inteligência emocional
Às vezes me faço de bobo.
Às vezes me faço de cego.
Só não consigo dar uma de surdo.
Muito menos de mudo.
Aí ouço, reajo, e ponho
a boca no mundo
a aureola das virtudes
Difícil manter-se íntegro.
Difícil manter-se sóbrio.
Difícil manter-se fiel, limpo.
Difícil, quase impossível, não perder a fé,
ante tantos desatinos, diante de tanta sujeira,
num mundo que soçobra,
forjando vestes, carcomido por vermes,
crivado de lúbricas taras.
Difícil, dificílimo impor-se sem a falsa
aureola das virtudes.
Difícil não ser hipócrita, diante de tanta hipocrisia.
ENCURRALADO
Encurralado.
Sem saída.
Quem nunca se viu à beira do abismo,
sem opções, tudo desmoronando,
sem tábua de salvação ?
Normal.
É a vida, irmão.
É a vida que em dado momento desgarra,
mostra as garras, pune, sangrando as entranhas do nada.
Quem nunca se perdeu em culpas sem culpa ?
A vida pequena soterrada de causas impossíveis
e sonhos desfeitos ?
Quem nunca se viu na solidão mais ampla,
em meio aos pensamentos mais sinistros,
sem saber mais quem é quem ?
Ah, se tu soubesse as estranhas alquimias do cérebro.
O quão confundem,
ofuscam a visão para as coisas mais simples.
Não há vida sem percalços.
A existência abandonada se recompõe na gênese de antanho.
Não importa o que digam ou aconteça, somos pontas
do mesmo laço.
Na abundância ou na falta de tudo, o mesmo cansaço,
irmão de luta,
abraça o momento misterioso e profundo.
Nada nos cura do tormento e da angústia.
A não ser reagindo.
Desafiando os estigmas.
A resposta para tudo está em nós mesmos.
Naquilo que queremos, naquilo que deixamos
para trás.
Esteja certo, após a noite mais escura o sol brilhará.
A vida bêbada e louca te espreita.
Desfruta.
Antes que se veja encurralado.
Sem saída.
acordes dissonantes
"A arte e o amor devem exprimir, e não explicar"
(Radindranath Tagore/1861-1941)
Se todas as cartas de amor são ridículas, como
nos assegura o grande poeta lusófono, o que dizer dos
tresloucados versos escritos
sob o eflúvios da paixão desenfreada,
inebriados pelos momentos prazerosos
que só o idílio amoroso é capaz de proporcionar ?
Tolos ? Patéticos ? Ridiculamente sublimes ?
Provavelmente isso e muito mais.
Emergidos do fundo d`alma, amálgama de todos
os sentimentos,
o discurso amoroso, seja qual for,
não concebe comedimento ou meias palavras.
Não se importa em ser tolo, patético, ridículo.
Que é exatamente o que o amor é.
Pleno de acordes dissonantes.
De tudo,
guardo pequenos sonhos,
medíocres anseios,
flores petrificadas à jusante da vida.
Dela, já não há lembranças
que valham a pena lembrar.
A dor esmaeceu, fechei o caderno e lá
ficaram os versos
que hoje só me causam pesar e vergonha.
De tudo,
levo comigo uma imensa e profunda
tristeza,
pelo desengano maior e mais atroz
que a vida nos pespegou.
Um amor com o mais indigno fim.
De tudo,
nem saudade restou.
é preciso crer
No entanto, é preciso crer.
Crer para não morrer por dentro.
Definhar na solidão das águas estagnadas.
Em meio ao inferno das ideias
e sentimentos corrompidos.
É preciso crer para manter um mínimo de fé
nos seres,
nas coisas que teimam em não dar certo.
Tentando e tateando os arabescos
das surpresas compostas de completa humanidade.
Crer para manter a sanidade mental.
Para não ser um simples animal, que vive
apenas para sobreviver.
Sim, é preciso crer. Mesmo contra
todas as probabilidades, os riscos de se arrepender.
O humano espírito inquebrantável assim o exige.
Buscar as antigas sementes, o âmago da jornada,
para ser tudo o quer quiser ser.
O velho amor renovado em mãos antigas.
Olhos cansados refletindo a fé que remove montanhas.
Crer para exorcizar os demônios.
Para plantar e colher dias maduros e risonhos.
E o derradeiro verso,
no tempo adverso ou de bem-aventurança,
possa ser como as rezas todas desse mundo.
Sejamos sinceros : há momentos na vida de um homem em que só mesmo recorrendo aos serviços de uma puta. Que nada espera, nada exige, além ...