.
Só nos resta encontrá-los.
o diabo em pessoa
Dizem que o amor é cego.
Antes fosse só isso.
Porque pode ser burro também.
Não enxergar o óbvio é apenas um lado da moeda.
Pior é continuar aceitando o inaceitável.
Relevando mentiras, tolerando abusos, em nome de uma coisa
que possivelmente o outro não sente.
Ou porque o sexo é satisfatório.
Ignorando que para um narcisista, por exemplo,
o sexo é apenas uma ferramenta de manipulação.
"Amor e sexo nunca estão vinculados na vida de um narcisista.
Até porque narcisista não ama, ou melhor, ama apenas a si mesmo.
Ainda que você tenha tido o melhor sexo da sua vida com um
narcisista, entenda que isso não tem nenhum significado emocional
para ele". (Carolina Leão/ doutora e psicoterapeuta)
O/A narcisista é o diabo em pessoa porque não se vê
com problema e não assume culpas.
Porque gosta de ser o que é.
Seu transtorno de personalidade é caracterizado por um padrão
rígido e persistente.
Não existe nada capaz de fazer um narcisista ter
empatia ou amar.
Ou seja, fuja deles !
resoluções
Esqueça aquelas listinhas de resoluções de ano novo.
Você não vai mesmo cumprir.
Amanhã ou depois já estará cometendo os mesmos erros.
Brigando com aqueles com quem acabou de confraternizar.
Porque o ser humano é assim, dificilmente muda,
ainda mais de uma hora para outra.
O processo de mudança é bem mais longo e complicado.
Tiro por mim mesmo.
E olhe que me esforço para ser uma pessoa melhor.
Mas sempre que acho que consegui, acontece alguma coisa
para me devolver à realidade.
Que o conceito que faço de mim mesmo
está longe de corresponder ao que os outros pensam.
O que de certa forma explica o por que de passar
o réveillon a cada ano mais sozinho.
Não que isso me abale, já foi o tempo
em que essa data era memorável, quando meus pais
ainda eram vivos e eu tinha uma linda família
para confraternizar.
Hoje, de certa forma, não tenho mais nada de especial
à comemorar.
Apenas e tão somente entender que tudo tem seu tempo,
e que toda e qualquer resolução para se tornar
uma pessoa melhor
passa pela conscientização dos próprios erros.
Sem o quê, tudo não passa de mais uma simples
virada de ano.
a noite eterna a noite eterna chega devagar a vida passa devagar até tudo passar e você de repente acordar sozin...