sexta-feira, 30 de maio de 2025

                       

                    amor radioativo





É mais forte que eu

esse sentir

que me domina

me arrebata

me subjuga.


Às vezes até penso

ser capaz

de superar, esquecer.

Mas logo me arrependo,

volto atrás,

me humilho,

peço arrego.


Meu calvário é ruidoso e demasiado.

Por tudo ser intenso demais.

Nosso querer, minha impaciência, 

tua inconstância.

Já não controlo o que sinto.

Vou de um extremo ao outro,

euforia, cansaço, desgosto.


Renunciar tornou-se imperioso.

Mas é mais forte do que eu

esse querer alucinado e radioativo.

Mistura de amor e compulsão.

Minha perdição. 

Minha razão de viver.

Louvadas sejam as coisas

que se restauram

a cada amanhecer.




quarta-feira, 28 de maio de 2025


                           sapatos amaciados




É bom ouvir os segredos do silêncio.

Reflito calado, à beira de mim mesmo.

Renascendo no imaginado.

Porque, no fundo, o que eu quero é o que já tive.

Os sapatos amaciados, a partilha da utopia

de ser feliz.

Para dar sentido as coisas que virão.


Já fui bendito.

Já fui maldito.

Já fui amado.

Já fui execrado.

Agora sou meu próprio showman.


Novos fracassos me atraem.

Me vingo do que me fere sem o ônus da prova.

Entro e saio de cena sem mágoas nem penas.

Vivo a vida sem precisar de bode expiatório.

Celebrar é obrigatório.

Meu coração é meu santuário.

Aberto a todas possibilidades.

Grávido de felicidades.



segunda-feira, 26 de maio de 2025


                   o rosto                      



Um rosto paira no silêncio da noite.

Flutua sobre o tempo vivo, remanescente do fracasso

de um amor que sequer existiu.

Não do jeito que imaginava.

Não forte e invencível, como acreditava.


Às vezes é o que acontece.

De o amor não ser o que parece.

Pinta e borda no começo

para depois se revelar um autêntico blefe.


Um rosto paira no silêncio da noite.

Quisera poder apagá-lo da memória.

Mas está além da minha vontade.

Reluto em aceitar que não consigo te esquecer.

Que bem ou mal, te conhecer

foi a melhor coisa

que aconteceu na minha vida.







              meu coração me condena

   

Meu coração me condena a ser só.

Por sentir tudo intensamente.

Dou tudo.

Quero tudo.

Simples assim.

Meio termo não me satisfaz.

Não gosto de nada pela metade.

Querer, gostar, amar

tem que ser para valer.

Não um mero jogo de palavras.


Pois cobro, sim, reciprocidade.

Desde as coisas mais simples.

Atenção, respeito, consideração.

Para o quê espero a devida contrapartida.

O que raramente acontece.

Daí os constantes conflitos.

Daí acabar sempre sozinho.


Meu coração me condena a ser só.

Por não me contentar com pouco.

Por esperar dos outros mais do que podem dar.

Por ser pródigo em empatia e ternura.

Por confiar e me arriscar a fazer papel de bobo.

A ser sempre o errado.

Por querer, por amar demais.


  

 

domingo, 25 de maio de 2025


                        

                o roto e o esfarrapado



Algo de nós sempre fica no limbo da memória.

Arrastamos nossas culpas sem assumi-las.

Mas já não há desculpas disponíveis.

As promessas se recolhem, coniventes.

Tudo já foi feito, refeito e descumprido.

O roto e o esfarrapado andam lado a lado.

Só as coisas primitivas permanecem, voltando-se

contra si mesmas.

Algo de nós não inspira confiança.

Algo de nós quer o novo

mas não se desprende do velho.


De ti e de mim, o amor foi-se afastando 

aos poucos.

Em meio a tudo, 

algo de nós se refugia no tempo prescrito 

e decifrado.

Para que todas as coisas lindas

que vivemos

tenham alguma serventia.


 





                      desencanto



Algo de nós ficou

no limbo das lembranças.

O que sou, o que és, dueto de sonhos

e equívocos.

O desencanto recitado em prosa e verso,

entre rajadas frescas de vento.


Você foi a chave da minha ignição.

De tão grande, nosso amor morreu de inanição.

Era feliz e sabia.

Sempre estive consciente de tudo.

Se acabou foi simplesmente porque

o que é bom também enjoa.


Algo de nós conspira contra.

Algo de nós não inspira confiança.

Algo de nós quer o novo

mas não se desprende do velho.


O que sou, o que és, dueto de sonhos

e equívocos.

O desencanto recitado em prosa e verso,

entre rajadas frescas de vento.

Algo de nós retorna a sua forma insurgida e plena,

a fim de restabelecer o equilíbrio do nada.



sábado, 24 de maio de 2025



                  o coração do mundo


Um dia como qualquer outro

nunca é como outro qualquer.

Pode ser de sol ou de chuva.

Pode ser quente ou de brisa.

Pode ser de nada ou de tudo.

Em que as horas podem passar

vagarosamente

ou voando.


Como quando estou com você.

E tudo mais deixa de existir.

Nas horas sequestradas do cotidiano insosso.

Em te busco na demora e na espessura das coisas.



Um dia como qualquer outro

nunca é como outro qualquer

Em dias iluminados de nada.

Ou de tudo.

Na poeira dos ciclos, a espera se gasta por dentro.

O novo e o velho investem contra os alicerces.

Tudo de desgasta ou se esgota.

As coisas se renovam e desbotam.

Ao cabo do azul de aço,

o coração do mundo jaz em pedaços.






 








                    o que importa


Não sou triste nem alegre.

Não sei se me amas ou se finges. 

Não importa.

Não existe nada perene no mundo.

Beleza, saúde, prazeres, tudo se esgota

a medida que a vida desbota.


Bem sei o quão volúvel é o amor.

Não importa.

O importante é sonhar e viver o sonho.

Deixar-se ficar para rir e chorar.

Para ter medo e esperança.

Conhecer a beleza que não se mostra.

Defenestrar o fantasma da solidão.

Experimentar o bálsamo dos dias perfeitos.

Vivenciar o silêncio dos gritos.

O céu de zinco.

A lua desconectada.

A poeira das estrelas.




                            

                    sem urgência e necessidade





É possível que ainda exista amor por aí

É possível que ainda exista compaixão, empatia

Mas, não sei, não. 

Tudo anda tão confuso.

As pessoas se distanciando, se isolando, hábitos 

e comportamentos cada vez mais estranhos.

Preferindo a companhia de cães e gatos ao invés de gente.

Os relacionamentos cada vez mais difíceis.

A vida nua e crua exposta sem pudor nas redes sociais,

no vale-tudo por clicks e curtidas. 

A vulgaridade imperando.

Os vícios, as drogas dominando.

Os mais velhos descrentes e ressabiados. 

Os jovens dispersos e desnorteados. 


É possível que ainda exista amor por aí.

É possível que ainda exista compaixão, empatia.

Em novas versões.

Sem urgência e necessidade.

Como flores crescendo em terreno baldio.













sexta-feira, 23 de maio de 2025


                            a grandeza de existir  





Aos apelos do amor me rendo.

Esquecido das coisas mais secretas, com seus

artifícios de luzes e eclipses.

Somos a solidão da liberdade desperdiçada.

Cada ser engalana a grandeza de existir.


Sob o transitório trâmite de cada momento, 

festejo os encantos que não se quebram.

Ruminando cada rito corrompido.

Me apraz a solitude das paredes.

A convivência é feita de ardis compassivos.

O preço do amor é ignorar o chumbo nos pés.

Para que cada instante seja outro, incorruptível. 


Somos os mesmos que erigimos e destruímos, exilados 

aos próprios olhos. 

Surdos, cegos, mudos para o mundo que rói a vida.

O futuro é o passado engendrado pelo presente

inconcluso.

Em que a beleza desgasta rostos de pedra.



terça-feira, 20 de maio de 2025


             

                sem  meio-termo



Gosto de você assim,

do jeito como gosta de mim.

Mesmo nem sempre nos dando bem.

As brigas e desavenças por motivos banais.

Mas gosto de você mesmo assim.

Talvez por sermos tão desiguais.


Por você me tornei mais paciente.

Por você me tornei menos arrogante.

Porque ter mais estudo não me faz superior.

Diante da tua sabedoria inata, não passo 

de mero aprendiz.


Gosto de você assim.

Do jeito como gosta de mim.

Sem frescura nem fingimento.

Sem filtro nem comedimento.

Com você tudo é intenso.

Nosso amor não tem meio-termo.

Pode ir do céu ao inferno num instante.

Ora doce como mel, 

ora indigesto como sarapatel. 

Ora doce como mel,

ora indigesto como sarapatel.



* letra de música

segunda-feira, 19 de maio de 2025


                         um dia de cada vez





Um dia de cada vez.

É assim que funciona.

Nada se detém. 

Nada se retém.

Palavras inventam o efêmero, o vago, o impreciso.

Por trás das cortinas,

ora o sol brilha,

ora a chuva embaça a vidraça.


O tempo novo traz tudo em dobro.

Coisas novas se misturam às antigas,

com seus apelos e absurdos.


Nada é original.

Nem o trivial.


Os novelos se embaraçam, compondo vícios antigos.

O silêncio que perdura encerra o duro ciclo.

Devassando a vida como flores do lado de fora

da janela.


A mão que afaga alimenta as fábulas.

Por trás do azul, o branco e o preto confabulam.

No ar, o estado de graça ofusca 

o olho do pássaro.

Tão fundo e tão alto que não deixa rastros.

Como a linguagem que engendra cada gesto.




                   mulher objeto


Amo a vida, apesar de tudo

Amo tudo que é mudo, infecundo,

e até o eventualmente imundo.


Amo o obscuro, o que refulge no escuro.

Não necessariamente belo, muito menos puro.

Apenas e tão somente, humano.


Amo o imprevisto, o improvável.

O obsceno, o ordinário.

E acima de tudo, o palpável.

O que pode ser comprado

por um preço razoável.


Amo você, mulher objeto.

Sem dono, sem disfarces.

Sem margem de erro.

Fiel ao lema

que é dando que se recebe.






domingo, 18 de maio de 2025



                               inventário



Há coisas que nunca se esquece, 

nunca passam.

Coisas boas e ruins.

Somos o que somos em função delas.

Dos guardados. 

Do que passamos, do que fizemos

o quê disso resultou.

A soma de tudo, mais do que passado,

sempre presente, como um inventário onipresente

e onisciente, velando os dias, de haustos e claustros. 

Esperando que os restos de desesperança rompam

o zelo dos pactos.

Para sobreviver as coisas boas e ruins

que nos cegam.








segunda-feira, 12 de maio de 2025



Deve-se perdoar quem nunca pediu perdão ?

Deve-se desculpar quem nunca se desculpa ?

Deve-se amar quem não sabe retribuir ?

Deve-se ser bom com quem não merece ?

Que apreço merece o ingrato, o egoísta, o narcisista,

o sociopata ?





                remoendo silêncios



Tudo se cumpre ao sabor dos acasos e descuidos.

Tudo o que tenho, o que faço ou fiz,

vive se equilibrando

remoendo silêncios

colhendo rosas de fogo

compondo cenas de amor que pedem bis.


Busca-me um instante de calma

em meio as escaramuças e paroxismos de praxe.

Na vida sem justiça, sem amor,

sonha-me o refúgio dos pássaros, 

a paz dos muros de cercas eletrificadas.

Busca-me o que restou de mim

entre canteiros de aprazíveis oferendas.

Regozija-me o vago transitar das coisas fungíveis.









                    o canto do cisne




Perdi o amor verdadeiro algumas vezes.

Hoje me contento com qualquer quebra-galho.

Nunca estive pronto para amar.

Sempre pus tudo a perder.

Todo amor que dei

me fez mais mal do que bem.


Agora não me arrisco mais.

A menos que encontre alguém que sofra

por mim.

Meu coração cansou de sofrência.

Depus as armas da beleza.

Foi-se o tempo de escrever poesia, das bebedeiras,

dos rompantes.

Hoje quero paz e calmaria.

Amargo meu calvário amoroso 

como um santo devasso. 

Enquanto ensaio meu canto do cisne.



sábado, 10 de maio de 2025




janela para o nada







Às vezes me pego

pensando nela.

Sem querer, querendo.

Porque as lembranças de um 

grande amor

com o tempo superam a raiva.

A longo prazo tudo arrefece.

Amor e ódio.

Ódio e amor.

Forças antagônicas que se misturam,

acabam se neutralizando.

E o que sobra é um misto de mágoa

e melancolia que

não consta no dicionário.


Desde que te perdi, minha vida é uma janela 

para o nada.

De onde me refaço contemplando

o inexistente.

Meus dias, feras enjauladas, tateiam a superfície

dos sonhos desfeitos.

A nova realidade  se redescobre pouco a pouco,

entre iluminuras e novos afetos.

Precisei desaprender tudo o que sei

de mim, para refazer meu caminho.

O mesmo caminho, porém com um novo jeito

de andar.

Mais precavido e perto dos meus longes.



quinta-feira, 8 de maio de 2025



                       fogo amigo 



Dor que não dói

Fogo que não queima

Querer que não satisfaz

Fome que não sacia

Vontade que não passa

Sempre querendo mais e mais.


Cansaço que não cansa

Doçura que não enjoa

Paz que não acalma

Saber que não basta

Apego que não esmorece

Sempre querendo mais e mais.


Desejo que não evola

Gostar que não se controla

Sonho que canta em voz alta

De tudo é capaz

Deslumbrado e corrosivo

Desconhece limites

Cuida, maltrata,

faz e desfaz

Sempre querendo mais e mais.


Remédio sem bula

Ultrapassa a beleza

Trapaceia com a sorte

Costuma ser lindo enquanto dura

Mas também um inferno quando acaba.

Amar é para os fortes.



domingo, 4 de maio de 2025


                  amor sem disfarce





A gente já devia saber,

mas estamos sempre pagando para ver. 

A busca pela felicidade é infinita e sem esperança.


Ah, quantas vezes os desejos

que a alma precisa e a vida nega,

passam como o voo de um pássaro.

Ligeiro, incerto, abscôndito.

Te amar me alegra e me entristece.

Por não ter nada além de tão pouco.

Desolado por nunca ter tido um amor

sem disfarce.


Gosto do teu jeito arrevesado.

Do teu ar melancólico e reticente.

Que me faz querer protegê-la,

abraçar como se abraça uma criança.

Gosto do teu jeito de falar, de andar, de sorrir.

Gosto de te ver quanto te vestes,

e mais ainda quando te despes.

Que é quando te tenho

como se fosse só minha.


 


sexta-feira, 2 de maio de 2025


                     o esplendor dos dias felizes





A imaginação nos engana, nos trai.

Mas o que seria da vida 

se não pudéssemos imaginar, sonhar ?

Olhar para dentro de si 

e ver outro mundo, além da realidade.

Feito de devaneios e encantamentos, à beira da loucura.

Orbitando entre a graça e a beleza, 

cortejando o certo e o incerto.

Que se arrisca num embate com a razão.

Para que o que habita o coração,

não se perca em vão.


Ah, a imaginação e seus insondáveis arbítrios.

A cada fase da vida reverbera.

Arde em desejos proibidos.

Submerge e ressurge entre ir ou ficar.

Entre amar e desamar.

No núcleo do ser, entre a euforia e a fadiga,

mistura-se ao mundo numa entrega de sonhos.

Regendo incontáveis sinfonias.

O esplendor dos dias felizes.




quinta-feira, 1 de maio de 2025


                         os sinais advertem



A hora da verdade sempre chega.

Os sinais advertem. 

O amor engana.

Com o tempo, ou vira amizade,

e tudo sobrepuja,

ou vira a coisa mais suja.


Risonho, amargo, triste, 

refaz a trajetória

no vai e vem dos semblantes.

Usurpando o germe da beleza. 

Com o rabo entre as pernas.


Sinais de cansaço com o tempo

afloram aqui e ali.

Ninguém está livre nem imune.

Quando se faz concessões demais,

achando que vão reconhecer,

fique certo, 

nenhuma boa ação

fica impune.





                             metamorfoses





Nada mais difícil do que ver o mundo

pelos olhos dos outros. 

Medir, sentir, sopesar sob o mesmo prisma.

Arguir silêncios e astúcias.

Absorver toda forma de vida como se fosse única,

una, unívoca. 

Entender as razões alheias, por mais absurdas 

e estapafúrdias.

A fim de elaborar um entendimento exato e seco.


Ver o mundo pelos olhos dos outros.

Para entender seus motivos.

Para ser múltiplo e indivisível.  

Abrangente no presente inconcluso.

Complacente no passado impreciso.

Sobranceiro como um corpo de baile.


De dentro, por dentro, as palavras sem ventre

inventam o lusco-fusco da noite,

as bordas dos penhascos,

os cascos surdos

de todas as coisas que habitam a véspera.

Que doce alento o inexistente abriga ?


A transparência dos dias segrega os recessos da vida.

Inoculada de secretas possessões.

O aparato sem sofisticação de acontecimentos inadiáveis

engendra a gênese das palavras.

Tudo se perde e se desfaz na roda-viva da convivência.

Metamorfoses são sempre bem-vindas.

Para que possamos ver o mundo pelos olhos dos outros.



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Duvide da luz do sol Duvide da verdade. De Deus e de todo mundo. E, principalmente, do amor.