sábado, 28 de dezembro de 2024


                    nunca é tarde para amar





Nunca é tarde para amar

mesmo não valendo a pena

mesmo não dando em nada

nunca é tarde para amar.


Vindo de radiantes nãos

enxertado de frutos jocosos

recriando mentiras de mil faces

talhado à mão, podre por dentro

tateando palavras clandestinas

calcado nos lapsos da memória

perdido mesmo antes de nascer.


Não importa, 

há amor para todos os gostos

mesmo não valendo a pena

mesmo quebrando a cara

mesmo não dando em nada.

Nunca é tarde para amar.


Mas não sejamos tão exigentes

Só porque às vezes nos sentimos 

entediados e tristes

Por termos um temperamento difícil

Ou sermos muito inteligente...







sexta-feira, 27 de dezembro de 2024


                           o último suspiro



Abeirando abismos, gritos de âmbar coagulam 

idiomas perdidos. 

Entre o consentido e o desfeito,

os despojos empreendem 

novas jornadas.


A primeira morte desencarna as crenças.

A floração dos gritos desmistifica os prantos.

Renega os ideais.

A cada renascer, a face túrgida do amor desmascara 

o ímpeto suicida.

A vida subsequente se renova dentro da vida.

Fora de nós, as fronteiras do possível se abrem

saboreando seu sal de conflitos.


O sorriso alado a tudo transcende.

O filho amado, o andar descalço no barro,

os aromas esquecidos,

saudades do mundo bafejam cavalos, locomotivas.

O último suspiro de um tempo que não morre

entranha o líquen das profecias.

Para deixar belo o dia da partida.


quarta-feira, 25 de dezembro de 2024


                                      seres e coisas




Os seres e as coisas se pertencem, imantadas 

de um saber que transcende o entendimento.

Fatos e fatores se aplainam,

acorrentados à arquiteturas corrompidas,

repletas de mãos inúteis.

Do canto mais remoto 

emerge anjos de armaduras espúrias, 

exalando antros de perdição.

Farsas inventivas entendem-se sem se ouvir,

a despeito das hastes fracas e voos às avessas.


Faço versos porque as palavras se prestam 

a qualquer propósito.

Não sou triste nem alegre, sonho a vida

beirando os extremos.

Distante de qualquer casa, qualquer terra,

enquanto o mundo se desintegra.


O cio pavorosa de seres e coisas

encarna a ausência de crime.

Na normalidade doentia do ciclo evolutivo,

nada é tão efêmero que não possa perdurar.

Nada além dos vícios.

Das sevícias.

Dos artifícios.

Um instante basta para entender a vida.

Tudo o que o entendimento consente é válido.

Mas a tessitura do amor é delicada.

O vaivém dos desejos devora os desfechos, para ampliar

as fronteiras das abstrações.

Seres e coisas caminham lado a lado

por alamedas opacas, à mercê do olho ciclópico

do imponderável.   





  

   

domingo, 22 de dezembro de 2024



                      sublime danação



Perdido de mim, aspiro o que remonta 

a meus destroços.

Das vagas inconstantes da memória, componho 

labaredas de céu e extinta soledade.

Meu presente é um presente que se desfaz 

em indecisa dismorfia.

Uma altivez sem destino nem história

é minha glória tardia.

Me divido entre a lucidez e a cegueira

de querer o que não posso (ser) ter.


Meu tempo lentamente se esgota.

O coração bebe o fel de seu amoroso aconchego.

Nem pareço mais eu.

Quem fui, ausentou-se sem eu sentir.

Quem sou, um arremedo de quem quis ser.

Não obstante, louvo a sublime danação desse tempo 

passado a limpo, liberto  

de uma pena maior.

Me conforta o lúdico renascer 

em que findo, 

a laborar a fuga das estreitezas do mundo.  






                           o momento etéreo



O momento etéreo é feito de sempres.

Rubicundos filamentos apoderam-se das memórias

sonolentas do efêmero.

As coisas passam ocultando a aprendizagem do espanto.

Janelas nostálgicas assistem ao esvair das exaustas

formas da paciência.

Églogas de céus em chamas e coros de discórdias fundem-se,

para que o contentamento da tristeza não seja em vão.

A dança antediluviana das borboletas paira 

muito além dos pensamentos talhados no mais puro 

alumbramento. 

O momento etéreo é uma árvore plantada 

no dorso das campinas, onde jorram flores

e morrem mitos.

Os tempos são sempre recalcitrantes, continuam

através dos olhos e das paisagens.

A vida agoniza com a tepidez de velhas rachaduras

No ventre das máquinas homicidas,

as novas criaturas comungam o mesmo húmus 

do sadismo.

O momento etéreo passa, mas o horror permanece.






 

quarta-feira, 11 de dezembro de 2024


                          o nascimento do nada


Tudo se refaz,

para o bem e para o mal.

O tempo durável permanece,

enquanto passamos. 

Quando o que sucede faz do fim um recomeço,

as palavras devoram tudo o que sabemos.


O nascimento do nada

é esquecer o que foi visto.

É não supor-se informe e pequenino.

É não findar-se seguindo a trilha

de seu próprio desencanto.



domingo, 8 de dezembro de 2024



                 as velhas coisas novas


Sob a fuligem das coisas afetuosas,

a desordem sem esperança

despreza os prazos.

Alude ao pensar ambíguo 

o sub-reptício jogo diluído dos genes.

Assim se resolvem os infinitos esquemas

das velhas coisas novas.

Esquecidas e renascidas.

Desvendando injustiças e fomes.

Purgando o sêmen dos equívocos,

enquanto a própria vida deixa-se consumir,

à procura do fim.


 

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